Mário Soares: Ferro Rodrigues evoca “militante número um” da democracia portuguesa

"Tinha uma sintonia impressionante com o povo português", destacou o presidente da Assembleia da República.

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Ferro Rodrigues salientou espírito solidário do “militante número um” do Partido Socialista Rui Gaudêncio

O presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, definiu esta terça-feira Mário Soares como "o militante número um" da democracia portuguesa, um homem entre os "imprescindíveis", que "pôs sempre Portugal em primeiro lugar".

"Mais do que militante número um do PS, foi o militante número um da nossa democracia", afirmou Ferro Rodrigues na sua intervenção na solenidade evocativa da memória de Mário Soares, inserida nas cerimónias fúnebres de Estado, que decorreram nos claustros do Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa.

Ferro Rodrigues descreveu o antigo primeiro-ministro e Presidente da República, falecido no sábado, como alguém que "tinha a visão dos grandes estadistas e a intuição dos grandes políticos" e "pôs sempre Portugal em primeiro lugar".

"Tinha uma sintonia impressionante com o povo português. Os portugueses conheciam-no e ele conhecia bem Portugal e os portugueses", afirmou.

Citando o dramaturgo e poeta alemão Bertolt Brecht, o presidente do Parlamento colocou Soares entre os imprescindíveis: "Há homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, e há os que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis", citou.

"Mário Soares lutou até ao fim", sublinhou.

Ferro Rodrigues manifestou-se solidário com "a dor dos deputados à Assembleia da República pelo desaparecimento de uma referência cimeira" da nossa democracia representativa: "Sei que da direita à esquerda, esta dor é amplamente partilhada".

O presidente do Parlamento manifestou-se grato a Mário Soares e "solidário com a dor do país que perde um líder político que sempre se bateu por causas e princípios", um "país que se exprime fortemente nestes dias, e marginaliza os saudosistas do ódio".

"Mário Soares costumava dizer que não devem ter existido muitos portugueses que num dado momento, entre 1975 e 2005, não tenham votado pelo menos uma vez nele. E também que em certos momentos ou fases não o tivessem combatido. E de facto foi mesmo assim", disse.

Ferro Rodrigues lembrou que Soares "tinha um gosto contagiante pela vida e pelo país" e sublinhou: "Tinha a coragem política dos grandes. Sempre presente, nos momentos bons e nos menos bons".

"Quero também manifestar admiração pelo espírito solidário de Mário Soares, que pude testemunhar de perto quando liderei o PS. Ser militante número um do Partido Socialista não era para ele um simples privilégio, era mais um motivo para ser o primeiro a dar a cara. Preferiu sempre a intervenção e o risco ao sofá e à crítica fácil", declarou.

Lembrando o percurso do antigo Presidente da República, Ferro Rodrigues recordou Mário Soares como "advogado antifascista", "democrata ainda durante a ditadura" e "um homem aberto à Europa e ao Mundo, quando oficialmente o país ainda estava orgulhosamente só".

"Se é costume dizer-se dos grandes políticos que a sua vida se confunde com a do tempo histórico que viveram, no caso de Mário Soares, é mesmo o último quartel do século XX português que se confunde com ele, tendo estado em luta contra a ditadura desde meados do século passado e tendo continuado os seus combates nestes anos do século XXI", afirmou.

Enquanto "deputado e constituinte, honrou a democracia que ajudou nascer ao lado de tantos antifascistas e dos capitães de Abril, que hoje não podem nem devem ser esquecidos" e, enquanto primeiro-ministro, deixou "as bases do Serviço Nacional de Saúde e a adesão à então Comunidade Económica Europeia, assinada pelo seu punho precisamente aqui nos claustros dos Jerónimos", salientou.

"Como Presidente da República, moldou o entendimento que temos do cargo, afirmando Portugal no mundo e abrindo a presidência à sociedade e à cultura. O Portugal livre, democrático e europeu, o Portugal dos oceanos, cosmopolita e solidário, é o país de Mário Soares", defendeu.

Mário Soares morreu no sábado, aos 92 anos, no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa. O Governo português decretou três dias de luto nacional, até quarta-feira.

O corpo do antigo Presidente da República esteve em câmara ardente no Mosteiro dos Jerónimos entre as 13h10 de segunda-feira e as 11h00 desta terça-feira, depois de ter sido saudado por milhares de pessoas à passagem do cortejo fúnebre pelas principais ruas da capital  com escolta a cavalo da GNR.

O  funeral realiza-se esta terça-feira,  pelas 15h30, no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa, após passagem do cortejo fúnebre pelo Palácio de Belém, Assembleia da República, Fundação Mário Soares e sede do PS, no Largo do Rato.

Nascido a 7 de Dezembro de 1924, em Lisboa, Mário Alberto Nobre Lopes Soares, advogado, combateu a ditadura do Estado Novo e foi fundador e primeiro líder do PS.

Após a revolução do 25 de Abril de 1974, regressou do exílio em França e foi ministro dos Negócios Estrangeiros e primeiro-ministro entre 1976 e 1978 e entre 1983 e 1985, tendo pedido a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1977, e assinado o respectivo tratado, em 1985.

Em 1986, ganhou as eleições presidenciais e foi Presidente da República durante dois mandatos, até 1996.

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