Parlamento Europeu define as suas linhas vermelhas para o "Brexit"

Eurodeputados assumem posição dura face a Londres. "Não aceitamos que um estatuto externo à UE que seja mais favorável do que o de membro."

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Nigel Farage acusou a UE de estar a comportar-se como uma máfia Vincent Kessler/Reuters

Só no final do processo que conduzirá à saída do Reino Unido da União Europeia, em 2019, o Parlamento Europeu será chamado a pronunciar-se. Mas nesta quarta-feira, uma semana depois de Londres ter accionado o artigo 50 do Tratado de Lisboa, os eurodeputados definiram já as suas condições para aprovar o acordo que vier a ser negociado – e os recados que enviaram são pouco animadores para as pretensões britânicas.

“A mensagem é muito clara”, disse Guy Verhofstad, líder da bancada liberal que foi nomeado coordenador do PE para o “Brexit”, depois de os eurodeputados terem aprovado por 516 votos a resolução apoiada pelas maiores famílias do hemiciclo. “Seremos muito firmes em relação às autoridades britânicas porque não aceitamos que um estatuto externo à União que seja mais favorável do que o de membro da UE.”

A resolução coincide com a proposta de guião para as discussões que o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, divulgou na semana passada. Mas este documento, que enquadrará o trabalho da equipa de negociadores encabeçada por Michael Barnier, só será aprovado na cimeira de 29 de Abril, pelo que a resolução é a primeira resposta formal à carta enviada pela primeira-ministra britânica, Theresa May. “O vosso papel será essencial do início até ao fim”, afirmou Barnier, lembrando que, apesar de não estarem directamente envolvidos nas negociações, é aos eurodeputados que cabe a “última palavra”.

Tal como o Conselho, o Parlamento Europeu só admite iniciar discussões sobre um futuro acordo de comércio quando forem feitos “progressos substânciais” nas negociações sobre os termos da saída britânica. E sublinha que nesta primeira fase é essencial definir quanto tem ainda Londres de contribuir para os cofres da UE, os direitos dos europeus que vivem no Reino Unido e dos britânicos que residem nos outros Estados-membros, bem como a situação particular da fronteira entre a República da Irlanda e a Irlanda do Norte.

Sobre a “factura do divórcio”, que tanta tinta tem feito correr na imprensa britânica, Gianni Pitella, líder dos socialistas europeus, foi peremptório: “Mesmo quando se deixa uma casa é preciso pagar as contas”. Não menos duro, o presidente do Partido Popular Europeu (PPE), Manfred Weber, disse que os eurodeputados não vão permitir que Londres “escolha só o que lhe convém” do seu actual estatuto.

A proposta de resolução vai mais longe do que o guião de Tusk ao rejeitar que um futuro acordo de comércio preveja condições especiais de acesso ao mercado único para alguns sectores da economia britânica, caso dos serviços financeiros. Os eurodeputados defendem também que um eventual período de transição (entre o momento da saída e aplicação de um novo acordo de comércio) não deve ser “nunca superior a três anos”.

Declarações às quais Nigel Farage, o ex-líder e mentor do partido antieuropeu britânico UKIP, reagiu num tom a que já habituou os eurodeputados. “Vocês estão a comportar-se como a máfia. Pensam que somos vossos reféns”, afirmou, acusando Bruxelas de estar a apresentar “um pedido de resgate”, quando na verdade Londres “é um dos accionistas” da UE. Perante os protestos de várias bancadas, Farage respondeu: “Tendo em conta as sensibilidades nacionais, mudo a palavra para gangsters”.

Barnier respondeu-lhe que a UE quer apenas que o Reino Unido “acerte as suas contas, nem mais nem menos”. E assegurou que a recusa de Bruxelas em negociar em simultâneo o divórcio e o futuro das relações bilaterais não é uma opção “táctica ou destinada a criar dificuldades”. “É uma condição essencial para maximizar as hipóteses de chegar a um acordo em dois anos”. 

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