Câmara algarvias fazem saldos no IMI, mas metade dos beneficiados nem vota ali

Em ano de autárquicas, os municípios baixam os impostos que recaem sobre o imobiliário. Mas os mais beneficiados — porque metade das casas são de segunda habitação — não são seus eleitores.

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É no triângulo dourado — Quinta do Lago, Vale do Lobo e Vilamoura — que se encontram muitas das vivendas de luxo no Algarve DR
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A Câmara de Loulé decidiu baixar, no próximo ano, a taxa do imposto municipal sobre imóveis (IMI) para o mínimo estabelecido — 0,3% —, o que significa que os contribuintes vão pagar menos 20% de imposto imobiliário do que em 2016. A redução nesta área, juntamente com a descida da taxa do IRS e a extinção da derrama representam uma perda de cerca de dez milhões de euros para os cofres municipais. Com as eleições autárquicas à vista, mais de duas dezenas de municípios portugueses seguem o exemplo de Loulé. A diferença é que, no Algarve, o retorno desta medida em votos é muito menor, porque mais de metade das casas são de não-residentes. Por isso, há quem se mostre contra os “saldos” no IMI, como é o caso do presidente da Câmara de Castro Marim, Francisco Amaral, PSD: “Baixar o imposto sobre as casas de férias só beneficia as famílias ricas.”

O certo é que mais de metade das habitações construídas na região algarvia (195.421 num universo de 378.349 fogos, segundo os Censos de 2011) são segundas residências.

Do conjunto dos concelhos algarvios, Loulé é aquele onde o sector turístico/imobiliário tem mais peso nas receitas municipais. É no chamado “triângulo dourado” — Quinta do Lago, Vale do Lobo e Vilamoura — que se encontram as vivendas de luxo, transaccionadas por milhões. Só na rubrica do IMT — o imposto sobre as compras de vendas de casas — a autarquia pensa arrecadar 25 milhões. Segundo o anuário estatístico regional de 2015, publicado pelo INE na semana passada, é neste concelho que se regista o valor mais elevado dos prédios — 206.857 euros por unidade, contra uma média nacional de 87.111 euros. A média regional é de 133.510. Um outro concelho de forte pendor turístico é Portimão, mas quando rebentou a bolha do imobiliário as contas entraram em derrapagem. A câmara foi obrigada a pedir um empréstimo de 142 milhões ao Fundo de Equilíbrio Financeiro (FAM), para não cair na falência, mas, mesmo assim, vai também baixar a taxa do IMI de 0,50% para 0,45%.

“As câmaras não fazem favores em baixar o IMI, porque a taxa está excessivamente alta”, observa o presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA). Lembra que o Orçamento do Estado (OE) introduz um novo imposto — uma taxa adicional a incidir sobre os prédios de valor patrimonial tributário superior a 600 mil euros. “Loulé é um dos concelhos beneficiados”, observa Elidérico Viegas. Dos dez milhões de receita de que o município abdica, a fatia do IMI é a mais significativa — representa 7,5 milhões de euros num orçamento que em 2017 ascende a 127 milhões. “Investimos na coesão social e na atractividade empresarial”, enfatiza o presidente da Câmara de Loulé, Vítor Aleixo,  PS, justificando assim a redução dos impostos. Por outro lado, a autarquia prescinde ainda de metade do valor que poderia arrecadar com o IRS (fixado em 2,5%) e anuncia a “extinção da derrama”, a taxa aplicada ao lucro das empresas.

Em sentido contrário manifesta-se Francisco Amaral. “A redução do IMI só beneficia as famílias ricas”, enfatiza. Por isso, diz, optou por submeter à aprovação da assembleia municipal uma proposta para manter a taxa nos 0,4%. Porém, apesar de o objectivo político de marcar uma posição ter sido alcançado, o resultado não foi o esperado pelo autarca. A assembleia reuniu-se a 9 de Novembro para decidir sobre estas matérias, mas a votação final acabaria por só se realizar numa sessão extraordinária a 5 de Dezembro. A câmara, porém, estava obrigada a comunicar às autoridades tributárias até ao dia 30 de Novembro o valor da taxa do IMI e, como isso não aconteceu, o valor foi fixado no mínimo (0,3%). “Perdemos um milhão de euros”, queixa-se Francisco Amaral, acusando o presidente da assembleia municipal, José Luís, socialista, de ter “lesado o erário público” e de ter cometido um crime de “abuso de poder” ao decidir adiar a votação.

“Passava da meia-noite, tínhamos uma ordem de trabalhos com 13 pontos — faltava discutir e aprovar os quatro assuntos principais da agenda, relacionados com a discussão e aprovação do orçamento e redução dos impostos”, justifica José Luís. “O presidente da câmara foi por mim avisado, atempadamente, da necessidade de submeter à assembleia municipal a proposta de orçamento e não o fez em tempo útil”, acrescenta. Quanto ao alegado prejuízo para o erário público, faz uma leitura oposta: “Os munícipes não perderam — ganharam, porque vão pagar menos impostos, sejam ricos ou pobres.” Este concelho, situado no Nordeste algarvio, tem sete mil habitantes e dispõe de um orçamento de 13 milhões de euros.

Portimão e Faro reduzem

Em Portimão, a questão dos impostos está a agitar a pré-campanha autárquica. A reacção do PSD à descida da taxa do IMI dos 0,50% para os 0,45% foi uma “tentativa para enganar os portimonenses”, acusou a presidente da câmara, Isilda Gomes, PS. O PSD disse, em comunicado, que a redução seria obrigatória de acordo com a lei do Orçamento do Estado (OE) para 2017. “Há uma excepção no OE para os municípios sujeitos ao Fundo de Apoio Municipal (FAM) poderem continuar na taxa máxima”, contesta a autarca. “A redução só foi possível porque tivemos capacidade negocial, demonstrando à comissão executiva do FAM que o orçamento é sustentável, mesmo vindo a perder cerca de 1,5 milhões de euros de receita”, sublinha. A autarquia recebeu um empréstimo de 142 milhões de euros.

A primeira tranche, 33 milhões de euros, chegou em Outubro, após vários chumbos do Tribunal de Contas, à contabilidade da autarquia. O restante chegará de três em três meses, durante o próximo ano. A taxa de juros de 2,5% é amortizável ao longo de duas dezenas de anos, tendo um período de carência de dois anos.

A Câmara de Faro, sujeita ao Programa de Ajuste Financeiro (PAF) e ao Programa de Apoio à Economia Local (PAEL), também acabou por descer a taxa do IMI do valor máximo 0,50% para os 0,45% — o que representa uma baixa de 10% no imposto sobre os prédios urbanos. O município, presidido pelo social-democrata Rogério Bacalhau, encontra-se há seis anos sujeito a um plano de reequilíbrio financeiro. As restantes taxas e impostos mantêm-se nos valores máximos.

Por sua vez, a Câmara de Albufeira já reduzira em 2015 a taxa do IMI para os 0,35% e isentou os munícipes do pagamento da taxa de derrama.

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