Substituição das janelas da câmara da Lousã chega à Justiça

Parecer da Direcção Regional de Cultura do Centro, emitido depois da intervenção, ditou a “reposição” das janelas. Interpretação do município desse mesmo parecer vai no sentido contrário.

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Com a substituição da madeira por PVC, o quadriculado que se observava desapareceu Carla Carvalho Tomás

Não é a primeira acção de contestação à substituição das janelas do edifício da Câmara Municipal da Lousã (CML), mas desta vez a questão chegou à Justiça. O cidadão Rui Carreira Abreu anunciou que apresentou nesta sexta-feira uma denúncia junto do Ministério Público com a intenção de que seja adoptada uma solução que não descaracterize o edifício.

O residente na vila da Lousã há 31 anos, Rui Carreira Abreu explicou aos jornalistas que na qualidade de munícipe entendeu que devia avançar com esta acção para que as janelas dos paços do concelho, construídos em 1934, sejam “minimamente semelhantes”.

As obras na sede do município foram contratualizadas em Setembro de 2016, mas só em Janeiro deste ano, no dia 4, foi pedido um parecer à Direcção Regional de Cultura do Centro (DRCC). O documento deveria ter sido pedido antes do arranque das obras, uma vez que o edifício se encontra dentro da zona de protecção do Pelourinho da Lousã, classificado como monumento nacional em 1910.

No pedido da autarquia consta a “substituição das caixilharias existentes em madeiro com vidro simples constituída em quadrículas de escala reduzida por caixilharias em PVC com vidro duplo”, quando a intervenção já se tinha dado. As alterações nas janelas são visíveis e o quadriculado que se observava desapareceu.

Assinado a 24 de Janeiro, o parecer da DRCC é favorável à intervenção na câmara, mas a decisão é condicionada à “reposição da caixilharia mais ajustada à imagem do imóvel”, uma vez que a sua substituição constitui uma “substancial alteração da imagem” do edifício neobarroco. A DRCC conclui que a intervenção não é a “mais adequada”.

Contactado pelo PÚBLICO, o presidente da câmara da Lousã, Luís Antunes, tem uma interpretação diferente de quem contesta a alteração. O autarca defende que o parecer é favorável e que, pelo facto de estar referido no documento que a intervenção não é a “mais adequada”, “não quer dizer que seja desadequada”. “Continuamos a entender, com base em pareceres internos e externo que a solução é adequada”, sublinha.

O jurista Mário Frota, que apoiou Rui Carreira na elaboração da denúncia, refere-se à ausência de definição de prazo temporal para que haja a substituição das janelas como um “elemento preocupante” e sublinha que o parecer da DRCC “é vinculativo” e “devia ter sido prévio”. “A câmara não cumpriu a lei”, declara.

Sobre a ausência do pedido do parecer antes de começar a intervenção, o autarca fala num “lapso em termos do timing do pedido”, mas entende que “o que importa é que há um pedido de parecer e que há um parecer emitido”. Quando questionado se equaciona a substituição das novas janelas, Luís Antunes não respondeu directamente e afirmou que o foco está no “términus das obras”.

Para além da denúncia ao Ministério Público, Rui Carreira Abreu avançou ainda com iniciativas paralelas: exposições ao ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, ao ministro-adjunto, Eduardo Cabrita, que tutela as autarquias locais, e ao Provedor de Justiça, para que “exerça a sua magistratura de influência”, avança Mário Frota.

Com as exposições, a intenção é entrar em contacto com autoridades que podem “exercer influência para que a lei se cumpra”. Para o jurista, deve-se impedir que esta situação de “provisoriedade se transforme em definitivo”. “É preciso que se estabeleça um prazo e que, dentro do prazo, se reponha, sendo que alguém tem que fiscalizar o cumprimento deste desiderato”, afirma.

Em Fevereiro, um grupo de 100 cidadãos já tinha assinado um manifesto pela legalidade das obras na câmara municipal. Rui Carreira Abreu fazia também parte dessa lista, cujo primeiro subscritor é o escritor e consultor do Presidente da República, Pedro Mexia. O documento foi então endereçado a várias entidades, entre as quais o ministério da Cultura, a Direcção Geral de Património Cultural e das Autarquias Locais e a CML, exigindo a “imediata reposição das janelas dos Paços do Concelho, de acordo com o modelo original”.     

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