60 anos depois da revolução, a Hungria é "uma boa alternativa"

A Hungria não está na lista de destinos mais procurados por emigrantes portugueses, mas há quem veja condições apelativas no que ao emprego jovem diz respeito. Dez alunos de várias instituições de ensino superior portuguesas visitaram Budapeste

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Karoly Arvai/Reuters

Dez estudantes portugueses pisaram Budapeste no ano em que se comemoram seis décadas da revolução que marcou este país. A iniciativa, promovida pela Embaixada da Hungria em Portugal, passou por sete instituições de ensino superior portuguesas, de norte a sul do país, e deu a conhecer os momentos mais marcantes deste acontecimento internacional. Um desafio lançado aos alunos atribuiu como grande prémio uma viagem de quatro dias à capital húngara.

Em 1956, a Hungria viveu a primeira grande revolta popular contra a dominação soviética que reinava no país desde a segunda Guerra Mundial. Tudo começou com uma concentração de 50 mil estudantes em Budapeste, mas rapidamente atinge outras proporções. Cerca de 200 mil pessoas dão nome à Revolução Húngara. A resistência húngara continuou até 10 de Novembro e o resultado tanto tem de trágico como de vitorioso: 20 mil húngaros e 720 soldados soviéticos foram mortos no conflito, tendo 200 mil pessoas fugido, exilando-se fora do país. Por outro lado, a revolução pode ser vista como a antecipação do desabamento do comunismo nos países europeus.

Foi este acontecimento marcante para a democratização dos países governados anteriormente por ditaduras comunistas que levou a embaixadora da Hungria em Portugal a pensar numa estratégia para chegar aos jovens portugueses. “Quando dei palestras em diferentes universidades nos últimos dois anos percebi que, na geração mais jovem, a história da Revolução e Liberdade de 1956 (…) deveria ser mais conhecida por se tratar de um momento decisivo na história da Guerra Fria, que abriu olhos para muitos no oeste sobre os actos do estalinismo e que certamente deu um grande golpe a este regime cruel, contribuindo para a democratização da nossa região que alcançamos muito mais tarde, em 1990”, explica Klára Breuer em entrevista ao P3.

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“Não esperava encontrar-me com vários portugueses em Budapeste mas a verdade é que estão lá” (Daniel Olah/Unsplash)

Sessenta anos depois da revolução, Portugal foi palco de diferentes iniciativas. Sete instituições de ensino superior (Universidade do Minho, Universidade do Porto, Universidade de Coimbra, Universidade de Lisboa, Universidade Nova de Lisboa, Universidade Católica e Instituto de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa) participaram no desafio lançado pela embaixada e promoveram um quiz sobre a Hungria junto dos alunos. “Preparamos um pequeno texto sobre a história da Revolução e da Luta pela Liberdade e todos aqueles que se esforçaram para ler essas páginas poderiam responder correctamente às 13 perguntas e participar no sorteio”, conta a embaixadora.

“Uma realidade desconhecida” mas semelhante à portuguesa

Rute Cravinho, 19 anos, foi a vencedora de uma das dez viagens que decorreu de 8 a 12 de Dezembro a Budapeste. Para a estudante da licenciatura em Relações Internacionais no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, a visita foi curta mas deu para “perceber melhor a história da Hungria e as relações internacionais estabelecidas”. Natural de Lisboa, vestiu a pele de turista num país que desconhecia. A Praça dos Heróis, os escritórios do primeiro-ministro, o parlamento húngaro e o gabinete do presidente foram algumas das paragens obrigatórias. Por lá, encontrou simetrias mas conseguiu sentir-se em casa. “Cruzamo-nos com muitos portugueses nas ruas e percebemos que a Hungria não é assim tão diferente de Portugal”, disse em entrevista ao P3.

