Folhas ao vento: Luís Guerra, a tundra e a avó

No primeiro projecto co-produzido pela Rede 5 Sentidos, o coreógrafo pensa os corpos como se fossem movidos pelo vento. A Tundra estreia-se esta quinta-feira em Viseu e depois segue em viagem.

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Primeiro chamou-se Glaciares. Depois passou a Nascimento de Arete. Finalmente, estabeleceu-se como A Tundra. Após alguns anos dedicado a erigir um universo fantasioso, um país existente apenas na sua cabeça e dentro das suas coreografias a que chamou Laocoi – com direito a mapas, língua própria, danças tradicionais e um sem-fim de elementos destinados a dar robustez e a declarar a independência desse espaço imaginado –, Luís Guerra resolveu agora virar-se para um território real, à procura de um lugar de contemplação e de paz, quase sem intervenção humana.

A Tundra, coreografia que se estreia esta quinta-feira no Teatro Viriato, em Viseu, vai buscar à tundra (espaço geográfico de paisagem homogénea caracterizado por baixas temperaturas, ventos fortes e escassa ou nenhuma vegetação) os movimentos de corpos que parecem abanados por ventosidades súbitas. Comparando com a sua peça anterior, diz o coreógrafo ao PÚBLICO que enquanto “A Trovoada era feita de movimentos mais viris e musculosos, agora queria pesquisar movimentos mais fluidos, como se os corpos quase não tivessem músculos, como se fossem folhas ao vento”.

A peça nasceu de um desafio da Rede 5 Sentidos – um colectivo de 11 teatros nacionais que se propõe encomendar e colocar em circulação pelo país peças de dança e de teatro de jovens criadores nacionais – a três coreógrafos portugueses. Depois da recepção dos projectos a concurso, Luís Guerra foi o eleito com uma proposta que era já bastante detalhada em relação ao que pretendia fazer. “Até me disseram que parecia um script de cinema”, comenta, “porque estava tudo explicado para eles conseguirem visualizar aquilo que eu já estava a imaginar.”

Aquilo que estava a imaginar era uma peça em que o lado racional dos três bailarinos (além de Guerra, António Cabrita e Luís Marrafa), de um actor (Gonçalo Ferreira de Almeida) e da sua avó (Alice Lopes) seria convidado a desligar-se o mais possível, tentando provocar um semelhante efeito de imersão no espectador, um estado de contemplação comparável àquele que o coreógrafo experimentou ao viajar de comboio pela Noruega, quando a marcha abrandou e uma voz anunciou aos passageiros a chegada ao Ártico. A beleza daquela paisagem agreste e do apagamento das marcas humanas serviria depois de modelo à sua criação coreográfica. Após a estreia em Viseu, A Tundra viaja por outras oito salas nacionais: Guarda (Teatro Municipal, 4 de Fevereiro), Lisboa (Maria Matos, 7), Guimarães (Centro Cultural Vila Flor, 9), Torres Novas (Teatro Virgínia, 11), Coimbra (TAGV, 20 de Abril), Ovar (Centro de Artes, 22), Ponta Delgada (Teatro Micaelense, 29) e Porto (Rivoli, 10 de Maio).

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