Putin e Assad, amigos para sempre?

É um jogo perigoso aquele que a Rússia joga na Síria, defendendo o regime de Bashar al-Assad, que a isola na cena internacional.

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Putin não defendeu Assad, mas disse que as acusações dos EUA fazem lembrar a guerra do Iraque Alexei Druzhinin/REUTERS

Moscovo tem vários interesses na Síria, que defende activamente apoiando militarmente o regime. Mas a posição da nova Administração norte-americana em relação à guerra da Síria pode ser determinante para a continuação desse apoio.

O que pensa a Rússia do ataque químico de Assad?

O Ministério da Defesa russo convidou esta terça-feira a Organização para a Proibição das Armas Químicas para investigar a base área de Shayrat, bombardeada na sexta-feira com 59 mísseis Tomahawk norte-americanos. Os Estados Unidos dizem que terá sido dali que foi lançado o ataque com armas químicas contra a cidade de Khan Sheikhoun, na província de Idlib, numa zona controlada pela oposição, que matou pelo menos 89 pessoas.

Será crucial perceber como é que a Rússia vê o que aconteceu em Idlib, sublinha o Conselho Europeu de Relações Internacionais. “Se Moscovo acreditar genuinamente que resultou de um ataque do regime a uma fábrica de armas químicas (em vez de um ataque químico deliberado do regime de Assad), então será severa na condenação ao comportamento dos EUA, e é possível que haja uma escalada na retaliação.” Isto já aconteceu no ataque a Alepo, quando a Rússia não acreditou que tivesse sido acidental um ataque americano contra tropas de Assad, e o acordo de cessar-fogo foi rompido e começou o violentíssimo bombardeamento que levou à queda dos últimos bastiões de resistência na cidade, sublinha um artigo do think-tank europeu.

Vladimir Putin disse alguma coisa sobre Assad?

O Presidente russo não defendeu o dirigente sírio, embora tenha dito que as acusações norte-americanas o fazem lembrar das “alegações sobre armas químicas no Iraque.” Pegou na frase do momento, e disse esperar mais “notícias falsas” sobre “ataques químicos a Sul de Damasco”, onde há ainda algumas zonas controladas pela oposição síria. Mas não defendeu propriamente o Presidente sírio, Bashar al-Assad. “[Os russos] estão furiosos com Assad. Ele cometeu um suicídio”, disse ao site Al-Monitor Michael Kofman, um especialista militar na Rússia do Instituto Kennan. “A Rússia nunca lhe vai perdoar por ter sabotado a possível reaproximação entre os EUA e a Rússia e ter provocado uma humilhação pública.”

Quais são os interesses da Rússia na Síria?

São múltiplos, tanto em termos económicos como geo-estratégicos. O apoio a Assad dá-lhe acesso a uma base naval no Mediterrâneo, em Tartus, que com a intervenção directa na guerra da Síria está a ampliar. A base de Hmeymim, perto de Latakia – o coração do território de Assad – tem sido o centro estratégico russo desde que entrou na guerra. Por outro lado, ao entrar no conflito de que tanto os Estados Unidos como os europeus se preferiram afastar, até agora, a Rússia quis mostrar que ainda é uma potência com a qual é preciso contar. Além disso, a guerra na Síria é um pólo de atracção e formação de terroristas islâmicos, e isso é uma preocupação para a Rússia, que lida com vários focos de instabilidade na Ásia Central – o atentado no metro de São Petersburgo, na semana passada, atribuído a um natural da Quirguízia, recorda-o. Por outro lado, ao intervir para apoiar Assad, protege um importante cliente de armamento russo.

Militarmente, a Rússia beneficia alguma coisa em entrar na guerra da Síria?

O ministro da Defesa russo, Serguei Shoigu, disse em Fevereiro no Parlamento de Moscovo que “foram testadas 162 armas modernizadas e contemporâneas na Síria”. Só dez armas tiveram uma performance abaixo das expectativas, congratulou-se. Moscovo nunca escondeu que a sua participação no conflito sírio serviria de laboratório para testar os esforços de modernização do seu exército, dizia a National Public Radio norte-americana. Por exemplo, nos primeiros tempos de entrada na guerra, em Setembro de 2015, a Marinha russa disparou mísseis de cruzeiro contra alvos na Síria a cerca de 1500 km de distância – no dia de aniversário de Vladimir Putin.

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