Risco de demência é maior para quem vive perto de estradas movimentadas

Um estudo publicado na revista científica The Lancet diz que o risco de demência pode aumentar até 7% para quem vive a menos de 50 metros de uma estrada muito movimentada.

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Não foi detectada nenhuma relação com o risco de doença de Parkinson ou Esclerose Múltipla PAULO PIMENTA

As pessoas que vivem junto de estradas com muito trânsito enfrentam um risco maior de desenvolver demência do que os que vivem mais longe, de acordo com investigadores canadianos do Public Health Ontario (PHO).

Um estudo publicado na revista científica The Lancet conclui que as pessoas que vivem a 50 metros de estradas com muito tráfego têm mais 7% de hipóteses de desenvolver demência do que aqueles que vivem a mais de 300 metros das mesmas estradas.

“Os poluentes atmosféricos podem chegar à corrente sanguínea e causar inflamação, que está ligada às doenças cardiovasculares e, possivelmente, a outras doenças, como a diabetes. Este estudo sugere que os poluentes atmosféricos podem chegar ao cérebro através da corrente sanguínea e levar a problemas neurológicos”, disse à Reuters Ray Copes, um perito em saúde ambiental e ocupacional do PHO, que conduziu um estudo com colegas do Instituto canadiano para as Ciências de Avaliação Clínica.  

A demência é causada por outras doenças cerebrais, sendo a mais comum a doença de Alzheimer, que resulta na perda de células cerebrais e afecta a memória, pensamento, comportamento, capacidade de orientação e capacidade de realizar tarefas quotidianas. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que o número de pessoas com demência em 2015 seja de 47,5 milhões e que o crescimento seja rápido, acompanhando o aumento da esperança média de vida e o envelhecimento da população. A doença incurável é a principal causa de incapacidade e dependência, e está a começar a ultrapassar a doença cardíaca como a principal causa de morte nos países desenvolvidos.

A equipa de Hong Chen, do PHO, analisou mais de 6,5 milhões de residentes em Ontario, com idades entre os 20 e os 85 anos. Os pacientes elegíveis não registavam doenças neurológicas no início do estudo, viviam em Ontário há pelo menos cinco anos e eram nascidos no Canadá. Os investigadores não tiveram em conta outros factores, como o tabagismo, a obesidade, a actividade física ou a educação. Dos 6,5 milhões de residentes, apenas 2,2 milhões foram testados para demência e doença de Parkinson. Os outros 4,4 milhões foram testados para Esclerose Múltipla.

Dentro do grupo de 2,2 milhões, com idades entre os 55 e os 85 anos, os investigadores descobriram 243.611 casos de demência entre 2001 e 2012.

Depois de mapearem a proximidade dos residentes às maiores auto-estradas, usando os códigos postais, verificaram que o risco de desenvolvimento de demência descrescia à medida que se afastavam das estradas mais movimentadas: baixou para 4% se as pessoas vivessem a 50 ou 100 metros e 2% se vivessem entre os 101 e os 200 metros. Se a distância excedesse os 200 metros, o risco esbatia-se. No entanto, se a distância fosse inferior a 50 metros, o risco era de 7%.

Quanto à doença de Parkinson e à Esclerose Múltipla, os estudos sugeriram que não havia aumento do risco consoante a proximidade às estradas mais movimentadas.

Os cientistas afirmaram que os seus resultados podem ser usados para que os responsáveis pelo ordenamento do território tenham em conta as condições de tráfego e a poluição atmosférica à medida que as áreas urbanas se tornam mais densamente povoadas. Hong Chen, o coordenador e um dos autores do estudo, disse ao Guardian que “o aumento da densidade populacional e da urbanização fez com que muita gente começasse a viver perto de vias com muito tráfego e com a exposição ao tráfego aumentam as taxas de demência. Mesmo um efeito modesto de exposição pode significar um encargo pesado para a saúde pública”.

O risco de demência não é a única justificação para esse planeamento. Estatísticas da OMS indicam que três milhões de pessoas morrem todos os anos devido à poluição atmosférica. Em Portugal, mata 6700 pessoas por ano. A poluição aumenta o risco de acidente vascular cerebral, doença cardíaca e doença respiratória. Para o professor da Universidade Global de Londres, Rob Howard, “este estudo apresenta mais uma razão importante para limparmos o ar das nossas cidades”, cita a BBC.

Já o director do Centro para a Demência da Universidade de Nottingham disse à BBC que os estudos eram “interessantes e provocadores”, acrescentando que é “plausível” que haja uma relação entre os fumos dos motores e a patologia. 

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