Faria de Oliveira nega ter concedido "créditos de favor"

Nem os anos de crise tiraram à Caixa o papel de "pilar do sistema" financeiro português. Foi o que Faria de Oliveira foi dizer ao Parlamento.

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Faria de Oliveira está a ser ouvido na CPI à CGD LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Na audição esta terça-feira em sede de comissão de inquérito no Parlamento à Caixa Geral de Depósitos, o antigo presidente do banco Fernando Faria de Oliveira recusou que a instituição bancária sob a sua alçada tenha concedido créditos especiais por favores. “Não houve uma situação de concessão de crédito que não tenha seguido todas as normas e procedimentos. Não me lembro de um único caso”, referiu em resposta ao deputado do PS João Paulo Correia. Quando questionado pelo deputado se havia "créditos de favor", respondeu: "Enquanto presidente da Caixa não sei o que é um crédito de favor."

Ainda ao mesmo deputado referiu que os níveis de concessão de crédito andavam muito próximos dos dos concorrentes.

Respondendo a questões colocadas pelos deputados sobre decisões quanto a créditos avultados concedidos, Faria de Oliveira negou ter sido pressionado pela tutela para conceder esses créditos. “Sensibilização, sim. Pressão, não”, disse Faria de Oliveira, respondendo ao deputado do CDS João Almeida. O deputado insistiu sobre a relação com a tutela e o ex-gestor respondeu: “Uma coisa é sensibilizar para a participação em projectos de interesse nacional. Outra é uma pressão. Isso nunca tive.”

Faria de Oliveira, que esteve durante vários anos à frente da CGD – entrou em 2008 e saiu do banco público já com a troika em Portugal –, considerou na audição desta terça-feira que nem os anos de crise tiraram à Caixa Geral de Depósitos o seu papel de "pilar do sistema" financeiro português. Para o ex-gestor, a crise económica foi o principal factor para a dificuldade da banca. Apesar disso, defendeu, a CGD manteve-se como um “pilar do sistema nacional”.

Aos deputados Faria de Oliveira começou por dizer que a banca é demasiado importante para estar constantemente a ser questionada. "É muito importante que a banca não esteja sempre a ser posta em causa e muitas vezes por questões com escasso fundamento”, defendeu na sua intervenção inicial. Acrescentou que a comissão de inquérito à CGD tem responsabilidades: “Espero que o trabalho do Parlamento contribua para uma Caixa mais forte, que se aproveitem os trabalhos do Parlamento para eliminar quais dúvidas, não só sobre a capacidade da CGD para continuar a cumprir as suas missões, mas também sobre a qualidade da gestão da instituição."

O ex-gestor da CGD lamentou “casos do passado recente que nunca deveriam ter ocorrido”, sobretudo as constantes questões sobre a credibilidade dos bancos que podem criar uma percepção negativa. “Acaba por pagar o justo pelo pecador”, tendo em conta que muitas vezes as dúvidas são colocadas de forma “distorcida” e “adulteradas”.

A intervenção inicial do ex-líder da CGD foi uma autêntica aula de gestão bancária, defendendo alguns princípios, nomeadamente ao nível da concessão de crédito. “Uma decisão de crédito comporta risco – só não se corre risco, se não se der crédito”, disse. Na avaliação que faz, Faria de Oliveira encontra um culpado principal: “ A culpa foi da estagnação económica (...) nada tem um impacto tão forte como a forte crise económica, [que provocou] uma taxa de incumprimento hoje oito vezes superiores às de 2008”. “A banca reflecte sempre o estado da economia.”

Faria de Oliveira referiu por várias vezes que dirigiu a CGD numa altura de crise. “Creio que fizemos o melhor possível, o mandato 2008-2010 coincidiu com a crise financeira global e com o arranque da dívida soberana cujo efeitos ainda sofremos. Todo o contexto em que se exercia a actividade bancária sofreu uma alteração de paradigma”, observou.

Para o ex-presidente da CGD, a política do banco não podia não ser aquela do accionista Estado, garantindo, contudo, que manteve os níveis de solvabilidade do banco público, apesar de toda a conjuntura negativa.

Nas respostas aos deputados, Faria de Oliveira advogou como fundamental a permanência da CGD  no país vizinho e justificou as imparidades do banco em Espanha. "Oitenta por cento resultam de operações de banca de investimento. Correram mal, porque houve uma crise monumental em Espanha", disse aos deputados. "Nada teve que ver com a implementação da Caixa Geral em Espanha", ou seja, não esteve relacionado com a sua actividade de banco em geral, mas sim com a parte de banca de investimento.

O deputado do CDS João Almeida questionou ainda Faria de Oliveira sobre o crédito específico de Vale de Lobo. O gestor recusou responder ao caso concreto de Vale de Lobo, mas falou em termos gerais de um caso hipotético de um empreendimento "estrela" na área do turismo que tinha sucesso. "Surge uma crise significativa." "Foi isto que levou a que situações destas tenham acontecido. Aquilo que gera verdadeiramente as imparidades é a evolução da economia e o impacto que isso tem no funcionamento de um sector de actividade", declarou.

"Eu depois tive a obrigação de tentar encontrar soluções que permitissem minorar [as imparidades que estavam a ocorrer nesse investimento]", justificou. Disse que tentou uma reestruturação imediata da gestão do empreendimento, parar o investimento e procurar compradores. "Depois, ser extremamente rigoroso nos investimentos para manter o empreendimento a funcionar [e gerar valor]." "Ainda pode gerar muito valor", afirmou Faria de Oliveira, que espera que a administração da Caixa continue a tentar solucionar o caso, uma vez que os mercados estão de novo a ajudar nestas situações.

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