Há 750 anos de palácios, igrejas, conventos e vilas por descobrir no Lumiar

Perde-se a conta às quintas do centro da freguesia. Perde-se as voltas às lendas do Paço do Lumiar. A freguesia mais antiga de Lisboa, inspiração de Almeida Garrett, é um livro aberto de 25 de Março a 2 de Abril, na quarta edição da LisbonWeek.

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Os cromáticos do argentino Felipe Pantone já preenchem toda a lateral de um prédio na Praça Bernardino Machado Daniel Rocha
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Francisco Vidal inspirou-se nas criações de um grupo de jovens do Centro Social da Musgueira Daniel Rocha
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Os cromáticos do argentino Felipe Pantone já preenchem toda a lateral de um prédio na Praça Bernardino Machado Daniel Rocha
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A obra de Rui Alexandre Ferreira (RAF) estará completa no dia 25, quando começar a LisbonWeek Daniel Rocha
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A obra de Rui Alexandre Ferreira (RAF) estará completa no dia 25, quando começar a LisbonWeek Daniel Rocha
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Os cromáticos do argentino Felipe Pantone já preenchem toda a lateral de um prédio na Praça Bernardino Machado Daniel Rocha

Era raro o dia em que Rui Alexandre Ferreira (RAF) não passasse pela Rotunda dos Corvos, no Lumiar, e sentisse que aquele mural estava por acabar. Lia-se, desde 2013, “tão nobre e sempre leal cidade de Lisboa” a letras pretas, simples, sobre um fundo amarelo. Hoje, os quase mil metros de muro numa das artérias do Eixo Central são uma obra de graffiti renovada: há novas letras, maiores e roxas, por cima. A frase é a mesma. Os corvos negros continuam lá. Estará completa no dia 25, quando começar a LisbonWeek, o evento que trouxe RAF de volta a casa para terminar a sua obra.

O trabalho de RAF é o terceiro de quatro obras de arte urbana que o Lumiar vê surgir nas vésperas do início da quarta edição da LisbonWeek, dedicada em pleno a esta freguesia nos limites da cidade de Lisboa. Pode ser visitado no “Circuito Arte Urbana”, um dos cinco percursos que, de 25 de Março a 2 de Abril, “desbloqueia as burocracias” para visitar mais de uma dezena de espaços históricos – não necessariamente conhecidos – da freguesia mais antiga de Lisboa. Cinco percursos de duas horas para conhecer uma freguesia com 750 anos de palácios, igrejas, conventos e vilas “por descobrir”.

Inês Pais, historiadora e guia da LisbonWeek, convida os lisboetas a pensarem esta zona da cidade sem as “cicatrizes” urbanas da Segunda Circular e da Calçada de Carriche. “As visitas culturais são um convite à descoberta de uma zona no limiar de Lisboa, que, sendo no limite, fazia a ligação entre o campo e a cidade”, explicou. Os percursos são diários, com três horários por dia, e com bilhetes entre 7 e 10 euros.

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A escolha do Lumiar não foi óbvia para a organização, a Associação Cultural e Turística Urbana (ACTU). A semana de eventos dedicados à capital realizou-se em 2012 e de 2013, de forma dispersa pela cidade. Após um ano de pausa, regressou em 2015 concentrando actividades na freguesia de Alvalade. Sobre o tema “Cada bairro, uma cidade”, a organização dirigida por Xana Nunes lançou o repto de dar a conhecer o Lumiar, em parceria com a Câmara Municipal de Lisboa.

A preparação demorou um ano e meio e desde o início a arte urbana surgiu “naturalmente” como uma estrela da programação. “Faz parte da identidade desta zona da cidade”, assegura Margarida Cruz, especialista neste tipo de expressão artística. Nota que vários dos artistas convidados já têm obras feitas na freguesia.

Os cromáticos do argentino Felipe Pantone já preenchem toda a lateral de um prédio na Praça Bernardino Machado. São 45 metros de altura cobertos por uma paleta de cores semelhante aos pixéis de um ecrã. Também Francisco Vidal tem a sua obra pronta. Já sem andaimes nem gruas, o artista português olha para o início de uma longa e colorida pintura na parede de um prédio na esquina da Alameda da Música com a Rui Luís Piçarra, feita em parceria com Dirty Cop e Adres. Um trabalho inspirado nas criações de um grupo de jovens do Centro Social da Musgueira, criados em dois workshops com o artista.

A arte urbana é a “arte marginal” que Francisco Vidal se esforçou por fazer entrar na vida destes jovens. Chama-lhe a “pedagogia do desenho”: usar os murais para educar. “Através da arte, desta em especial que é marginal, podemos aproximar-nos de um acesso mais igual à cultura”, acredita. Nesta longa parede pintada à beira da entrada, a sua arte é como a quer: acessível.

