O espectro da destituição paira agora sobre Michel Temer

Julgamento que pode resultar na perda do mandato do Presidente do Brasil começou mas foi logo suspenso, e não há ainda data para retomar a sessão.

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Presidente Michel Temer quer protelar o arranque do processo LUSA/FERNANDO BIZERRA JR

Começou – e foi suspenso logo de seguida – o julgamento do Tribunal Superior Eleitoral do Brasil que poderá resultar na cassação do mandato do actual chefe de Estado, Michel Temer, acusado dos crimes de abuso de poder económico e político, “em detrimento da liberdade de voto”, ao lado da ex-Presidente Dilma Rousseff, a cabeça da “chapa” que se apresentou às eleições de 2014.

Ao contrário do que aconteceu há pouco mais de um ano, com o processo de destituição de Dilma Rousseff – que mais uma vez se diz inocente –, o país não está suspenso ou em polvorosa com o arranque do julgamento, apesar da gravidade das acusações e das sérias consequências institucionais da sentença. Na prática, uma condenação resultaria num segundo impeachment e na escolha de um novo Presidente para o país, através de uma eleição indirecta da responsabilidade dos membros do Congresso.

Mas os analistas e comentadores políticos, tal como a opinião pública brasileira, estão convencidos que o processo não vai dar em nada, fruto do “sucesso” das manobras de bastidores das forças que conseguiram o afastamento de Dilma da presidência. A palavra de ordem no Palácio do Planalto é ganhar tempo, protelando o processo até se proceder à substituição dos dois juízes do colectivo de sete que estão em fim de mandato – os dois magistrados que ocuparão os lugares (em Abril e Maio) foram indicados por Michel Temer.

Esta terça-feira, os juízes aceitaram um pedido da defesa para adiar o arranque do julgamento, para que possam ser integrados quatro novos depoimentos no processo antes da apresentação das alegações finais dos advogados. A próxima sessão ainda não tem data, mas segundo a imprensa brasileira não deverá acontecer antes do fim do mês.

O processo remonta ao final de 2014 e resulta de uma queixa interposta pelo candidato presidencial do Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), Aécio Neves, que após a derrota exigiu uma declaração de inelegibilidade da “chapa” vencedora e a impugnação da eleição por alegadas ilegalidades no financiamento e outras irregularidades contabilísticas na campanha para a reeleição de Dilma: desde doações entregues por baixo da mesa e fora dos livros de dinheiro vindo de corrupção, até despesas não comprovadas que elevaram os gastos acima do limite imposto por lei.

Para dar força à queixa, e evitar o arquivamento do processo sem julgamento, o PSDB pediu ao tribunal para incluir no processo as informações recolhidas pela justiça no âmbito da Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção em torno da petrolífera estatal Petrobras durante os mandatos de Lula e Dilma. O pedido foi aceite, mas o partido estará decerto arrependido dessa ideia: depoimentos de vários delatores sugeriram que o dinheiro ilegítimo chegou à sede do PMDB de Temer e à própria campanha de Aécio – que reputou as informações de falsas.

Com a destituição de Dilma, Aécio tornou-se um dos principais aliados do PMDB de Michel Temer, que recompensou o PSDB com vários cargos no novo Governo (incluindo para Aloysio Nunes, o vice da “chapa” derrotada que agora é o ministro dos Negócios Estrangeiros). Numa manobra de controlo de danos, o partido apresentou há duas semanas uma adenda à queixa original, para ilibar Temer das acusações de práticas ilícitas da campanha, imputadas em exclusividade a Dilma Rousseff. No entanto, esse não será o entendimento do relator do processo no Tribunal Superior Eleitoral, Herman Benjamin, que já defendeu a jurisprudência que aponta para a indivisibilidade da “chapa” e a cassação do mandato de Michel Temer em caso de condenação.

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