Que futuro para a região de Mossul?

A batalha ainda não está terminada, mas a vitória das forças iraquianas é praticamente certa. No entanto, os riscos de uma destabilização ainda maior do que a actual não deve ser descartada.

Mossul é a segunda maior cidade do Iraque e a cidade bastião onde o autoproclamado Estado Islâmico (EI) instalou o seu califado no Iraque desde há dois anos. Reconquistar Mossul representará um avanço importante no combate contra o EI. Mas a região é absolutamente estratégica do ponto de vista geopolítico e existem múltiplos interesses relacionados com território e petróleo que arriscam destabilizar a região.

O exército iraquiano, apoiado pelas forças armadas norte-americanas, está a tentar conquistar a cidade, sendo praticamente certa uma vitória militar, embora não imediata. No entanto, a região de Mossul sofre influência, ainda que indireta, da Turquia, do Irão e dos peshmerga curdos, sem excluir várias milícias regionais, cristãs, xiitas, yazidis e outras. Assim como a possibilidade de jihadistas do EI virem a dissimular-se na população. A situação na vizinha Síria é também complexa e tem uma forte presença da Rússia.

A população de Mossul, de cerca de 1,5 milhão de habitantes, é fundamentalmente sunita, num país de maioria xiita. Mas tem também habitantes de outras religiões, designadamente no lado este do rio Tigre, que atravessa Mossul, onde vivem populações curdas e de origem cristã. A maioria dos sunitas de Mossul, embora tivessem dado algum apoio no início ao EI, não professam a mesma interpretação rigorosa do islão e já não o apoiam.

Por outro lado, a população de Mossul também nunca aceitou bem a humiliação e a marginalização do poder xiita de Bagdad desde 2003. Por isso, os seus receios são grandes em relação aos combatentes do EI, mas também em relação a possíveis represálias por parte dos militares iraquianos. E de outras milícias. Esses receios extravasam a população de Mossul e abrangem praticamente toda a província de Ninawa, cuja capital é Mossul. Esta circunstância torna toda a região mais vulnerável a influências externas e a manobras desestabilizadoras.

Para além das tropas iraquianas, as milícias peshmerga pretendem dominar parte do território. Mas estão também tropas turcas estacionadas ao norte de Mossul e há tropas iranianas, não muito longe, atentas às evoluções. A atitude de Ancara é preocupante por causa de ambições territoriais antigas. Consideram que a Turquia foi prejudicada pelos Aliados no Tratado de Lausanne, de 1923, pressionados pela Grã-Bretanha, quando se definiram as fronteiras turcas após a queda do Império Otomano no fim da Guerra de 1914-18. Essas ambições aplicam-se também ao norte da Síria.

A Turquia ofereceu já várias vezes ajuda a Bagdad para expulsar os jihadistas tendo sido sempre recusada por receios expansionistas. Tentou também posicionar-se como líder dos sunitas na região de Mossul em defesa dos xiitas, mas sem grande sucesso. Para além da questão curda, os seus interesses na região estão ligados a um oleoduto que poderá atravessar parte do Irão e o norte do Iraque até ao Mediterrâneo. Os países vizinhos e outras forças estão atentos à situação e a oportunidades.

Por todas estas razões, não existe garantia que a “libertação” de Mossul gere mais estabilidade na região, podendo até agravá-la. Tudo deverá depender da distribuição de poder na altura e da forma como o processo for conduzido. Nessa última vertente, o relacionamento entre os EUA e a Rússia será certamente importante.

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