Inês Matos ficou “feliz por conhecer uma realidade desconhecida”. A eficiência dos transportes públicos a funcionar 24 horas por dia, a arquitectura dos locais históricos da cidade e a simpatia das pessoas são as recordações que tem mais presentes. “Considero que Budapeste é uma cidade desenvolvida em comparação com outras capitais europeias, mas o nível de vida é equiparado ao nosso”, resume a estudante de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Católica Portuguesa. Com 21 anos, a jovem natural de Alverca do Ribatejo apenas lamenta que a viagem se tenha centrado numa cidade: “Conhecer só Budapeste não nos dá uma imagem do país na sua totalidade. Fiquei com vontade de regressar, conhecer as zonas mais afastadas da capital para ver se o contraste com o resto do país é acentuado ou não”.

Uma opinião partilhada por Rute, que sentiu falta de “ver o campo, as montanhas e os castelos do interior”. Apesar do desejo de regressar e conhecer outras realidades do país, as duas estudantes portuguesas são unânimes quando dizem que não se imaginam a sair de Portugal – pelo menos não tão cedo. Primeiro, o objectivo é terminar o curso.

Hungria, “uma boa alternativa” 

Rute considera, porém, que a Hungria reúne condições apelativas. “Se me visse a sair de Portugal, a Hungria seria o destino perfeito porque tem excelentes oportunidades de emprego para os jovens e o custo de vida não é assim tão elevado”, sublinha. Já Inês ficou surpreendida com o número de estudantes portugueses que estão actualmente a fazer Erasmus na capital húngara. “Não esperava encontrar-me com vários portugueses em Budapeste mas a verdade é que estão lá”, diz.

Ao contrário da Noruega e da Bélgica, que mostram um crescimento significativo nas entradas de portugueses durante os últimos anos, a Hungria não está na lista de destinos mais procurados por emigrantes portugueses. Dados do Observatório da Emigração (OdM), mostram que, em 2014, o país que conquistou as estudantes portuguesas registou 64 entradas. Uma tendência que abrandou ligeiramente em comparação com as 77 emigrações assinaladas em 2013. Mas, não são estes os números que tornam a Hungria um dos locais de preferência dos emigrantes portugueses. A embaixadora da Hungria em Portugal não revelou dados concretos acerca da entrada de portugueses no país, mas considera que “não há muitos portugueses na Hungria”. Esta presença pouco significativa não invalida a existência de “pessoas que estudam, trabalham e constituem família no país”, disse ao P3 Klára Breuer.

Por ser recente, o fenómeno da emigração para este país carece de uma análise mais avançada, admite o OdM. Em 2000, os números eram residuais (cinco entradas) e só a partir de 2008 começaram a crescer ligeiramente. Inês Espírito Santo, investigadora do Observatório da Emigração, não adianta mais detalhes sobre o “número pouco significativo de portugueses neste destino”, mas sugere que “a Hungria e o seu mercado de trabalho nunca atraiu trabalhadores portugueses”. Ao contrário do que acontece “em França ou noutros destinos com um stock migratório elevado”, para a Hungria “não se criou uma corrente migratória”. A ausência de estudos ou trabalhos sobre o tema impede, segundo o OdM, a divulgação de dados mais recentes. O P3 não conseguiu apurar os dados relativos a 2015.

A presença de jovens portugueses e as semelhanças entre Portugal e a Hungria – dois países da União Europeia que distam entre si 2390 quilómetros e têm áreas e população de dimensões em tudo semelhantes – tornam o país da Europa Central “uma boa alternativa”. A embaixadora da Hungria em Portugal acredita que o projecto desenvolvido recentemente em parceria com outro país da União Europeia foi uma mais-valia: “Espero que eles [os estudantes] tenham tido boas impressões e falem sobre a sua experiência para os amigos, fazendo com que outras pessoas pensem em ir para a Hungria”. Rute não descarta a possibilidade de emigrar. “Sair do país já é difícil, mas a Hungria parece um excelente país para nos podermos enquadrar”. Para já, as estudantes portuguesas não sabem o que o futuro reserva. Só lhes resta esperar.

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