PS e PSD estiveram do mesmo lado em mais de 14% das votações parlamentares

PSD recusa ser muleta do Governo, mas feitas as contas já o ajudou algumas vezes no Parlamento, a maior parte das quais em temas que não são decisivos para as política do executivo.

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Votações do Orçamento Rectificativo para 2016 evr enric vives-rubio
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Votações do Orçamento Rectificativo para 2016 Daniel Rocha
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Votações do Orçamento Rectificativo para 2016 evr enric vives-rubio

Na noite eleitoral de 2015, que deu a vitória à aliança do PSD e do CDS (Portugal à Frente), António Costa não assumiu a derrota. Nos 29 minutos de um discurso premonitório que dirigiu aos militantes do PS presentes do Hotel Altis, o homem que viria a ser primeiro-ministro fez três avisos: não deixaria a liderança do partido, não contribuiria para uma coligação negativa e defenderia as moções de censura construtivas.

À luz do que aconteceu a seguir, a estratégia do António Costa ficou clara: chamar os partidos à sua esquerda para lhes propor uma alternativa de Governo. Um ano e uns meses depois, a geometria dos votos parlamentares tem-se mantido estável no essencial com a esquerda a apoiar o executivo nos momentos importantes – o caso da TSU é uma das excepções (ver texto ao lado) –, mas também houve situações em que foi o PSD a “ajudar” o Governo.

Em 1292 votações contabilizadas entre o início da legislatura, a 26 de Novembro de 2015, e o dia 13 de Janeiro de 2017 (dados mais actuais obtidos pelo PÚBLICO), o PS e o PSD estiveram do mesmo lado, em pelo menos 185 ocasiões, a maior parte das quais sem grande relevância.

O primeiro dos casos mais importantes aconteceu nas vésperas de Natal de 2015, quando os sociais-democratas salvaram (com a sua abstenção) o Governo de ver chumbado um orçamento rectificativo que a esquerda rejeitou e que alargava o limite da dívida para cobrir a intervenção estatal no Banif. E a última dessas ajudas aconteceu na sexta-feira, dia 3, quando PSD, CDS e PS se juntaram para rejeitar a nacionalização do Novo Banco. Mas será só em matéria de banca que o Bloco Central subsiste?

Apoio em questões fundamentais

Não se pode dizer que seja verdade. Foi com os votos do PSD e do CDS que o Governo conseguiu impedir, por exemplo, o aumento do salário mínimo para 600 euros por proposta do PCP. Toda a esquerda estava junta nessa intenção, com o apoio do PAN, mas foi rejeitada pelo Bloco Central, em Dezembro. A primeira TSU de Costa, que foi alvo de uma apreciação parlamentar, em Abril de 2016, também só se salvou porque o PSD deu a mão ao PS, abstendo-se.

Foi também o Bloco Central que impediu a reposição das freguesias desejada pelos comunistas, o congelamento das propinas (BE) ou a proibição do seu aumento (PCP) no ensino superior e a eliminação das portagens na A23, na A24, na A4, na Via do Infante, na A22 e na A25 a pedido do PE e do PCP.

O mesmo aconteceu com a manutenção da Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) sobre pensões elevadas que uma aliança entre PSD, CDS e PS viabilizou contra a esquerda. E com a tentativa da esquerda de reverter a entrega dos hospitais de Anadia, Serpa e Fafe às Misericórdias.

A proibição de pagamentos a entidades sediadas em offshores não cooperantes ou a suspensão dos contratos para prospeção, pesquisa, desenvolvimento e produção de petróleo e gás no Algarve e na Costa Alentejana também foram propostas travadas pelo Bloco Central. Assim como a passagem da gestão do património do Vale do Côa para o Ministério da Cultura e extinção da Fundação Côa Parque.

Será que é a pensar nestes casos que Rui Rio diz, como fez na sexta-feira, que a melhor solução governativa para o país seria “um entendimento ao centro”? Numa conferência sobre “Ética na Política”, o ex-autarca acrescentou: “Em termos ideológicos, e acima de tudo em termos do interesse do país, a minha opinião é que o entendimento não devia ser ao extremo, mas sim ao centro”.

Esta opinião esbarra, como se sabe, no que a entourage de Pedro Passos Coelho tem vindo a defender: “Nós não seremos uma muleta do Governo, dando ao Governo o apoio que não consegue entre os seus parceiros”, defendeu, há duas semanas, o líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro. Um discurso que, aliás, não tem nada de novo. Em 2015, ainda antes de Costa ter sido empossado, Marco António Costa, vice-presidente do partido, dizia à Rádio Renascença: “O PSD não vai ser muleta de um Governo ilegítimo do PS”.

Consenso em política externa

Querendo ou não ser muleta do Governo, PSD e PS estiveram no mesmo lado em mais de 14% das votações no Parlamento. E se casos como o da CES, o do salário mínimo nacional ou o da intervenção no Banif podiam ter sido decisivos para a política defendida pelo Governo, outros há que são mera mercearia, como se diz na gíria partidária.

Ao longo dos últimos meses, PS, PSD e CDS estiveram de acordo em votações relacionadas com a deportação de refugiados para a Turquia, o fim da missão das forças armadas portuguesas no Afeganistão, a morte de Shimon Peres, os bombardeamentos em Alepo e um sem números de acordos bilaterais com os mais diversos países, da Costa do Marfim ao Sultanato de Omã, com vista a evitar a dupla tributação.

Na verdade, pode dizer-se que em matéria de política externa, o que inclui questões como a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento ou o Acordo Integral de Economia e Comércio com o Canadá (mais conhecido por CETA), o Bloco Central continua em clima de grande concordância.

No último plenário, a vinculação de docentes, a redução da utilização de embalagens de plástico e o dia do Sargento foram mais três assuntos que promoveram o consenso ao nível do (antigo) arco da governação. Nos próximos tempos, espera-se outro: a descentralização. Mas o PSD já avisou os partidos da esquerda: “Não usem o rolo compressor da maioria”. Palavras de Luís Montenegro.

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