Galerias nacionais vendem cada vez mais para estrangeiros na Arco Madrid

A feira espanhola correu entre o "razoável" e o "óptimo" para os galeristas portugueses. Há stands que venderam exclusivamente para colecções internacionais.

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No balanço que fazem da Arco Lisboa, 11 das galerias presentes sublinham as vendas a coleccionadores estrangeiros EMILIO NARANJO/EPA

“Foi uma boa estreia”, resume Pedro Alfacinha sobre a sua primeira vez na Arco, a feira internacional de arte contemporânea que juntou em Madrid 200 galerias no final de Fevereiro. O galerista lisboeta esteve entre as 13 galerias portuguesas seleccionadas pela Arco, no seu caso no programa especial Opening, vocacionado para as galerias mais novas, e com um stand totalmente dedicado à dupla de artistas Von Calhau! (Marta Ângela e João Artur).

Pedro Alfacinha vendeu obras para a colecção da Fundación Arco, compras normalmente anunciadas no final da feira espanhola, que decorreu entre 22 e 26 de Fevereiro com a expectativa redobrada de ver finalmente consumada a recuperação do mercado da arte depois da crise. “Para a Fundación Arco venderam-se duas peças fundamentais do stand, dois desenhos. A feira correu bem porque venderam-se coisas e fizeram-se contactos.”

A segunda estreante da feira, a Galeria Madragoa, também afirma que a Arco correu bem, por causa dos muitos contactos realizados. O italiano Matteo Consonni, um dos sócios da galeria lisboeta, lembra que a instalação performativa de Luís Lázaro Matos, igualmente apresentada na secção Opening, “era um projecto um pouco estranho para o formato da feira, mas foi muito bem recebido por curadores, coleccionadores e públicos”. Em termos de vendas, Consonni conta que o trabalho do artista foi comprado para “boas colecções” em Itália, Espanha, Equador, Roménia e Brasil. “Temos ainda uma conversa com uma instituição pública em Itália que pode comprar a instalação performance. O que já vendemos foram desenhos resultados da performance.”

Igualmente na secção das galerias mais novas estava a portuense Kubikgallery, no seu terceiro ano na Arco. João Azinheiro destaca também o lado “arriscado” do projecto apresentado pela artista galega Carme Nogueira, outra instalação única. “Foi óptimo. Temos dez obras fechadas.” Em Madrid, conseguiu concluir negócios que já vinham de Portugal, com outros artistas da galeria, como Sérgio Fernandes e Pedro Tudela. Agora a Kubikgallery já está em São Paulo, onde tem um escritório, a preparar a SP Arte, a feira de arte contemporânea marcada para o início de Abril. “São Paulo não é um investimento pacífico, requer algum planeamento: visitas às instituições, aos coleccionadores e aos ateliers dos artistas com quem trabalham. É todo um trabalho de aproximação aos clientes.”

No balanço que fazem da Arco Madrid, 11 das galerias presentes sublinham as vendas a coleccionadores estrangeiros, que cada vez mais substituem a idiossincrasia de ir à feira de Madrid para vender artistas portugueses a coleccionadores portugueses. É quase unânime, embora com uma ou duas desilusões, que esta edição correu bem para os galeristas nacionais, que também reconhecem ter actualmente stands mais diversos.

“Foi óptimo. Foi o melhor ano”, diz ao PÚBLICO Jorge Viegas, da Galeria 3+1 Arte Contemporânea, em Lisboa, acrescentando que já é a oitava vez que vai a Madrid. “É o resultado de as pessoas nos conhecerem. Não é uma feira que se possa fazer num ano sem ir no outro. Agora temos vários meses para continuar a trabalhar os contactos que fizemos.” Vendeu 11 trabalhos dos quatro artistas que tinha no stand (Claire de Santa Coloma, Carlos Nogueira, Cristina Garrido e Rosana Ricalde), e que agora integrarão a colecção de uma fundação venezuelana sedeada em Miami, uma colecção mexicana, a colecção Otazu, em Espanha, e outras colecções privadas europeias, nomeadamente da Áustria e da Dinamarca. “Não vendemos a portugueses. Está a mudar um bocadinho aquela coisa de os portugueses irem a Madrid comprar a portugueses. É sinal de mais maturidade e de que a nossa proposta também é mais internacional.”

Mais espanhóis a comprarem do que portugueses e um grande interesse pela pintura é o que também destaca José Mário Brandão, que tem galeria aberta em Lisboa. Vendeu cerca de dez trabalhos de José Almeida Pereira e de Paulo Lisboa, que eram as suas apostas. De Paulo Lisboa, vendeu para uma colecção privada de carácter público de Navarra, para uma colecção privada de Barcelona (e há uma galeria do México interessada em expô-lo). Quanto a José Almeida Pereira, seguiu para colecções em Espanha e no Porto, havendo também o interesse de uma galeria de Berlim. “Agora há várias coisas que vão ser exploradas.”

