Possíveis consequências do raro assassínio de um embaixador

Há pouco precedentes para o assassínio de um embaixador em funções – o último foi o americano Christopher Stevens, morto com três outros funcionários dos Estados Unidos, no consulado de Bengazi, na Líbia, em 2012.

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Andrei Karlov foi morto a tiro numa galeria de arte de Ancara AFP/NATALIA KOLESNIKOVA

As relações entre a Rússia e a Turquia pioram

É muito pouco provável e ambos os chefes de Estado e membros do Governo já se desdobraram em garantias do contrário. Vladimir Putin e Recep Tayyip Erdogan estão unidos no que entendem ser “uma conspiração ocidental” contra ambos, como diz o analista turco Mustafa Akyol, citado pelo Guardian.

Ainda assim, a recente reaproximação (depois de meses de laços cortados e sanções económicas de Moscovo a Ancara por causa da Síria e de um caça russo abatido junto à fronteira turca) é frágil e Erdogan tem de gerir uma opinião pública descontente: nas últimas semanas, por causa da ofensiva em Alepo, dezenas de milhares de pessoas têm-se manifestado na Turquia contra a Rússia, incluindo na fronteira com a Síria.

Num cenário de deterioração de laços, as consequências mais imediatas seriam para o conflito sírio, com o possível colapso do cessar-fogo em Alepo. A mais longo prazo, os russos poderiam usar os curdos, com os quais têm relações próximas, apoiando a revolta do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdisão) na Turquia ou grupúsculos mais radicais que reivindicaram vários atentados no país.

Um pretexto para maior repressão interna

Uma das consequências deste crime é que tanto a Rússia como a Turquia o usem para reprimir mais ainda as respectivas oposições, nota a Foreign Policy. Erdogan deteve milhares de pessoas nos últimos meses, a pretexto de suspeitos laços ao movimento de Fethullah Güllen, o líder religioso que acusa de estar por trás da tentativa de golpe de Estado de 15 de Julho. Alguns responsáveis já referiram a possível ligação do assassino do embaixador Andrei Karlov aos gulenistas. Os curdos não foram poupados e duas das suas deputadas, eleitas pelo HDP (Partido Democrático do Povo), foram detidas já em Dezembro (o HDP estima que 291 dos seus membros estejam detidos).

Putin chegou ao poder, em grande parte, por causa da mão dura usada contra a Tchetchénia e nunca recusou pretextos para combater o que os dois líderes referem em termos alargados como “terrorismo” (expressão que ambos usam com significados diferentes mas sempre para querer dizer oposição, muitas vezes não violenta).

Hackers russos atacam na Turquia

Esta possibilidade, colocada também pela Foreign Policy, baseia-se em acontecimentos recentes, incluindo a investigação à possível interferência russa na campanha para as eleições presidenciais nos EUA. Erdogan já teve experiências parecidas, como quando a Wikileaks divulgou 57 mil emails do seu ministro da Energia e Recursos Naturais (e genro) Berat Albayrak, há poucas semanas. E, escreve a revista americana, há “indicações de que russos ou a Rússia colaboraram com a Wikileaks para divulgar emails pirateados no passado”.

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