Brasil divulga lista das empresas envolvidas no escândalo da carne

Portugal foi importador directo de uma das empresas nos últimos 60 dias, sendo a União Europeia mencionada em mais três unidades de processamento. É cada vez mais longa a lista de países que baniram temporariamente a carne brasileira.

Foto
xx direitos reservados

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do Brasil publicou informação sobre as empresas, os mercados de destino das exportações e as infracções em que estão a ser investigadas as unidades de processamento no âmbito da Operação Carne Fraca, conhecida publicamente este fim-de-semana.

Para demonstrar que está empenhado em reverter o impacto da investigação que a Polícia Federal está a realizar há dois anos, com alcance a seis estados do país sul-americano, às condições sanitárias de carne bovina, avícola, de porco e enchidos, alguma delas com exportação para o resto do mundo, o ministro Blairo Maggi mandou publicar a lista de empresas que estão a ser investigadas. E porquê.

Na lista das “empresas citadas na Operação Carne Fraca, para onde exportaram nos últimos 60 dias, em quais mercados chegaram e os produtos comercializados”, conforme é identificada no “site” do governo brasileiro, (e que pode ser consultada aqui), Portugal aparece uma única vez sozinho como destino de exportação: da Seara Alimentos Ltda (pertencente ao grupo JBS), com “miúdos congelados de frango”.  

O país comprou  no ano passado 524 toneladas de carne bovina e avícola ao Brasil, mas quer a Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária, quer o ministro da Agricultura Luís Capoulas Santos, já vieram tranquilizar os consumidores portugueses.

Também da Seara, a União Europeia, como bloco económico, recebeu nos últimos dois meses o mesmo tipo de produtos, mas também “carne congelada de frango”, “carne salgada congelada de frango” e “carne temperada congelada de frango”.

Da BRF, um dos maiores grupos alimentar do Brasil, a União Europeia consta da lista como destino de exportação de “carne temperada de peru” nos últimos 60 dias.

Finalmente, a UE recebeu, segundo os dados do ministério brasileiro, própolis (derivado da produção de mel de abelhas), da Breyer & Cia Ltda.   

Um outro Estado-membro, a Holanda, sozinha, consta como receptora de “carne congelada de bovinos sem osso” e de carne resfriada de bovino sem osso”, da empresa JZZ Alimentos SA.  

Das 21 entidades mencionadas na lista do ministério da Agricultura, 14 não exportaram durante os últimos dois meses, de acordo com a informação oficial do governo de Brasília.

Porque estão a ser as empresas investigadas?

O que está em causa na Operação Carne Fraca, empresa a empresa, é igualmente identificado pelo ministério liderado por Blairo Maggi, num outro documento disponibilizado. Assim, focando primeiro as exportadoras para Portugal e para a União Europeia: a Seara (da JBS) está a ser investigada por “irregularidades no procedimento de certificação sanitária”; a BRF SA está a ser investigada, segundo o ministério, por “corrupção, embaraço [obstrução] da fiscalização internacional e nacional, tentativa de evitar suspensão de exportação”; a Breyer & Cia LTDA por “corrupção”; e a JJZ Alimentos SA por “embaraço da actividade de fiscalização e corrupção”.

Mas a investigação recai ainda sobre alegados actos de empresas - que não exportaram nos últimos 60 dias nem para Portugal, EU e/ou Holanda -, de utilização indevida de selos do Ministério “pelo funcionário da empresa”, de “poluição ambiental”, de “utilização de carne estragada em salsicha e linguiça”, de “uso de aditivos acima do limite ou de aditivos proibidos”, e de outras “irregularidades em apuração”.

Em comunicado emitido esta quarta-feira, o ministério brasileiro que tutela a Agricultura e a Pecuária recorda que a operação deflagrada na última sexta-feira (17 de Março) tem como foco “a eventual prática de crimes de corrupção por agentes públicos”. São 33 os funcionários tutelados por aquele ministério, que estão identificados também pelo governo brasileiro.

Empresas ficam sem certificado de exportação

O governo brasileiro comunicou entretanto a “todos” os seus parceiros comerciais – o país exporta carne para mais de 100 países o que lhe garante uma receita de cerca de 14 mil milhões de dólares (13 mil milhões de euros ao câmbio desta quarta-feira) – “que compram carnes dos 21 frigoríficos [unidades de processamento] investigados pela Polícia Federal” que decidiu “a suspensão dos seus registros de exportação”, citando Blairo Maggi. No total, estão em causa 40 empresas – a JBS, a BRF e a JZZ, entre outras, já vieram negar as acusações.