Jardins de Garrett

“Ali no seu Lumiar, entre as sinceras/Belezas desse parque, entre essas flores,/A qual mais bela e de mais longe vinda/Esmaltar de mil cores”. Inês Pais diz que estão “esquecidos” estes jardins que inspiraram Almeida Garrett a escrever o poema “No Lumiar”. A historiadora fala do Parque Botânico Monteiro-Mor, entre o Palácio de Angeja-Palmela, sede do Museu Nacional do Traje, e o Palácio que dá nome ao jardim, onde fica o Museu Nacional do Traje e da Moda.

É um dos locais de passagem, de conversa e de reflexão do “Percurso da Natureza”, um circuito feito a pé para promover a ligação do meio ambiente aos lisboetas, “tão habituados a um tipo diferente de cidade”. Ali, às portas do jardim, “nem parece que estamos em Lisboa”, constata a historiadora.

No Jardim de Telheiras, os moradores são convidados a conviver com dois “Estúpidos”, os gigantes coloridos de Robert Panda. As duas esculturas do artista vão estar em permanência neste jardim, junto ao metro de Telheiras (são preenchidos com cimento de forma a garantir que não vão a lado nenhum).

Se calhar de entrar no metro nesta estação, depois de passar por um “Estúpido”, pode tocar piano antes de seguir viagem. A LisbonWeek vai colocar pianos nas estações de metro da Quinta das Conchas e Telheiras, disponíveis a qualquer pessoa que queira tocar.

“Entender o Lumiar como um conjunto” é um dos desafios desta edição. Para isso, a Lisbon Week coloca o vereador do Urbanismo da Câmara de Lisboa, Manuel Salgado, os arquitectos José Veludo e Gonçalo Antunes, e moradores de alguns bairros da freguesia a discutir o urbanismo no Lumiar. Em cima da mesa vão estar questões como a forma como a arquitectura de determinadas zonas da freguesia contribuiu para reduzir a criminalidade. A conferência acontece dia 29, no Jardim de Inverno da Quinta dos Lilases, com entrada livre.

Os horários das visitas e o resto da programação podem ser consultados no site da LisbonWeek.

Há artes para todo o Lumiar

O “Lumi” em fotografia

Os fotógrafos Carlos Ramos, Luis Mileu e Rui Aguiar foram convidados a retratar as pessoas, os espaços e a história do Lumiar. Deste exercício resultaram três olhares diferentes, que, a partir de dia 25, podem ser vistos entre as 9h30 e as 17h30, na Galeria Liminare, ao lado da Junta de Freguesia do Lumiar. A entrada é livre.

Cinema volta aos estúdios da Tobis

O antigo estúdio da Tobis abre portas, desta vez não para rodar filmes, mas para os apresentar ao público. De 27 de Março a 2 de Abril, são exibidos filmes como A Canção de Lisboa (1933) e O Leão da Estrela (1945) no mesmo estúdio onde foram gravados. A sétima arte vai também passar pela Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro onde será possível ver a Balada de um Batráquio de Leonor Teles, Cartas da Guerra de Ivo M. Ferreira e Os Maias (Alguns) Episódios da Vida Romântica de João Botelho. Ao todo, são 20 filmes, entre curtas e longas metragens.

Maior templo hindu da Península Ibérica

Mais do que entrar no Templo Radha Krishna, o maior templo de culto hindu da Península Ibérica, a LisbonWeek associa a esta visita uma série de experiências da “cultura indiana”: workshops de yoga e dança, actividades dedicadas ao chá, comida vegetariana e Hena (corante natural usado para fazer tatuagens temporárias).

Música na Quinta das Conchas

E quando o fado se junta a um DJ resulta? Os Bela Quarteto e Mike Stellar estão prestes a experimentá-lo com o projecto Fado Redux. Actuam dia 30, às 20h, no salão nobre do Palacete da Quinta das Conchas. O mesmo espaço vai receber também o hip-hop do rapper Estraca (dia 31, às 22h) e o jazz de Patrícia Vasconcelos (dia 1, às 21h). Os bilhetes custam entre 5 a 10 euros.

As roupas do teatro e da dança em exposição

Os figurinos criados por José António Tenente, Dino Alves e os Storytailors não voltaram para palco, mas saíram do armário. Vão estar, a partir de dia 25, em exposição no Museu Nacional do Teatro e da Dança (MNTD) entre as peças de vários criadores dos figurinos que bailarinos e actores vestiram nos palcos portugueses nos últimos anos. Esta é ainda uma mostra “embrião” de uma grande exposição de guarda-roupa que o museu está a preparar.

Os desenhos de António Soares para decorar o Bristol

Sabia-se que António Soares, uma das maiores figuras do modernismo português, tinha trabalhado no teatro e na dança, mas não havia vestígios desse trabalho. Até que José Alvares, director do MNTD, os foi procurar e encontrou muito “trabalho de palco e para palco”. São 160 peças do pintor e ilustrador -cenários, figurinos, retratos de actores, projectos de decoração (como o do Bristol Club) - em exposição no museu, a partir de dia 25. 

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