Tudo está ligado e nada também está ligado

Em Dirk Gently's, cuja primeira temporada começa hoje na Netflix, há um gigantesco puzzle cujas peças, sabemos, irão encaixar. Mas vai levar muito tempo.

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Depois dos 50 e poucos minutos que correspondem ao primeiro episódio de Dirk Gently’s Holistic Detective Agency, nada faz sentido. Desconexo, fragmentado, dezenas de personagens mais ou menos bizarras, algumas verdadeiramente aleatórias. O equivalente a um gigantesco puzzle de dez mil pequenas peças, sabemos que tudo irá encaixar, mas vai levar muito tempo. Vamos acreditar no que Dirk Gently, o detective holístico, nos diz várias vezes: tudo está ligado e nada também está ligado.

Dirk Gently’s Holistic Detective Agency é a adaptação televisiva de um universo criado por Douglas Adams, que ficou mais conhecido por ter escrito The Hitchhiker’s Guide to the Galaxy, e vai ter a sua primeira temporada de oito episódios disponível na Netflix a partir de hoje, 11 de Dezembro. Max Landis, o filho do realizador John Landis (Um Lobisomem Americano em Londres, O Dueto da Corda), é quem faz a adaptação, ele que, aos 31 anos, já tem um currículo assinalável como argumentista – Chronicle, American Ultra, Victor Frankenstein. Esta é a segunda vez que Dirk Gently chega à televisão, depois de uma primeira tentativa de quatro episódios produzidos pela BBC entre 2010 e 2012, e já tem garantida uma vida maior que o seu antecessor –   esta nova versão produzida pela BBC America já foi prolongada para mais uma temporada.

Dirk Gently começa como um episódio genérico de uma qualquer versão de CSI, um crime aparentemente violento num quarto de hotel, com marcas de dentadas no tecto e um gatinho com as patas ensanguentadas a sujar o tapete do quarto – muita atenção a este gato. Rapidamente se percebe que esta não é uma história de detectives qualquer. Tem mais peças do que um policial de Raymond Chandler e é mil vezes mais absurdo do que O Grande Lebowski. Tem vampiros psíquicos, viagens no tempo, carecas com tatuagens esquisitas na nuca e momentos musicais. Tem coisas de noir e um detective que usa um casaco amarelo, mais próximo de Dr. Who do que de Philip Marlowe.

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É difícil visualizar o puzzle completo com tantas peças soltas que parecem não encaixar, mas é isso que torna Dirk Gently um objecto tão especial e absurdamente divertido. Lembram-se daquele momento em Hitchhiker’s em que uma baleia toma consciência da sua própria existência no momento em que está em queda livre? Em Dirk Gently é tudo assim. Por exemplo, do nada (mas será mesmo do nada?), uma mulher desata a perseguir um pirata informático que parece estar a tentar aceder a uma coisa qualquer que não interessa nada. Depois, iremos perceber que ela é uma assassina holística que anda atrás do detective holístico para o matar. Como não o conhece, mata toda a gente que lhe aparece pela frente se essa for a vontade do universo. 

A personagem mais “normal” da série não existe no original de Douglas Adams, mas encaixa que nem uma luva neste universo, Todd, o pouco afortunado empregado de hotel que é arrastado para o meio da “conspiração”, interpretado pelo eternamente jovem Elijah Wood. Ele é a contraparte séria para o fleumático Dirk Gently (Samuel Barnett, que já foi Renfield em Penny Dreadful), um Watson relutante para um Holmes palavroso, inconveniente e muito peculiar nos métodos de investigar um crime. Não há aqui deduções óbvias baseadas em pistas conclusivas. Não é preciso procurar pistas. Porquê? Tudo fará sentido. E nada também fará sentido.

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