Responder aos pedidos de esclarecimento “de governos estrangeiros sobre a Operação Carne Fraca da Polícia Federal”, é para o ministro uma oportunidade para o governo brasileiro evitar embargos totais e por tempo indeterminado. “Estamos dando aos mercados importadores a garantia de que não há problemas com os produtos embarcados. Não podemos ser embargados definitivamente pelos países, porque teríamos prejuízos imediatos e no futuro.”

Segundo a nota de imprensa do ministério brasileiro, o objectivo actual “é tranquilizar os mercados interno e externo”. “Nosso sistema detecta tudo. É totalmente rastreado. Ontem, por exemplo, vimos que havia um caminhão levando mercadoria para o Chile. Então, pedimos ao frigorífico que o veículo retornasse para não criar problema com o país. Podemos determinar, por exemplo, em qual navio e em qual posição no mar estão os contentores”, explicou Maggi, citado na nota à comunicação social.

Recorde-se que o governo de Micael Temer decidiu desde logo decretar o encerramento da unidade da BRF (aves) em Mineiros (estado de Goiás) e duas do grupo Peccin, em Jaraguá do Sul (estado de Santa Catarina) e Curitiba (Paraná).

Que países restringiram já as importações de carne do Brasil?

Até hoje, quarta-feira, a lista de países e blocos regionais que baniram temporariamente a importação de carne com origem no Brasil não parou de crescer.

A União Europeia, que vincula Portugal como Estado-membro, decidiu suspender temporariamente a importação de produtos de quatro das unidades (as que exportam para o bloco) sob investigação na Operação Carne Fraca. A Suíça decidiu o mesmo.

A China (maior parceiro comercial do Brasil), que em conjunto com a UE absorve um terço das vendas para o exterior de carne daquele país sul-americano, suspendeu a entrada daqueles alimentos até o Brasil prestar mais esclarecimentos. Hong Kong foi no mesmo sentido.  

A Reuters avançava mesmo no final do dia de hoje que “alguns dos maiores distribuidores alimentares da China estão a retirar a carne de vaca e de aves das prateleiras dos seus supermercados”.

Na Coreia do Sul, o ministério da Agricultura decidiu intensificar as inspecções à carne de aves importada do Brasil. Inicialmente o país suspendeu a venda de aves e derivados do grupo BRF, mas a Reuters garantia esta tarde que a medida já terá sido levantada.

A Arábia Saudita, segundo maior comprador de carne de aves ao Brasil (a seguir à China e Hong Kong), anunciou esta quarta-feira que a autoridade de inspecção alimentar iria “intensificar as inspecções” da carne brasileira importada, de forma a averiguar que os produtos cumprem com os requisitos regulamentares do país.

O Egipto suspendeu temporariamente a autorização de novas importações de carne com origem no Brasil, até que a investigação da Polícia Federal do Brasil traga resultados. E aumentou a inspecção nas infra-estruturas portuárias.

Omã, por seu turno, está a aguardar por “provas conclusivas” de adulteração de carne no Brasil, avançou o ministro da Agricultura do sultanato, numa entrevista citada pela Bloomberg. “Temos que tomar medidas apropriadas”, caso a situações tome outros contornos, acrescentou, adiantando que uma opção é “banir as importações de uma região brasileira” determinada caso se prove que houve adulteração dos produtos importados por Omã.

No Chile, a suspensão temporária recaiu especificamente sobre a carne de vaca do Brasil. O México, que não compra carne de vaca e de porco ao país, suspendeu desde 19 de Março as importações de produtos pecuários, ou seja, produtos avícolas como carne (refrigerada, congelada e desidratada) de frango e de peru, e ovos.

Na África do Sul foi anunciada já a suspensão da importação de carnes das 21 unidades frigoríficas suspeitas de envolvimento no esquema de fraude descoberto pela polícia. Em paralelo, serão “testados todos os contentores de carnes do Brasil que chegarem aos portos sul-africanos”.

No Canadá, a decisão foi suspender a importação de duas das unidades sob investigação, que tinham autorização para exportar para o Canadá, “mas não venderam para o país nos últimos seis meses”, cita a Reuters. 

Sugerir correcção
Comentar