Lúcia estava na ponte de Westminster e conta como um par de sapatilhas a salvou

Lúcia Marafona, 22 anos, portuguesa, estava na ponte de Westminster quando um carro galgou o passeio e atropelou várias pessoas. Quando viu o rasto de sangue, o seu primeiro instinto foi correr.

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Se as sapatilhas não tivessem voado, eu tinha continuado [a andar] e um dos carros tinha-me aleijado”, conta Lúcia Marafona Reuters/TOBY MELVILLE

Lúcia Marafona, 22 anos, estava no sítio errado à hora errada. Às 14h30 desta quarta-feira, estava na ponte de Westminster e assistiu ao ataque. Conta que não teria tido o ímpeto de correr para se salvar se um par de sapatilhas pretas e brancas não lhe tivesse acertado na cabeça. E diz que foi isso que a salvou.

Lúcia estava de férias no Reino Unido com uma amiga. Tinham passado seis dias em Nottingham, na casa de uma tia, e iam ficar apenas um dia em Londres. Nesse mesmo dia, voltariam a Portugal. O plano era ver “o Big Ben, o London Eye e o Madame Tussauds”, conta ao PÚBLICO. 

Estavam na ponte de Westminster a tirar fotografias quando tudo aconteceu. Lúcia Marafona conta que foi um par de sapatilhas que a alertou para o perigo. “Quando estava a tirar a última fotografia ouvi um barulho. Era um par de sapatilhas, umas Superstar pretas e brancas”. Pensou que era uma brincadeira de estudantes, que as tinham atirado de um dos autocarros de tecto aberto. “Foi questão de segundos. Primeiro vi as sapatilhas, depois vi que não havia nenhum autocarro aberto. Voltei a olhar para o lado e estava um senhor deitado. Parecia que estava partido ao meio”, recorda.

“Um carro que está no pára-arranca não se despista”, afirma a jovem. Lúcia Marafona conta ao PÚBLICO que foi esse um dos sinais que a incitaram a fugir. “Eram 14h30, hora de ponta em Londres, e estava bastante trânsito”, descreve a jovem. “O carro até se podia despistar, mas ia chegar ao primeiro muro e parava. Não ia continuar até ao fim da rua”, argumenta. Foi aí que teve a certeza que era premeditado. Não viu o carro porque estava do lado oposto da rua e os autocarros tapavam-lhe a visão, mas “viu pessoas a gritar” e o “sangue no chão”.

“Não sei se foi instinto de sobrevivência”

Quando vi o rasto de sangue e as pessoas no chão, comecei a correr e disse à minha amiga para correr também porque era um atentado”, recorda. Agiu com sangue frio. A amiga “estava paralisada, em pânico”. Não se sentiu capaz de ajudar ninguém porque teve "muito medo”, confessa.

Quando chegou ao final da rua, ligou para a tia que estava em Nottingham para a avisar do que tinha acontecido. Foi uma forma de precaução: “se explodisse uma bomba ou houvesse um tiroteio”, alguém tinha de saber onde estava, para a encontrar “num hospital”, refere. Foi na mesma altura que chegou “a polícia marítima, para socorrer a senhora que se tinha atirado” da ponte de Westminster. Uns segundos depois, ouviu “sirenes por todo o lado” e viu polícias a correr para o local.

Conta ao PÚBLICO que correram até chegarem à paragem do autocarro que tinham de apanhar para o aeroporto. Pelo caminho pararam algumas vezes para pedir indicações, e toda a gente lhes pareceu alheada do incidente. “Os londrinos estavam a viver a sua vida normalmente”, recorda.

Tentou apanhar o autocarro o mais depressa possível, porque só havia três veículos e quem não entrasse teria de fazer a viagem de comboio. Conseguiu. Chegada ao aeroporto, notou um reforço do perímetro de segurança, com polícias armados.

"Não quero voltar a Londres"

A segurança para entrar na zona das partidas era apertada. “Tinham mais gente a trabalhar lá do que o normal”, avalia. “Em cada 10 malas, cinco eram abertas, a maioria por causa dos líquidos. E se não fosse pela mala, era porque as pessoas tinham que passar várias vezes no detector de metais”.

No voo seguiam pessoas “cansadas e um pouco assustadas”. “Faziam perguntas, queriam saber se estávamos bem e estavam preocupadas”, recorda Lúcia Marafona.

O regresso a casa foi emotivo. As mazelas físicas ficam-se por uma dor no ombro, mas, apesar de se esforçar por não pensar muito no que aconteceu, Lúcia é peremptória: “Não quero voltar a Londres”.

Conta que a memória mais presente é a do homem que estava à sua frente “cortado ao meio", o dono das sapatilhas. Não lhe chegou a ver a cara, pelo que não o consegue reconhecer pelas fotografias, mas gostava de saber se está bem. “Se as sapatilhas não tivessem voado, eu tinha continuado [a andar] e um dos carros tinha-me aleijado", conta.

Texto editado por Hugo Daniel Sousa

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