Crença na ciência

Quem é quem para distinguir ou qualificar aquilo em que cada um deve ou não acreditar?

Do ponto de vista antropológico a ciência nunca será mais do que uma crença civilizacional – mas, contudo, dominante perante outros ramos do saber (como a religião). No entanto, o que faz com que a ciência “funcione” deriva determinantemente da crença que temos nela. Portanto, se não acreditarmos numa terapia, pode funcionar, mas não é “eficaz”. Toda a epistemologia do final do século XX (Popper, Bachelard, Kuhn e Feyerabend…) assegurou este princípio para bem de nós todos.

Por falar de produtos da ciência, as vacinas nunca deverão ser um imperativo sobre a comunidade, porque caíamos no perigo da ditadura da ciência, quando ela mesma não passa de uma crença. Mas funciona? Não pela ciência, mas pela crença. Foi sempre assim e será sempre assim.

Num artigo publicado no PÚBLICO, David Marçal distingue medicina “alternativa” de medicina “convencional”. Ora, toda a medicina é “alternativa” a qualquer outra crença. Trata-se de uma distinção pueril e imediatista. Mas adiante, mesmo assim a medicina convencional depende da nossa crença nela e ainda por cima tem uma série de limites e erros possíveis que a grande maioria dos doentes desconhece. Mas isso é a natureza da crença. Todos sabemos que os efeitos dos medicamentos desejáveis e indesejáveis derivam da crença que temos neles.

A Psicologia Experimental, no séc. XIX (o estruturalismo da Universidade de Leipzig, como exemplo), atestou que uma droga tem o caminho facilitado ou impedido, dependendo sobretudo da crença que temos nela. A bioquímica fará o seu trabalho, é certo, mas a crença tornará esse efeito eficaz! A eficácia depende da mão humana, nunca do método científico.

Se, no século XIV, os “científicos” eram os hereges, hoje não devem ser os líderes da Santa Inquisição. O problema está sobretudo na ignorância de determinados científicos. Pior é quando a ignorância epistemológica “utiliza” a morte de uma jovem para de cima de um pedestal criticar tudo o que não se rege pelo inquisitório método científico. Ora recordemos que é com base no método científico que muita gente morreu, morre e morrerá, mas sempre em prol da “salvação” de muitos outros e muito do nosso planeta está em acelerada destruição. As provas humanas estão aí (ensaios clínicos duvidosos, energia nuclear, guerras químicas, medicamentos não testados, maus médicos, etc…).

Quem é quem para distinguir ou qualificar aquilo em que cada um deve ou não acreditar? A vontade individual, que define aquilo em que cada um deve ou não acreditar, é indivisível e isso está garantido pelo direito natural, que se deve sobrepor a qualquer lei ou decreto. Toda a crença emanada pela vontade individual é necessariamente boa, devendo, contudo, ser bem informada – vale mais que toda a ciência. Mesmo em nome da saúde comunitária há limites para qualificar ou limitar a vontade individual.

 

Sugerir correcção
Ler 244 comentários