Sete razões actuais para defendermos um federalismo democrático europeu

Acreditamos que seja possível prosseguir atualmente com alguns avanços federais. Tememos muito mais uma Europa a várias velocidades, não caminhando em conjunto.

O federalismo democrático é a formula mais adaptada e mais prática para, em democracia, unir povos, culturas e línguas diversas. Sendo compatível com a diversidade nacional. Não é necessário descobrir nada. O federalismo democrático está há muito descoberto. Iniciou-se na Convenção de Filadélfia em 1787, criando os EUA como um sistema federal presidencialista. Continuou-se na Suíça, em 1847, após a guerra civil entre católicos conservadores e rurais e radicais protestantes de cantões industrializados, que ganharam. Criaram um federalismo parlamentarista que a nosso ver deveria inspirar a União Europeia (UE)! Seguiram-se mais de 150 anos de paz e desenvolvimento, para o qual o federalismo contribuiu significativamente!

A pequena Suíça é o melhor exemplo das potencialidades federais. O mesmo se passa como a grande e populosa India. O futuro democrático da China só será viável através desta via. Compreendendo-se que quando todos os estados (ou cantões) estão representados em absoluta igualdade numa câmara federal, deverá existir legislação específica para, se necessário, que sejam criados novos estados. A atualidade exige mais federalismo para a Europa.

Dai, (contrariamente aos fazedores de cenários) acharmos preferível assinalar os desafios que, objetivamente, se colocam à UE e ao mundo, que conduzem à necessidade de avanços federais no processo de construção europeia. Tememos que a Europa a várias velocidades seja, apenas, a continuação de um passado de fugas para a frente que, finalmente, conduziram à introdução do euro sem adequadas estruturas federais que impeçam o desenvolvimento assimétrico, a que temos assistido, entre um norte favorecido e um sul desfavorecido!

Os avanços federais, no processo de integração europeia, tornam-se, contudo, prementes.

1. Para que seja criada uma vanguarda mundial na defesa do ambiente. Sobretudo quando, com a vitória de Donald Trump nos EUA, este vacila-para não dizer mais- nesta problemática. Contribuindo, também, para que se acelere a conversão industrial da Europa através do desenvolvimento de uma industria limpa. Que deverá ser financiado por um orçamento europeu.

2. Torna-se urgente regular a globalização, para deslegitimar as tendências populistas e isolacionistas na moda. Os países que se sentem prejudicados com o processo da globalização serão tentados pelo isolacionismo. Não deixando de ser deveras preocupante, quando um desses países são os EUA.

3. O federalismo democrático é a única solução para se democratizar a União Europeia. A proporcionalidade populacional só vai privilegiar a presença da Alemanha. Torna-se necessária a existência de uma câmara federal em que a representatividade seja nacional e igualitária. Assim como é indispensável dar ao Parlamento Europeu iniciativa legislativa! A introdução de referendos a nível europeu permitiria auscultar a globalidade da população europeia, reforçando o sentimento de pertença coletiva.

4. Certas políticas sociais deveriam ser de âmbito europeu, financiado por um orçamento federal. Atendendo à gravidade de situação da natalidade a nível europeu, a politica natalícia deveria ser estimulada através da atribuição de (pelo menos) o salário mínimo nacional ao cônjuge que decidir consagrar-se aos filhos. Isso a partir de um segundo filho!

5. A defesa da União Europeia deveria passar a ser um problema, sobretudo, europeu, dependendo do orçamento europeu. Este poderia ser um pilar da NATO. Mas europeu! A postura da Rússia justifica-o cabalmente! Sobretudo depois do exemplo da Ucrânia. Não podemos continuar a basear a nossa segurança nos EUA - com ou sem Trump - que já por duas vezes, no século passado, vieram “salvar” o Velho Continente!

6. A coordenação das polícias é condição necessária na luta contra o terrorismo islamista. Mais do que a coordenação existe agora uma oportunidade para se criar uma polícia transnacional capaz de se especializar num terrorismo que está para durar, com implicações óbvias na deriva islamofóbica, favorecendo a extrema direita europeia.

7. Finalmente, a Europa precisa de um orçamento federal digno desse nome. Lembramos que o orçamento federal helvético e norte-americano rondam os 20 a 30% dos nacionais. O da União Europeia não chega a 1%! Um orçamento semelhante ao Suíço permitiria, cabalmente, compensar as divergências de desenvolvimento devida à introdução do Euro!

Estas sete propostas traduzem, apenas, a explicitação clara de exigências atuais, nas quais milhões de europeus se reconhecem. Acreditamos que seja possível prosseguir atualmente com alguns avanços federais. Tememos muito mais uma Europa a várias velocidades, não caminhando em conjunto. Não sabendo para onde vai... 

 

Eurico Figueiredo, Catedrático de Psiquiatria jubilado, do ICBAS,  Uni. Porto; Fernando Condesso, Catedrático de Ciências Políticas jubilado do ICSP, Un.Lisboa; J. Adelino Maltez, Catedrático de Ciências Políticas no ICSP. Uni. Lisboa

 

 

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