“As conclusões do PS e BE sobre a dívida não vão ser grande cartucho”

O líder do PCP, Jerónimo de Sousa, insiste na necessidade de o Governo preparar o país para uma eventual expulsão do euro e de renegociar a dívida.

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Avaliar a sustentabilidade da dívida? "As conclusões não vão ser assim grande cartucho"

Como é possível um partido que defende a preparação do país para a saída do euro e da União Económica e Monetária, aprovar orçamentos que obedecem às regras do Tratado Orçamental? Como é que o PCP consegue resolver isto, que é uma aparente contradição?
A contradição está nesta linha da necessidade de reposição e conquista de direitos e simultaneamente aceitar os ditames, as imposições e os constrangimentos da União Europeia, incluindo a questão do euro. A nossa posição não é contraditória. O que nós dizemos é que não perderemos nenhuma oportunidade para repor e conquistar direitos e rendimentos, com a consciência das limitações da solução política encontrada. E aí falamos naturalmente na contradição que é a necessidade que temos, não só de repor os rendimentos e direitos [mas] designadamente para esta questão fundamental do investimento, do desenvolvimento económico, de que precisamos como pão para a boca. Precisamos de aumentar o nosso aparelho produtivo, a nossa produção nacional, para criar mais emprego.
Toda a gente está de acordo com isto, mas isto faz-se com dinheiro. E a verdade é que nós encontrámos essa dificuldade ainda agora no OE2017. Se se discute mais uma verba para as pensões e reformas, mais em relação a apoios sociais, mais para a escola pública, para o SNS, vem sempre o argumento: não há verba disponível. Porquê? Porque em relação ao serviço da dívida vamos ter de encontrar durante um ano cinco mil milhões de euros, para atender a compromissos. Cinco mil milhões de euros que jeito nos dariam nessa perspectiva de investimento e desenvolvimento económico. Mas não. Isto é uma sangria desatada que, depois, conflitua com essa possibilidade real de avançar no plano dos direitos e rendimentos. Aqui é que está a contradição. Mas de qualquer forma, sem a necessidade de uma ruptura com esta política e com estes constrangimentos, a questão que se colocava ao PCP era se ficava nas suas tamanquinhas, abdicando da possibilidade de intervir para repor e conquistar direitos.

A propósito da dívida, nas Teses é escrito que é preciso uma renegociação que reveja as condições de pagamento e reduza nominalmente os montantes devidos". A palavra "montantes" é aqui sobejamente importante, porque é onde pode haver maior divergência. Para o PCP, e nos contactos que tem mantido com o Governo, esta continua a ser uma prioridade? Acha que o Governo do PS, este Governo alguma vez vai colocar isto na agenda?
Não quero fazer futurologia, mas em política muitas vezes as coisas acontecem quando não esperáveis. No momento concreto que vivemos, verificamos que o PS não se demarca dessa obrigação de aceitar, acrítica e passivamente, esse situação da dívida e do serviço da dívida. Vai afirmando que pode ir avançando mesmo com esse condicionalismo. Achamos que há aqui de facto uma contradição. Vamos manter essa questão como parte integrante da nossa proposta para uma política patriótica e de esquerda. Mas, muitas vezes, a vida política impõe caminhos que são inesperados. É aqui que dizemos ao PS é que consideramos que é importante assumir este processo da renegociação da dívida.

Parte da dívida portuguesa está em bancos portugueses. Uma renegociação dos montantes não iria fragilizar mais ainda a banca portuguesa, incluindo a pública?
Não, porque naturalmente não é só na banca portuguesa. Temos de fazer opções e esta questão da renegociação da dívida deve ser vista a par da necessidade de nos prepararmos para uma saída do euro, que está neste momento com uma grande instabilidade e incerteza, que pode ter processo de explosão ou de implosão, tendo em conta situações de alguns países que começam a fazer também questionamentos. Não é o caso, mas o processo do Brexit tem aqui também leituras e consequências. Consideramos que o Estado português devia preparar-se para a avaliação das consequências de uma saída do euro ou mesmo da possibilidade de expulsão do nosso país da União Económica e Monetária. Não vai ser um processo dirigido pelo PCP, mas consideramos que o Estado tinha a obrigação, à luz da defesa dos interesses nacionais, de encarar estes processos: renegociação da dívida, a questão do euro como importante.

O Governo tem informado o PCP sobre o andamento do grupo de trabalho com o BE sobre reestruturação da dívida? E ao nível do que são os trabalhos de grupo entre o PCP e o Governo, há já conclusões?
Não, não temos. As reuniões e as conversas que temos tido foram essencialmente em torno da questão do OE2017. Em relação ao trabalho do PS com o BE é um sinal, mas eu acho que é bastante recuado.

Mas convosco ainda não houve conversa?
Não, não houve. [Sobre] avaliar a sustentabilidade da dívida, eu acho que as conclusões não vão ser assim grande cartucho. Mas de qualquer forma...

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