Suécia reintroduz serviço militar obrigatório

Instabilidade geopolítica na Europa continua a produzir efeitos na Escandinávia. Passados oito anos, a Suécia recupera o recrutamento obrigatório. Estocolmo está preocupada, sobretudo, com a ambição da Rússia.

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Militares suecos junto às muralhas medievais da cidade de Visby, na Gotlândia EPA/SOREN ANDERSSON

A instabilidade na Europa, em particular as movimentações da Rússia no Báltico, levou o Governo sueco a reintroduzir o serviço militar obrigatório. A partir de 1 de Janeiro de 2018, quatro mil homens e mulheres serão chamados, um contingente selecionado entre 13 mil pessoas nascidas a partir de 1999, que serão avaliadas pelas autoridades militares, explicou à televisão britânica BBC uma porta-voz do Ministério da Defesa.

Homens e mulheres, voluntários e não-voluntários, serão tratados da mesma forma e, depois de selecionados, servirão por períodos de nove a 12 meses. O Governo espera que muitos destes jovens se sintam, depois, encorajados a entrar para a carreira militar ou para as reservas.

Esta reintrodução, que vinha sendo debatida há largos meses, é mais uma das medidas tomadas pelo executivo de Estocolmo para reagir ao clima de insegurança e incerteza instalado. Em Setembro, a Suécia tinha já enviado uma guarnição militar para a Gotlândia, a sua maior ilha, um território que a separa de três repúblicas do Báltico que pertenceram à União Soviética – a Letónia, a Estónia e a Lituânia. Foi a primeira vez em dez anos que uma formação desta natureza foi enviada para aquele território, segundo a agência de notícias Associated Press.

Marinette Nyh Radebo, a porta-voz da Defesa, justifica o regresso do recrutamento com “as mudanças na segurança na vizinhança”. E, para ser mais concreta, enumera: “A anexação russa ilegal da Crimeia [em 2014], o conflito na Ucrânia e a crescente actividade militar nas redondezas são algumas das razões.”

A incapacidade das forças armadas suecas para atrair voluntários também pesou na hora de optar pelo serviço obrigatório.

“Se queremos unidades militares bem treinadas, o sistema de voluntariado precisa de ser complementado pelo serviço obrigatório”, dissera já o ministro da Defesa Peter Hultqvits à SVT, a televisão pública sueca.

À BBC a porta-voz garantiu ainda que 70% do Parlamento apoia este reforço dos militares e da cooperação com os vizinhos, sendo o mais forte dos seus aliados a Finlândia, país que, como a Suécia, não faz parte da NATO (Estocolmo colabora com a Aliança desde 1994 ao abrigo de um programa de paz).

Recentemente, Moscovo pronunciou-se contra a adesão destes dois países nórdicos à Organização do Tratado do Atlântico Norte, sublinha a agência francesa AFP, recordando que, em 2016, a Finlândia acusou o Kremlin de violar o seu espaço aéreo quando dois caças russos sobrevoaram a cidade costeira de Porvoo, um incidente que deixou a vizinha Suécia em alerta.

O sistema de recrutamento de Estocolmo segue de perto o da Noruega que, à semelhança da Dinamarca, é membro da NATO.

De acordo com um relatório de 2015, a Suécia, que não tem um conflito armado no seu território há 200 anos e que abandonou o serviço militar obrigatório em 2010, tem 52 mil militares profissionais.

Governos e analistas europeus receiam que a Rússia de Vladimir Putin venha a tentar controlar mais ex-Estados soviéticos do Báltico.

Serviço obrigatório na Europa

Escreve a BBC que a maioria dos países da União Europeia não tem serviço militar obrigatório. A França, por exemplo, abandonou-o em 2001, o Reino Unido em 1963, e na Alemanha está suspenso desde 2011, embora ainda venha referido na Constituição e Berlim esteja agora a debater a possibilidade de regressar a uma qualquer forma de “serviço nacional”.

Na Dinamarca e na Noruega há um recrutamento limitado, sendo a esmagadora maioria das suas forças militares composta por profissionais. Na Estónia e na Lituânia, pequenos Estados bálticos que têm sentido de forma mais aguda a pressão da Rússia, o sistema é semelhante ao destes dois países nórdicos.

A Finlândia exige a todos os homens que sirvam até 347 dias nas forças armadas a partir dos 18 anos (as mulheres podem fazê-lo mas em regime de voluntariado) e a Grécia baixa esse período para um máximo de nove meses (também só para homens e a partir dos 19).

Na Rússia o serviço obrigatório é de um ano e aplica-se aos homens entre os 18 e os 27 anos. A Ucrânia recuperou o recrutamento em 2014 em resposta ao crescimento das tensões com Moscovo.

A Turquia mantém o segundo maior Exército da NATO, logo a seguir ao dos Estados Unidos, e um serviço obrigatório entre os seis e os 15 meses para todos os homens a partir dos 20 anos.

Em Portugal o serviço militar obrigatório terminou formalmente em Novembro de 2004, respeitando a Lei do Serviço Militar proposta pelo Governo liderado pelo socialista António Guterres e com Veiga Simão como ministro da Defesa. Aprovado a 1 de Julho de 1999, o diploma previa um período de transição de quatro anos para que os ramos das forças armadas mais dependentes do recrutamento obrigatório, a Marinha e o Exército, se adaptassem ao novo sistema. A Lei partia do princípio de que, em tempo de paz, o serviço militar se deve basear no voluntariado.

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