Suspeito de Barcelos: "Alguém devia ter notado que este era um homem de risco"

Especialistas dizem que desemprego, divórcio e “baixa tolerância à frustração” podem ser gatilhos. Psicólogo forense sustenta que violência manifestada suspeito mostra que “o estado de desorganização em que se encontra é muito grande”.

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LUSA/HUGO DELGADO

O desemprego e um divórcio podem servir de gatilho a episódios violentos como o ocorrido ontem de manhã, em Barcelos, com o homicídio de quatro pessoas, mas apenas “se se ancorarem numa personalidade já com dificuldades, com uma baixa tolerância à frustração e incapacidade em lidar com a adversidade”, interpreta o psicólogo forense Rui Abrunhosa.

A partir do que ao longo do dia se foi sabendo sobre o crime e as suas motivações, o professor de psicologia forense na Universidade do Minho descreve o ocorrido como “um assassínio em massa encadeado”. Geralmente, este tipo de ocorrências “acaba com o autor dos crimes a matar-se a si próprio”. Tivesse o crime sido cometido com uma arma de fogo e o mais certo era que tivesse sido esse o desfecho, admite o perito, para acrescentar que “como ele atacou as pessoas com uma faca, era mais difícil matar-se a si próprio com uma facada”.

O facto de o suspeito ter pedido a um vizinho que alertasse as autoridades, às quais se entregou, inscreve-se neste padrão. “Faz parte do funcionamento destes indivíduos. Acham que cumpriram uma missão, que era matar as pessoas em relação às quais desenvolveu uma ideia de vingança, e depois matam-se ou entregam-se, porque o estado de desorganização em que se encontram é muito grande”.

"Havia ali um barril de pólvora prestes a explodir"

A questão para o psicólogo forense está em saber se, entre tribunais, polícias e serviços médicos, “alguém devia ter notado que este era um homem de risco, que havia ali um barril de pólvora prestes a explodir, se ele já estava sinalizado pela polícia, se já havia antecedentes psiquiátricos…”. Porque, em regra, “estas pessoas vão acumulando raiva e tensão e são muito perigosas quando decidem passar aos actos”. 

Lembrando que nem o desemprego nem uma ruptura familiar são “estabilizadores de saúde mental”, o psicólogo forense Carlos Poiares admite que a justiça não tenha “desempenhado bem o seu papel, aplicando uma pena suspensa sem mais nada” e aponta o dedo ao desinvestimento nos cuidados de saúde mental. “Com a crise, abandonamos cada vez mais os cuidados de saúde mental, que sempre foram o parente pobre do sistema, e as estatísticas mostram-nos que temos cada vez mais crimes de homicídio inexplicáveis: mães que se atiram de pontes com os filhos, enfim, situações que mostram a importância da prevenção”, defende.

No ano passado, além do brasileiro acusado de ter matado três brasileiras e atirado os seus corpos para uma espécie de poço, em Tires, concelho de Cascais, sobressai na cronologia dos crimes com três ou mais mortos, o caso do homem de 41 anos que matou os pais e a avó com tiros de caçadeira, em Montemor-o-Velho, suicidando-se de seguida. No ano anterior, na Póvoa de Varzim, um homem dirigiu-se a um café e matou os ex-sogros e a ex-mulher, além de um enteado, com recurso a arma de fogo. Para encontrar outro crime com um grau semelhante de violência, é preciso recuar a 2012. Nesse ano, em Beja, um homem de 59 anos confessou ter matado a mulher, a filha e uma neta com uma catana, alegando "dificuldades financeiras". O homem suicidou-se pouco depois na prisão. 

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