Sinn Féin ficou a um passo da vitória na Irlanda do Norte

Os republicanos alcançaram um resultado histórico. As negociações para a formação do governo partilhado vão ser difíceis e o regresso da tutela de Londres não está excluído.

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Michelle O'Neill celebrou junto à sede do Sinn Féin em Belfast, onde há um mural dedicado a Bobby Sands e outros republicanos históricos Reuters

Os resultados das eleições legislativas antecipadas na Irlanda do Norte deixam o país em suspenso, à espera de um entendimento que se prevê difícil entre os líderes republicanos e unionistas para evitar a transferência de poderes para Londres. O Partido Democrático Unionista (DUP) foi a formação mais penalizada nas eleições de quinta-feira, ao ver os republicanos do Sinn Féin alcançarem quase o mesmo número de lugares na Assembleia local.

As primeiras eleições nas Ilhas Britânicas após a vitória do “Brexit” no referendo do ano passado foram as mais participadas em mais de duas décadas, diz a BBC. E acabaram por ser as mais renhidas desde a assinatura dos acordos de paz de 1998. Nunca o Sinn Féin, antigo braço político do Exército Republicano Irlandês (IRA), esteve tão perto de conseguir tornar-se no partido mais representado em Stormont, como é conhecido o edifício onde está sedeado o Parlamento.

Abre-se agora um período de incerteza em relação ao futuro político da Irlanda do Norte. Os principais partidos têm três semanas para chegar a um acordo de coligação para formar governo. Os Acordos de Sexta-Feira Santa – que puseram fim a três décadas de violência entre republicanos e unionistas – determinam um esquema de partilha de poder que torna obrigatório que os governos sejam compostos por partidos das duas áreas políticas.

Mas em poucas ocasiões como agora os dois lados estiveram tão distantes desde o fim do conflito. “As perspectivas de que se forme um governo autónomo, que eram já pequenas, são muito remotas. Não o vejo a acontecer”, diz à Reuters o professor da Universidade de Liverpool, Jon Tonge.

Menos de um ano depois das últimas eleições, o governo liderado pela líder unionista, Arlene Foster, caiu depois da demissão do líder republicano e parceiro de coligação, Martin McGuinness, em rota de colisão com a primeira-ministra. Em causa está a revelação de um esquema de corrupção que envolvia um programa de energias renováveis. O Sinn Féin na Irlanda do Norte (agora dirigido por Michelle O'Neill, depois de McGuiness ter anunciado que não seria candidato por razões de saúde) exige a saída de Foster para negociar com o DUP um novo acordo de partilha de poder.

A líder unionista não parece disposta a ceder perante as exigências dos republicanos – que, porém, partem agora de uma posição mais forte após o bom resultado eleitoral. O Sinn Féin reduziu para apenas um deputado a diferença em relação ao DUP que na configuração anterior da Assembleia tinha mais dez lugares. No hemiciclo de 90 lugares, os dois partidos elegeram 28 e 29 deputados, respectivamente.

“Vamos seguir em frente, com esperança de que o bem comum consiga prevalecer sobre as pequenas divisões de interesses”, disse Arlene Foster, após os resultados finais serem conhecidos, não dando qualquer mostra de pensar na demissão. Decisão diferente teve o líder do Partido Unionista do Ulster, Mike Nesbitt, que revelou a sua saída na sequência dos maus resultados, vendo a sua formação ser ultrapassada pelos sociais-democratas, que se tornaram no terceiro partido mais representado.

Se ao fim de três semanas o impasse se mantiver, o mais provável é que Londres opte por chamar a si os poderes de governação directa. Não se trata de um cenário inédito na Irlanda do Norte, tendo acontecido em curtos períodos entre 2000 e 2002 e durante cinco anos até 2007, por ausência de acordo entre os principais partidos.

No entanto, no actual momento este é um cenário que todos concordam ser especialmente prejudicial ao território. O sentimento anti-“Brexit” é elevado na Irlanda do Norte, onde a permanência na União Europeia recebeu 56% dos votos no referendo de Junho. Os republicanos estão a tentar negociar um estatuto especial para o território para ser tido em conta nas conversações entre Londres e Bruxelas. Sem um governo com plenos poderes em Belfast, tudo será mais difícil.

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