“Foi um milagre” não ter havido mais mortes na queda de avioneta

A aeronave embateu no atrelado de um camião estacionado junto a um supermercado. O condutor e os quatro ocupantes do bimotor são as cinco vítimas mortais do desastre.

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O avião incendiou-se e pegou fogo a uma residência Rui Gaudêncio

Quem vive em Tires nas casas junto ao supermercado Lidl já se habituou ao som do motor das aeronaves a voar a baixa altitude. Nesta segunda-feira, no mesmo aglomerado de casas, o som começou por ser esse. Depois ouviu-se um estrondo e várias explosões. As chamas da avioneta chegaram logo à casa de Maria de Fátima.

“Lembro-me de ouvir o avião e de, logo depois, deixar de o ouvir. Imediatamente a seguir, ouvi um estrondo”, conta Maria de Fátima, 54 anos. “Ouvi gritos de dentro da aeronave. Pareciam gritos de rapazinhos. Nos anos que eu viver não vou esquecer isso. Eram gritos de muita aflição. Horrível. Eu perdi a minha casa, mas a vida é tudo.”

O comandante da Protecção Civil do Comando Distrital das Operações de Lisboa, André Fernandes, informou os jornalistas no local que, entre os cinco mortos, estavam os quatro ocupantes da avioneta, três franceses e um de nacionalidade suíça, que seria o piloto. Mas não confirmou as idades das vítimas. A aeronave tinha acabado de descolar do aeródromo de Tires, com destino a Marselha.

No embate, também morreu um português, condutor de um camião estacionado nas traseiras do supermercado, que descarregava mercadoria. O bimotor, com capacidade para quatro ocupantes, embateu no atrelado do camião às 12h05. O ar encheu-se de fumo. Os danos chegaram a um moradia dividida em três habitações que é separada apenas por um quintal do local onde o avião caiu. Os bombeiros e as equipas do Instituto Nacional de Emergência Médica chegaram pouco depois. E umas horas mais tarde viriam elementos da Polícia Judiciária para proceder à investigação.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que não prestou declarações, também se deslocou ao local, “para se inteirar da situação”, segundo o comandante André Fernandes.

Assistidos no hospital

“Quando o avião caiu, a asa rompeu a estrutura da minha casa. Começou a arder e eu fugi com o meu menino, o meu neto de dois anos”, conta Maria de Fátima, uma das quatro pessoas levadas para o hospital. Tem diabetes e com o choque foi aconselhada a ser assistida. O marido tem uma saúde frágil e também recebeu tratamento hospitalar.

“Foi por um triz. Foi um milagre”, completa Elisabete Fortuna, prima de Maria de Fátima e que vive na casa em frente. Poucos instantes antes, Maria de Fátima estava no terraço a regar as plantas. O neto estava com ela. Brincava exactamente no local onde a asa do bimotor de bandeira suíça ficou depois pousada. Foi para dentro com o neto por estar muito calor.

Diz quem viu, como Luís Ramos, que estava a cerca de 100 metros, que o pequeno avião seguia descontrolado, inclinando-se bruscamente para um lado e para o outro, até “cair a pique”, mesmo junto ao supermercado onde Almerinda Ferreira de 67 anos fazia compras.

Clientes fugiram do supermercado

“Tinha as compras no carrinho. Ouvi um grande estrondo. As pessoas tiveram muito medo e começaram todas a fugir. As que tinham carro pegaram no carro, as outras largaram as compras e fugiram a pé”, conta. “Os funcionários diziam para termos calma, mas ninguém tinha calma. Foi um pandemónio”, continua Almerinda, que correu pela porta principal do supermercado.

Nesse momento, Maria de Fátima falava ao telefone com a nora Cláudia, quando ouviu o estrondo e viu as primeiras chamas que lhe destruíam a casa. O telemóvel ficou caído no chão e Cláudia só soube que o filho e a sogra estavam bem quando alertou o marido, que trabalha mais perto, e este se pôs a caminho e chegou ao local.

A avó do menino e o marido vivem no 1.º andar, numa casa colada à do tio-avô da criança. A bisavó Maria da Encarnação tem 83 anos e vive no rés-do-chão. Olha incrédula, na direcção da casa da família, de onde duas horas antes fugiu correndo como podia, deixando a bengala para trás. Com o perímetro de segurança instalado pela PSP, apenas consegue imaginar o que resta da sua casa a partir do que lhe disseram os bombeiros: “As paredes estão todas estaladas, existindo o perigo de o tecto cair.” Sentada no café Lua, Maria da Encarnação não contém as lágrimas.

Também Fernando Fortuna, de 18 anos, viu a avioneta cair, da janela da cozinha. “O meu quarto fica a 15 metros do local da queda”, diz ainda em estado de choque. A mãe, Elisabete, prima de Maria de Fátima, aguarda com ele o momento de poder entrar na casa, que foi selada por segurança. “A minha irmã, quando nos visita, diz-nos sempre: as avionetas voam tão baixo. Qualquer dia, cai uma em cima das casas.”

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