Mikael Tariverdiev: da Rússia, com assombro

Foi um dos mais respeitados e populares compositores da União Soviética, mas era para nós um completo desconhecido. Entretanto, deparámo-nos com um portento. The Irony of Fate, banda sonora do mais famoso dos 130 filmes que musicou, é editado esta sexta-feira. Pode ouvi-lo aqui.

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Tariverdiev (aqui retratado nos anos 1950) nasceu em Tbilisi, filho de pais arménios, e morreu em 1996, com 64 anos DR

Todos conhecem Mikael Tariverdiev, compositor que atravessou a história da União Soviética, e da Rússia em particular, durante a segunda metade do século XX. Compositor de obra vasta e respeitada na área da música erudita, deixou a sua marca, decisiva, no trabalho criado para cinema e televisão. Muitas das suas peças tornaram-se tão presentes na memória colectiva que atingiram o mesmo estatuto do folclore popular. Todos conhecem Tariverdiev? Sim, na Rússia todos o conhecem. Mesmo os poucos que não lhe reconhecem o rosto ou o nome trazem consigo as canções e melodias que se tornaram indistinguíveis das cenas e das personagens de filmes como Um Homem Seguindo o Sol, Adeus!, Rapazes, A Ironia do Destino ou da série televisiva Dezassete Momentos de Primavera, a mais popular produzida na União Soviética.

Escondido do Ocidente pelo Muro de Berlim e pela sua condição de personalidade integrada na vida soviética, ainda que independente perante o regime, Mikael Tariverdiev manteve-se um segredo para nós até ao final do ano passado, quando a Earth Recordings, guiada por Vera Tariverdiev, a sua viúva, reuniu uma obra vasta e ecléctica, comparada a Nino Rota, Serge Gainsbourg ou Michel Legrand, na compilação tripla Film Music. É uma descoberta da ordem do assombro: pela forma como naquela música confluem jazz americano e chanson francesa, ainda que as raízes estejam sempre firmemente assentes no solo do folclore russo; pela voz de barítono, maturada em fumo de cigarro e plena de uma misteriosa melancolia que não é estado de espírito, antes condição crónica; pela forma como se conjuga a criação erudita longamente reflectida e a intuição seguida como musa.

Depois da edição de Film Music, a Earth Recordings dedica-se agora a continuar a divulgação da obra de Mikael Tariverdiev. Chega-nos então The Irony of Fate – Original Score, banda sonora de A Ironia do Destino, comédia de costumes estreada em 1975 e realizada por Eldar Ryazanov. Tariverdiev compôs a música para o filme em duas semanas, depois de convencer o realizador a desistir da ideia original, que passava por pedir música a vários compositores, e a entregar-lhe a ele todo o trabalho. Ouvimos o resultado e encontramos todas as qualidades do compositor. Mais: comprovamos, sem as imagens para as quais a música foi escrita, que esta lhes sobrevive incólume.

The Irony of Fate – Original Score tem edição marcada para esta sexta-feira e pode ouvi-lo aqui. Prossegue a descoberta do homem nascido em 1931 em Tbilissi, Geórgia, filho de pais arménios, e falecido em 1996. Prossegue a descoberta do Tariverdiev que todos conhecem, perdão, que todos deviam conhecer.

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