José Mário Brandão, que já faz a feira desde 1985, explica o aumento das vendas a coleccionadores estrangeiros com a afirmação dos artistas portugueses nos últimos anos: "Começaram a ter uma força que vem da qualidade e a ser vistos pelos estrangeiros de uma maneira completamente diferente. É o resultados do trabalho de alguns artistas e de algumas galerias que conseguiram ultrapassar a barreira dos Pirinéus."

Um mercado a despertar

Mais uma vez, a feira correu muito bem, conta Bruno Múrias, numa conversa telefónica a partir de Nova Iorque, onde a Galeria Múrias Centeno esteve nos primeiros dias deste mês a participar na Independent, que funciona só por convites e coincide com a grande feira de arte da cidade, o Armory Show. “Temos muita empatia com a Arco Madrid, porque nos é bastante familiar. É seguramente a feira que nos corre melhor.”

Entre as vendas, destaca trabalhos de Mauro Cerqueira, Marcelo Cidade, Carla Filipe, Max Ruf, Dan Rees, Adriano Costa e Musa paradisiaca. “Essencialmente os artistas que tínhamos no stand. Foi, de facto, impressionante.” Em Nova Iorque, aonde levaram só portugueses (Carla Filipe, Silvestre Pestana e Ana Cardoso), já tinham tido contactos com coleccionadores como a Rubell Family Collection, uma das mais importantes colecções privadas norte-americanas.

Manuel Ulisses, da Galeria Quadrado Azul, com porta aberta em Lisboa e no Porto, não é tão optimista como os seus colegas: “Não correu como nos outros anos, como gostaria que corresse, mas correu bem. Há sinais de que tudo isto está a despertar. Já não é aquele medo de há dois ou três anos, e as pessoas estão a voltar outra vez a comprar.” Em Madrid, venderam cerca de cinco peças, de Francisco Tropa, Ana Santos, Gonçalo Sena e Paulo Nozolino. “A Ana Santos conseguiu uma residência artística no México e foram feitos alguns contactos, que ainda podem dar resultados, no caso de Ana Santos e de Pedro Tropa.”

Já para o galerista Pedro Cera o balanço é muito positivo. “Foi uma excelente edição.” A galeria vendeu trabalhos de Adam Pendleton, Gil Heitor Cortesão, Tobias Rehberger, David Thorpe, Marinella Senatore, Ana Manso, Miguel Branco e Dora Longo Bahia. “Uma obra para uma fundação espanhola e outra para uma fundação portuguesa, o restante a particulares. Perto de 90% das vendas para o estrangeiro.” E ficou muito trabalho adiantado para a Arco Lisboa. “Foi francamente bom.”

Cristina Guerra também vendeu maioritariamente para colecções estrangeiras, repartidas por Bélgica, Espanha, EUA e Portugal: João Louro para duas colecções espanholas (uma fundação das Canárias e a colecção Los Bragales), Luís Paulo Costa e Lawrence Weiner para uma colecção particular de uma das coleccionadoras do board do Dia Art Foundation (EUA), Matt Mullican para um privado que está a construir na Bélgica um museu com trabalhos do artista, Yonamine para a colecção Sánchez-Ubiria (Espanha), José Loureiro para um dos “co-owners” da feira Art Dusseldorf  e, finalmente, André Cepeda e Erwin Wurm para um coleccionador privado português. “Correu muito bem. Tive lucro, o que é óptimo.”

A Galeria Filomena Soares, que chegou à feira com um stand de 160 metros quadrados, o maior de sempre, diz que o balanço é positivo, mas que estava à espera de mais. “De uma outra retoma: mais público especializado, mais coleccionadores e mais investimento. Ficou muito aquém do ano passado e muito aquém do esperado.”

O galerista Manuel Santos prefere não contabilizar o número de vendas, mas avança que vendeu obras de Helena Almeida, João Penalva, Rodrigo Oliveira e Dan Graham, entre outros, para EUA, Suíça e Espanha. “Sem dúvida que foi maioritariamente para o estrangeiro. A nível da Arco, o nosso mercado de Portugal é quase zero.” A diferença em relação ao optimismo dos seus colegas é que as expectativas de Manuel Santos, explica o galerista, são especialmente elevadas. “A minha facturação na Arco é sempre muito alta. Sei que a nível geral não foi muito bom para ninguém, pode ter sido razoável ou bom.”

O galerista Mário Sequeira, de Braga, também usa o adjectivo “razoável” para descrever o desempenho na feira este ano. “Tivemos um bocado menos um bocado do que no ano passado, mas não correu mal. Temos muito público em Espanha e há também os portugueses que continuam a aproveitar a feira para ir a Madrid.” Destaca as vendas de Julian Opie, Isaque Pinheiro e Yoan Capote, tanto para coleccionadores portugueses como estrangeiros. A rir-se, comenta que este ano até chegaram à Rússia.

O PÚBLICO não conseguiu ouvir as galeristas Vera Cortês e Andréa Baginski Champalimaud por se encontrarem fora do país.

A Arco regressa a Lisboa pela segunda vez a 18 de Maio, para ficar quatro dias na Cordoaria Nacional, onde vai estrear a secção Opening para as galerias mais novas.

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