Violência doméstica é um dos grandes factores que levam as mulheres à situação de sem-abrigo

Estudo revela que mulheres sem-abrigo em Lisboa são sobretudo jovens e com baixa escolaridade.

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Quando caem na situação de sem-abrigo, as mulheres escolhem locais sem grande visibilidade para se esconder enric vives-rubio

A violência doméstica é o "grande motor" que atira as mulheres para a situação de sem-abrigo, destino a que tentam fugir, mas em que acabam por cair após esgotadas todas as alternativas, refere a investigadora Ana Ferreira Martins em declarações à Lusa.

"A rua é um lugar público que ainda é muito mais fácil para o homem dominar ou gerir do que para uma mulher e é essa situação que a mulher evita até ao último momento enfrentar. Mas esta fuga à rua faz com que vivam situações de muita dureza e muita violência" ao longo da vida, adiantou a também autora do livro As Sem-abrigo de Lisboa, que será lançado no dia 31 de Março.

"Uma mulher prefere estar em casa e ser vítima de um marido, de um companheiro, do que ir viver para a rua", uma situação que ainda "é mais visível e mais marcante" quando existem filhos. Para não caírem na "forma mais extrema de ser sem-abrigo, que é estar na rua", as mulheres procuram outras soluções, como a casa dos amigos ou de familiares, disse Ana Ferreira Martins, que estudou esta realidade na sua tese de mestrado e que decidiu agora publicar em livro.

"Quando se vê uma mulher a mudar com alguma frequência de casa para casa, [sabe-se que] é uma situação que potencialmente vai acabar na rua, porque não tem uma solução a nível da habitação", sublinhou.

Traçando o retrato das mulheres abrangidas no estudo, a investigadora disse que são maioritariamente jovens, solteiras, desempregadas, com baixa escolaridade, sem formação profissional e com empregos precários. "A maior parte são mães, dormem na casa de amigos ou na rua. Algumas partilham de forma instável e com grande alternância as suas vidas com diferentes parceiros", descreveu.

"Príncipe encantado"

Apesar da situação de sem-abrigo ser "devastadora para homens e mulheres", estas são "duplamente penalizadas": "É como um castigo, uma punição porque já passaram por situações na infância de violência doméstica" e depois acabam por encontrar um companheiro que as maltrata. Mas mesmo sofrendo estas situações de violência, continuam a "idealizar o príncipe encantado", contou Ana Ferreira Martins.

Apesar de haver instituições vocacionadas e especializadas para mulheres mães vítimas de violência doméstica que as retiram de situação de rua, estas não resolvem a situação de não terem uma habitação.

"Enquanto têm filhos, vão tendo respostas que minimizam a situação de extrema vulnerabilidade e violência em que se encontram", mas quando os filhos são institucionalizado devido à situação de risco em que se encontram, "a mulher cai na rua".

Quando caem na situação de sem-abrigo, as mulheres escolhem locais sem grande visibilidade para se esconder, como uma habitação degradada, carros abandonados ou um vão de escada. A este propósito, recordou a história de uma mulher que viveu durante meses no aeroporto de Lisboa e trabalhava em hotéis a fazer camas.

"O que percebi é que as mulheres tentam sempre o apoio do homem, mesmo na rua", seguindo o modelo patriarcal, adiantou a investigadora, que decidiu publicar o livro para alertar para estes casos e evitar que mais mulheres caiam nesta situação.

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