Proposto código de boas práticas para afastar a publicidade das escolas

A oferta de materiais pedagógicas com o logotipo de marcas é uma das formas de as empresas entrarem nas escolas. Nos últimos cinco anos, o ministério só recebeu quatro queixas.

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O Código da Publicidade recomenda às marcas que se abstenham de incentivar a aquisição de objectos por menores Rui Gaudencio

As escolas precisam de um guião para saber que propostas podem ou não aceitar das empresas que lhes batem à porta? A professora da Universidade Europeia, Isabel Farinha, entende que sim e nesta quinta-feira propôs a ideia a representantes do Ministério da Educação (ME), da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), da Associação de Defesa do Consumidor (Deco) e da Direcção-Geral do Consumidor, entre outros, num debate que teve no centro a adopção de um código de boas práticas.

Em resposta ao PÚBLICO, o ME disse entender este contributo como “positivo”, embora ressalvando que por parte do ministério “toda a actuação é enquadrada no estrito cumprimento do quadro legal vigente [Código da Publicidade]”, o que passa também pela “validação prévia de conteúdos ou materiais a utilizar em contexto escolar”.

Falando na conferência realizada nesta quinta-feira, o subdirector geral de Educação, Pedro Cunha, frisou que este processo permite “abrir mais portas às empresas”, já que as escolas sabem por esta via que os conteúdos propostos foram validados pelo ME previamente. “Temos de ser extremamente cuidadosos em relação a tudo o que se passa no interior das escolas”, disse.

Isabel Farinha, que tem dedicado a sua investigação ao marketing nas escolas, frisa que os “media tradicionais são cada vez menos vistos como um meio de se chegar a crianças e jovens”. “As escolas são um canal alternativo” para se chegar a este universo, sendo que este é “muito apetecível para as marcas”, disse ao PÚBLICO.

Operações comerciais

Para esta investigadora, tudo começou há uns anos com uma tese de doutoramento e os inquéritos que realizou para o efeito a directores, em que mais de 40% davam conta de um aumento de operações de marketing nas escolas, sobretudo através de materiais educativos ou de actividades patrocinadas por marcas.

Dos cerca de 100 directores que lhe responderam, 80,4% disseram também já terem recusado a realização destas operações. Na base da maioria destas recusas estava o facto de as propostas apresentadas terem objectivos puramente comerciais.

Esta é uma das disposições que Isabel Farinha aliás propõe para integrar um futuro Código de Boas Prática. “Não se trata de fazer aprovar mais uma lei, mas sim de ter um instrumento de auto-regulação de modo a que os directores estejam mais preparados para distinguir se as acções propostas estão na esfera da responsabilidade social das empresas ou têm sobretudo intuitos comerciais”, explica.

“É um facto que existem campanhas comerciais nas escolas”, disse Gisela Serafim, da Direcção-Geral do Consumidor, que considerou o tema de grande importância. “Estamos a falar dos nossos filhos. É muito importante saber a que mensagens estão expostos”, disse, defendendo que existe espaço para a acção do Governo e para mecanismos de auto-regulação, porque “são complementares”.

Poucas queixas

O ME refere que a Direcção-Geral de Educação recebeu, nos últimos cinco anos, quatro queixas relativas a operações comerciais nas escolas. Da Associação de Defesa de Consumidores vem a informação de que actualmente não têm existido queixas. “Houve há alguns anos atrás, apresentadas por pais descontentes com as campanhas que estavam a ser desenvolvidas por operadoras de telecomunicações”, refere a assessora de imprensa da associação.

Na conferência desta quinta-feira, a dirigente da Deco, Fernanda Santos, considerou, a propósito desta ausência de queixas, que “as empresas estão a respeitar as escolas”, mas que é sempre necessário proteger as crianças porque estas são “consumidores vulneráveis”.

Também a Confap, pela voz de Hermínio Correa, defendeu que apesar da legislação existente, as relações como aquelas que existem entre escolas e empresas “têm de ser regulamentadas”: “Este código deve ser assumido como um compromisso real, baseado na transparência e confiança entre parceiros."

O Código da Publicidade determina que as marcas de devem abster de incitar directamente os menores a adquirir um determinado bem ou serviço ou de fazer com que este incitem os pais a comprá-los.

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