PS insiste em reclamar em tribunal 3,2 milhões da campanha autárquica de 2013

Interpretação da lei que cortou limite nas despesas e subvenção eleitoral levantou dúvidas nos serviços do Parlamento. Assunção Esteves assinou despachos que se contradiziam sucessivamente.

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O passivo do PS ascende actualmente a quase 22 milhões de euros Manuel Roberto (arquivo)

O Supremo Tribunal Administrativo decidiu contra o PS num processo em que o partido reclama da Assembleia da República 3,258 milhões de euros do resto da subvenção da campanha eleitoral das autárquicas de 2013. Mas os socialistas não se conformam e vão recorrer, nos próximos dias, para o pleno daquele tribunal, disse ao PÚBLICO o responsável financeiro do Partido Socialista, Luís Patrão.

O PS argumenta que deveria ter recebido 17,145 milhões de euros de subvenção pública e só lhe chegaram 13,887 milhões devido a, diz, uma interpretação errada da lei de 2013 que reduziu o limite das subvenções eleitorais e das despesas admissíveis em campanhas. O processo inclui vários despachos contraditórios da anterior presidente, Assunção Esteves. São valores altos — 3,2 milhões de euros —, que fazem muita falta à tesouraria do PS, já que o partido tem actualmente um passivo de quase 22 milhões de euros. “A situação não é boa, mas não é tão má quanto se faz passar: temos 21 milhões de euros de capital negativo, mas também temos 14 milhões de euros em activos”, defende-se Luís Patrão.

Este processo do pagamento das autárquicas arrasta-se há três anos e meio e decorre de uma divergência na interpretação da lei do Governo de Pedro Passos Coelho, que voltou a reduzir o tecto máximo da subvenção eleitoral assim como das despesas dos partidos com as campanhas eleitorais, já então cortados em 10% por José Sócrates, em mais 10% até 31 de Dezembro de 2016. Ora, o PS entendeu que se devia ler a lei como definindo uma redução de 20%, ao passo que os serviços do Parlamento consideraram que a redução em várias fases tanto dos limites da subvenção como das despesas daria um corte conjugado de 36%. E foi assim que determinaram os valores a pagar aos partidos — e só o PS protestou.

Em meados de Outubro de 2013, o PS pediu, como prevê a lei, o adiantamento de 50% do montante que lhe cabia da subvenção pública a que tinha direito e dois meses depois recebeu 6.961.807,9 euros por ordem da secretária-geral da AR. Duas semanas depois recebeu mais 6.555.113,47 euros e uns tempos depois mais dois pagamentos de acertos, tendo o valor total chegado aos 13.887.003,33 euros. O PS reclamou que faltavam mais de 3,2 milhões, mas em Abril de 2014 Assunção Esteves indeferiu o pedido e os socialistas foram nessa altura para tribunal.

Três anos nos tribunais

O caso complicou-se no Parlamento enquanto o processo esteve estes três anos no Supremo Tribunal Administrativo. É que em Maio de 2014 Assunção Esteves resolveu pedir um parecer sobre o assunto ao Conselho Consultivo da PGR — que funciona como serviço de apoio ao Parlamento —, que acabaria por ser favorável aos socialistas. Com ele, a secretaria-geral deu ordem para se passar os 3,2 milhões ao PS.

Mas, apenas um mês depois, houve uma reviravolta: Assunção Esteves fez novo despacho a suspender todas as decisões anteriores porque tinha entrado no Parlamento uma proposta de lei interpretativa, do PSD e do CDS, para clarificar como se calculavam as reduções — e que definia que, conjugadas, cortavam não 20% mas 36% nas despesas e na subvenção. E quando essa iniciativa legislativa foi aprovada no Parlamento — com o voto contra do PS e a abstenção do PCP, BE e PEV —, Assunção Esteves fez novo despacho a recusar os 3,2 milhões de euros ao PS.

O Supremo Tribunal Administrativo também recusou a argumentação do PS de que a lei interpretativa de 2014 seria inconstitucional por ser retroactiva, e também negou que os despachos de Assunção Cristas seriam inconstitucionais.

Luís Patrão não se conforma nem com a interpretação nem com a forma como a anterior presidente da Assembleia da República fez “despachos contrariando-se sucessivamente e até com base numa simples iniciativa legislativa e não num diploma aprovado”. Por isso, o partido está a analisar o acórdão dos juízes da secção de contencioso administrativo e irá recorrer para o pleno daquele tribunal.

Legislativas 2015 pagas

Já em 2015, o PS entrou em litígio com o actual presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, sobre a subvenção eleitoral que deveria receber das legislativas de Outubro, mas no caso dizia-se lesado em apenas 120 mil euros. Os socialistas defendiam que a parte da subvenção das legislativas que é distribuída de forma igual pelos partidos que concorrem a mais de 51% deveria ser distribuída por cinco (PS, BE, PAN, PAF e CDU) e não por sete (PS, BE, PAN, PSD; CDS, PCP e PEV). Na dúvida, Ferro Rodrigues pediu pareceres à assessora jurídica do Parlamento e depois ao Conselho Consultivo da PGR — todos consideravam que se dividia pelos sete.

Quase um ano depois das eleições, o PS decidiu “conformar-se e acatou” a decisão da Assembleia da República, disse ao PÚBLICO Luís Patrão. O responsável financeiro do PS faz ainda questão de dizer que o partido já pagou os empréstimos que fez para as legislativas de 2015 e para as regionais dos Açores. “Temos conseguido equilibrar as contas com transparência”, regozija-se, contraditando os números sobre as contas socialistas.

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