Indiciado na investigação à morte nos Comandos sem dinheiro para viagem para ser inquirido

Ex-comandante do curso em que morreram dois militares foi colocado em Angola. O MP quer voltar a ouvi-lo. Exército diz que não lhe cabe arcar com a despesa.

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Rui Gaudêncio

O director do curso 127 de Comandos em que morreram dois militares, em Setembro do ano passado, foi notificado para ser ouvido uma segunda vez na investigação do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) e da Polícia Judiciária Militar, mas está colocado numa missão em Angola e diz não ter dinheiro para custear a viagem.

Segundo avançou nesta sexta-feira a TSF, citando fonte do processo, o DIAP de Lisboa, que lidera a investigação juntamente com a Polícia Judiciária Militar, não consegue inquirir para já o tenente-coronel que dirigiu o curso porque este alega não ter dinheiro para fazer a viagem de Angola, onde foi colocado pelo Exército numa missão de formação, para Lisboa.

O tenente-coronel já foi ouvido uma vez e indiciado pelo crime de abuso da autoridade por ofensa à autoridade física, mas o Ministério Público quer ouvi-lo de novo por ter fortes indícios de que desrespeitou a hierarquia. Alegadamente, terá recebido ordens, que não cumpriu, para suspender de imediato o curso no dia da morte do jovem militar Hugo Abreu.

Fonte ligada ao processo confirmou ao PÚBLICO que o Ministério Público tinha conhecimento de que o tenente-coronel estava em missão Angola — de resto, não se opôs a essa deslocação, tendo apenas que ser informado do local onde o arguido pode ser notificado — e que notificou o arguido para comparecer nesta sexta-feira para ser ouvido.

Contudo, segundo a mesma fonte disse ao PÚBLICO, o DIAP foi informado de que o director do curso só estará disponível na primeira semana de Julho, quando estará em Portugal de férias, ou então responderá carta rogatória. O Exército não dá o apoio judiciário que poderia pagar a viagem do militar agora.

O director do curso 127 não é, de resto, o único arguido neste processo que se encontra no estrangeiro. Dois enfermeiros estão em missão na República Centro-Africana  — nesse caso, não foi o Exército que informou o Ministério Público dessa missão, como aconteceu com o tenente-coronel, mas os próprios enfermeiros militares.

Alexandre Lafayette, advogado do director do curso 127, disse à TSF que desde Novembro que o seu cliente espera pela resposta a um pedido de apoio judiciário, alegadamente previsto no Estatuto dos Militares das Forças Armadas, que pagaria despesas com a defesa como a viagem até Lisboa.

Sem esse apoio, o advogado diz que o seu cliente não tem dinheiro para pagar uma viagem tão cara, sublinhando que o militar foi colocado em Angola pelo Exército numa missão planeada desde Junho.

O tenente-coronel Vicente Pereira, porta-voz do Exército, disse ao PÚBLICO que “o Exército está a cumprir a lei”. “É um cidadão que está no estrangeiro a trabalhar e que o Ministério Público quer ouvir. A lei não prevê este pagamento [da viagem] quando um militar é chamado pela justiça, nem o referido apoio judiciário quando os alegados crimes são cometidos no exercício de funções, sendo isso que acontece em qualquer ramo das Forças Armadas ou na Administração Pública.”

Durante o 127.º curso de Comandos dois militares morreram durante um treino militar. Terão sido vítimas de esforço inadequado num dia de muito calor, de suposta violência física e de um alegado deficiente acompanhamento médico. O inquérito-crime às duas mortes, conduzido pelo DIAP e Polícia Judiciária Militar, está em curso e tem actualmente 18 arguidos.

Nesta sexta-feira começou o 128.º curso de Comandos. Dos 106 candidatos, apenas 67 iniciaram a formação: 35 foram chumbados e quatro desistiram. E decorrem ainda exames físicos e psicológicos a alguns militares que começaram a formação.

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