Um restauro que exige “coragem”

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O túmulo de D. Fernando Fábio Augusto

Com quase 240 mil visitantes em 2016, o Museu Arqueológico do Carmo tem uma colecção altamente eclética que nos faz lembrar os museus de outros tempos. Nela a vivência do próprio edifício religioso mistura-se com a arqueologia da Pré-História ou da época romana, com painéis de azulejos do século XVIII e arte tumulária do século XIV e seguintes.   

Se não valesse desde logo a pena conhecê-lo por toda a sua riqueza histórica e patrimonial, o Convento do Carmo mereceria uma visita pelo simples facto de a sua colecção incluir o túmulo de D. Fernando I (1345-1383), o último rei da primeira dinastia portuguesa. Este monumento funerário, estudado pela historiadora Carla Verela Fernandes, autora do livro A Imagem de um Rei, parece estar sempre a interpelar quem o olha. Profusamente decorado, mantém um certo mistério, mesmo que, passados 600 anos e muitos usos indevidos, o seu estado de conservação deixe muito a desejar.

O túmulo chegou ao Carmo vindo do Convento de São Francisco, em Santarém, durante anos entregue aos militares.

Tem uma série de bustos de figuras religiosas e laicas, seres híbridos, fantásticos, de pescoços entrelaçados, anjos segurando escudos, leões alados, criaturas antropomórficas, cenas da vida e dos milagres de São Francisco de Assis e até um alquimista (ou médico?) a trabalhar.

Célia Nunes Pereira admite que o museu gostaria de o ver restaurado, mas que não tem sido fácil encontrar quem o faça: “Está em muito mau estado e é uma intervenção de altíssima responsabilidade. É preciso muita coragem para o restaurar”, diz, explicando que é bem provável que parte dos danos causados à pedra tenham sido feitos quando foi usado para bebedouro de cavalos (os militares faziam ainda do tampo desta arca tumular suporte para as selas): “A água que se dá aos cavalos leva sal e o sal corrói a pedra. É uma pena, mas não é um uso exclusivo deste túmulo. Muitos outros foram usados para o mesmo fim ou, no caso do Sarcófago das Musas [túmulo romano do século III-IV, também no museu], para fazer azeite e destilar aguardente.”

Neste momento, a direcção do museu tem previsto uma série de pequenas intervenções de restauro e há uma equipa da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto a analisar a estabilidade dos arcos da igreja, algo fundamental num edifício que esteve fechado entre 1996 e 2000 por causa das obras do metropolitano. “Ainda não perdemos a esperança de ver o túmulo de D. Fernando como merece.”

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