O Centro que cola o país e o projecta até à fronteira

Gulbenkian apresenta estudo sobre a Região Centro e completa um novo mapa do país com os traços da economia e do desenvolvimento.

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MANUEL ROBERTO

Num país fortemente polarizado pelo Porto e por Lisboa, a região Centro parecia estar condenada a um papel secundário no mapa dos recursos com que Portugal enfrenta a globalização. O terceiro estudo da Iniciativa Cidades, promovido pela Fundação Gulbenkian e que hoje será apresentado na Universidade de Coimbra, reconhece os dilemas de uma região entalada entre os dois principais pólos do país, mas atribui-lhe o destino de desempenhar “uma função crucial na geoeconomia do país”, na leitura de Artur Santos Silva, presidente da Gulbenkian: “completar a fachada atlântica do País mais exposta à globalização”, e projectá-la em direcção à fronteira, com Viseu a desempenhar o papel de “intermediação entre o litoral e o interior”.

No desenho do país “funcional” analisado pela equipa liderada pelo economista José Félix Ribeiro e pela geógrafa Teresa Sá Marques, as fronteiras das regiões não obedecem aos limites da administração pública nem às unidades estatísticas que dividem Portugal em NUT II e NUT III (Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos). O que conta são as trocas económicas, as redes de ciência e conhecimento, os destinos das chamadas telefónicas ou as deslocações quotidianas. Nesse padrão, a equipa da Gulbenkian tinha já identificado duas “regiões funcionais”: o Noroeste, que se estende desde a Viana do Castelo a Aveiro e do Porto a Vila Real, e o Arco Metropolitano de Lisboa, que amarra ao poder da capital uma vasta região que passa por Leiria, Santarém, Évora e Sines.

No trabalho que deu lugar ao estudo “Portugal no Centro”, comprovou-se que a região industrializada de Aveiro se ancorava ao grande pólo do Noroeste e que Leiria gravitava em torno de Lisboa. Mas, apesar de espartilhada pelas metrópoles, o Centro, “trava a bipolarização e torna o país mais articulado e sustentado”, diz Teresa Sá Marques. Coimbra tem aqui um papel de pivot, até pelo poder da sua universidade. Mesmo não sendo economicamente tão pujante como Leiria ou Aveiro, Coimbra garante a unidade de toda a fachada Atlântica onde está o Portugal mais rico e competitivo.

Contrariando o padrão do desequilíbrio regional do país, “Viseu sustenta-se numa dinâmica industrial que deu resultados”, diz a geógrafa. “A cidade emerge como um ponto de transição entre o triângulo Aveiro-Coimbra-Leiria e o resto da região”, sublinha Almeida Henriques, presidente da Câmara de Viseu, fazendo a conexão entre a fachada Atlântica e o interior.  

O Centro estudado é mais pobre que a média nacional (13 mil euros de rendimento per capita contra 16.300 no Continente) e as suas exportações não valem mais do que 16% do total. Mas a sua actividade económica está ancorada em recursos naturais. Casos dos lanifícios, nos quais o Grupo Paulo Oliveira, da Covilhã é o maior produtor ibérico, com um volume de negócios de 70 milhões de euros em 2015, da indústria florestal, com unidades da Altri ou da Navigator, com o cluster da indústria cerâmica ou com a produção de energias renováveis. No Centro, está ainda instalada a indústria de moldes ou algumas das mais importantes unidades da indústria automóvel, casos da Renault em Cacia (Aveiro) ou da Peugeot/Citroen, em Mangualde. E no que diz respeito às indústrias de futuro, o Instituto Pedro Nunes, de Coimbra, é um viveiro de onde saíram, entre outras, startups como a Critical Software, a Feedzai ou a Wisdee.

Com 1,7 milhões de habitantes, o Centro sofre com maior intensidade os problemas da “centrifugação populacional” que leva para os pólos mais competitivos as populações das zonas de “baixa densidade”. Cerca de 22% da população tem mais de 65 anos e os índices de escolarização superior são inferiores à média nacional. Estes constrangimentos, nota o estudo, devem ser combatidos. Porque, lê-se no estudo, “a competitividade do País não pode estar só concentrada nas duas regiões metropolitanas. É necessário alargar a base territorial da competitividade nacional”.

Para lá chegar, Almeida Henriques fala da necessidade de regressar ao tema das infraestruturas. A ligação por auto-estrada entre Viseu e Coimbra é “fundamental”, diz o autarca. E a conexão ferroviária com Espanha não pode ficar apenas dependente da linha que ligará Sines a Badajoz. “A falta de uma ligação no Centro é uma fraqueza não apenas para a região mas também para o Norte”, diz Almeida Henriques, que estará esta quarta-feira ao lado de Teresa Sá Marques na apresentação do estudo.

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