Especialistas em Educação dizem que medidas do 1.º ano do Governo são insuficientes

Para enfrentar os "problemas herdados" de anterior Governo, são necessárias mais políticas direccionadas para resolver questões de fundo, dizem especialistas.

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Políticas para a educação são positivas mas insuficientes dizem especialistas em educação dro Daniel Rocha

O Observatório de Políticas de Educação da Universidade de Coimbra avalia de forma positiva as medidas tomadas pelo Governo no primeiro ano de mandato, ainda que as políticas estruturais "fiquem aquém das necessidades" e não resolvam "os problemas herdados".

A análise consta do relatório anual do Observatório de Políticas de Educação e Formação (OP.EDU), coordenado pela ex-secretária de Estado do Governo socialista de António Guterres, Ana Benavente, que o PÚBLICO avançou em Dezembro e é apresentado, esta quinta-feira, nas instalações do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, em Lisboa.

"Sendo o primeiro ano do actual Governo - ano de transição - o OP.EDU considera positivas as medidas até agora adoptadas, assinalando o momento de abertura sociopolítica, apesar dos constrangimentos nacionais e europeus. No entanto, as políticas estruturais ficam aquém das necessidades vividas nas instituições, com muitos "efeitos de anúncio" e fracas intervenções para a resolução dos problemas herdados", conclui-se no estudo.

O relatório, que se centra no primeiro ano do actual Governo, referido como ano de transição, e que o caracteriza, de forma genérica, como positivo, não deixa de apontar semelhanças "muito preocupantes" entre os programas de governação do executivo PSD-CDS-PP que liderou Portugal nos anos de intervenção da troika e o do Governo de António Costa.

"Entrámos, com o actual Governo, numa nova fase de políticas educativas em que as orientações e as medidas anunciadas são positivas. No entanto, não emerge, neste ano de transição, um modelo de escola renovada, quer no programa de Governo, quer nos acordos parlamentares celebrados", afirma-se no estudo, ainda que se reconheçam "diferenças notórias" nas propostas dos dois Governos "numa perspectiva político-ideológica da educação".

Alerta-se ainda para o "carácter avulso" da legislação produzida, que não permitem ver uma orientação para a actual legislatura: "mês após mês, vão surgindo iniciativas dos órgãos de soberania, do Parlamento ao Ministério da Educação, sem que se clarifiquem orientações para além da urgência e de algumas iniciativas político-mediáticas sem continuidade".

O estudo é muito crítico da governação do executivo PSD-CDS-PP, apontando medidas tomadas, "de carácter gravoso", que traduzem, segundo os autores, uma perspectiva da educação enquanto um custo e não um investimento.

Entre os exemplos apontados constam o aumento de alunos por turma, aumento do horário de trabalho de professores e funcionários, criação de mega-agrupamentos escolares, menorização de algumas componentes do currículo, como a educação artística, e a introdução de exames nacionais em todos os ciclos de ensino, incluindo o 1.º ciclo, "com o retorno à selecção precoce dos alunos, numa lógica de selecção social e de degradação do estatuto e da importância da formação profissional".

"Tudo isto aconteceu numa sociedade em que aumentaram as desigualdades e a pobreza, tocando os grupos mais vulneráveis, nomeadamente as crianças e os jovens, com impacto na vida escolar e educativa e com riscos acrescidos de exclusão social", refere ainda o documento.

Os autores afirmam que o país "herdou em 2015" um modelo de escola ao qual se opõem, marcado "pelas consequências da política neoliberal, uma escola expositiva e selectiva, a da educação instrumental, com menosprezo pelas dimensões humanas, cívicas e democráticas da Educação".

O OP.EDU pede uma escola que forme "pessoas e não números", com "saberes e competências para agir em todos os domínios da vida individual e social, de modo crítico e responsável", acrescentando ser "urgente ultrapassar uma instituição escolar instrumental, baseada na passividade e na obediência de pessoas que, educadas na competição e no individualismo, são vistas como meros “recursos humanos”".

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