A passagem do ano

O melhor é partir do princípio que tudo o que se diz é uma hipótese à espera de ser posta em causa. Em 2016 diverti-me a pôr à prova o lema segundo o qual quem não arrisca não petisca.

É mentira. Petisca-se mais e melhor quando se joga pelo seguro. E não é só com restaurantes conhecidos e comprovadamente bons e outros desconhecidos e provavelmente maus. Quem arrisca petisca, é verdade, mas o mais das vezes petisca mal.

E, no entanto, antes de nos sentarmos e desiludirmos, há horas de curiosidade e de emoção aventureira que só o que não é conhecido nos pode dar. A falta de confiança e a incerteza do empreendimento aguçam o apetite. O trabalho da ilusão, de nos iludirmos, faz-nos bem.

E, mesmo quando nos levantamos do chão, derrotados e arrependidos por termos levado aquele escusado caminho, reconforta-nos sabermos que no dia seguinte podemos voltar aos valores seguros do que  conhecemos e gostamos, sabendo que não nos vão deixar mal.

É enorme o prazer de pisar o risco. Não é preciso seguir em frente: basta saber que se poderia seguir, caso quiséssemos. É bom arriscar o piso, experimentar a terra do outro lado, como quem mergulha um pé no mar, sem compromisso.

Não é preciso escolher entre arriscar e não arriscar. Para quê tolher tanto a pouca liberdade que temos? Mais vale arriscar sempre que se quer: mas arriscar como quem faz um rabisco, sem saber se vai sair daí algum desenho, algum plano, porventura um mapa.

Logo se verá. Mas só arriscando e lá indo é que se pode ver.

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