"A maioria das pessoas nem tentou entender a questão que levantei"

Rui Rio nega que a ideia que apresentou sobre o pagamento dos juros da dívida, para aumentar a transparência e a pressão sobre os governos, significasse sobrecarregar os contribuintes. "Nenhum cidadão iria pagar mais impostos."

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Rio falou do novo imposto durante o debate sobre Fiscalidade e Orçamento do Estado, que moderou na segunda-feira no Porto ADRIANO MIRANDA/Arquivo

 

Numa entrevista por escrito ao PÚBLICO, Rui Rio explica com mais detalhe o objectivo da pergunta que lançou esta semana para discussão, na qualidade de moderador  de um debate, no Porto, sobre Fiscalidade e Orçamento do Estado. O ex-autarca do PSD, que pode vir a disputar a liderança do partido em 2018, vislumbra vantagens na ideia que apresentou sobre um novo imposto e sublinha que o valor anual que os portugueses pagam em juros da dívida é idêntico ao que custa o Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Quer explicar melhor a ideia da criação de um novo imposto que serviria para pagar, anualmente, os juros da dívida pública?
Eu não fiz nenhuma proposta, nem falei num novo imposto para pagar a dívida. Pedi apenas um comentário aos palestrantes de um debate que estava a moderar sobre uma ideia em concreto. E essa ideia consistia na possibilidade de se baixar um ou mais impostos e, por contrapartida, criar um novo dedicado ao pagamento dos juros da dívida pública que todos estamos a pagar anualmente. Ao contrário do que alguns maldosamente insinuaram, nenhum cidadão iria pagar mais impostos.

A questão passa por baixar o IVA, o IRS e o IRC e criar, em contrapartida, um novo imposto consignado ao pagamento dos juros?
Sim, hoje os cidadãos pagam através desses impostos cerca de 8,3 mil milhões de euros de juros da dívida pública, porque todos os anos o Orçamento de Estado tem sido deficitário; ou seja, anualmente a dívida aumenta e os juros também. E todos os anos os portugueses pagam mais em juros, sem se aperceberem directamente dessa verba. Se nós evidenciarmos esse valor através de um imposto específico, o cidadão passaria a perceber a brutalidade que está a pagar por conta dos permanentes défices públicos. Se tivéssemos essa transparência fiscal os portugueses seriam os primeiros a pressionar o Governo para termos contas públicas equilibradas, no sentido de evitar a subida desse imposto. Caso contrário, será como sempre foi, as pessoas não têm noção do que esta rubrica – filha dos erros do passado – representa nos diversos impostos que são obrigados a pagar.

Faz sentido esse novo imposto?
É uma questão de transparência para tentar, dessa forma, criar uma pressão benigna sobre os Governos no sentido da redução da carga fiscal. Se os orçamentos futuros tiverem um pequeno excedente, este imposto baixa; se tiverem défice, o imposto sobe e as pessoas tendem a penalizar o Governo. Hoje pagam na mesma e nem sequer têm consciência da brutalidade que estão a pagar em juros. O valor é idêntico ao que custa o SNS ao Estado. Acha que as pessoas têm noção disto?

Também é curioso: nos comentários e notícias que foram saindo, principalmente nas redes sociais, li críticas e muitos insultos gratuitos, mas não consegui ler nenhuma objecção inteligente a esta ideia. Mas ela também tem desvantagens, e se quem a critica não as sabe identificar, eu próprio dou uma ajuda – por exemplo, a enorme transparência fiscal que este imposto traria pode criar condições para que os movimentos de perfil populista comecem a explorar mais facilmente a ideia do não pagamos.

Há algum país que tenha criado esse imposto?
Na Suíça, por exemplo, há uma tradição de relevar o princípio que está subjacente a esta ideia, para que as pessoas percebam bem para onde vai o dinheiro dos seus impostos. Mas, se calhar, esta comparação não será muito justa devido à diferença civilizacional … Basta ver o tipo de reacções que se ouviram ao simples facto de eu ter levantado a questão.

A sua ideia não encontrou grande receptividade. Há quem considere que Portugal deveria reclamar a renegociação da dívida nos seus montantes, prazos e juros. Concorda?
Sinceramente, acho que a maioria das pessoas nem tentou entender a questão que eu levantei, e uma parte da comunicação social tratou logo de a distorcer. Muitos títulos foram tão erróneos quanto isto: 'Rio propõe um novo imposto para pagamento da dívida'. Assim é difícil conduzir um debate de forma séria e racional.

Quanto ao resto, acho que Portugal só poderá pensar em falar com os seus credores, depois de ter não só o seu Orçamento equilibrado, como políticas públicas consistentes de médio e longo prazo em termos de consolidação das suas finanças públicas.

 

Notícia editada a 28 de dezembro para incluir a informação de que esta entrevista foi feita por escrito. 

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