Trump já é grande

Decidiu cedo como iria ser o seu futuro. Seria rico, poderoso, uma estrela.

Foto
Andrew Kelly/Reuters

A Trump Tower de Nova Iorque é forrada de espelhos, por dentro e por fora. O espelho amplifica tudo. A Tower é mais pequena do que parece, é menos bonita do que parece, é menos luxuosa do que aparenta. Durante muitos anos, Donald Trump foi como a sua torre — mostrou-se ao mundo maior do que realmente era, mais poderoso do que a realidade ditava, mais rico do que diziam as contas bancárias.

Há quem chame a este exercício um embuste. Trump chamou-lhe estratégia. Com um eficaz jogo de espelhos — sobrepondo a aparência à realidade —, o rapaz da classe média remediada de Queens tornou-se o senhor da quinta avenida.

Não se sabe em que momento da vida Donald decidiu como iria chegar ao seu futuro. Sabe-se que traçou um rumo cedo na vida — seria rico, seria poderoso, seria uma estrela. No colégio militar, aprendeu a ser competitivo. Aprendeu que, para se chegar a um objectivo, faz-se o que for preciso — acordar às cinco da manhã, por exemplo. Depois da faculdade, arrancou o negócio de imobiliário do pai da mediania e transformou-o num império. Comprou terrenos, especulou, construiu — na Nova Iorque dos anos de 1980, tornou-se a estrela mais brilhante da geração yuppie que se matava a trabalhar, decidia sem escrúpulos e usufruía da riqueza que acumulava com ostentação.

Um dia, a casa veio abaixo e Trump faliu — vendeu tudo, iate, prédios, relógios. Como o avô, Friedrich, imigrante alemão que mentiu sobre a sua nacionalidade para passar despercebido durante os anos da guerra (dizia ser sueco), Trump adaptou a realidade. Convenceu investidores, procurou novos negócios e renasceu. Investiu em Wall Street (na bolha da bolsa dos anos 90), virou-se para o entretenimento (concursos de misses) e até tentou ser nomeado candidato à presidência pelo Partido Republicano, desistindo quando percebeu que o partido era "disfuncional".

Trump e as imagens incríveis da estrela da reality TV que será Presidente

Foto
REUTERS/Carlo Allegri

Neste Verão, tentou outra vez. Houve quem não o levasse a sério, não vendo os sinais — vendeu os direitos dos concursos de misses e desfez-se de outras actividades menos adequadas. Houve quem dissesse que, como em 1999, Trump queria apenas voltar a ganhar protagonismo antes de uma nova aventura nos negócios (queria erguer um império de media).

O que queria Trump realmente com esta aventura que começou por ser improvável e acabou sendo surpreendente, não se sabe. Sabe-se que a América, desta vez, estava receptiva. Durante anos, a América viu este homem de 70 anos e cabelo loiro entrar em sua casa e ser brilhante — viram-no como um líder perfeito, um homem que sabe tomar decisões, que é sempre justo, que não se preocupa com perdedores porque tem faro para vencedores. Viram-no num programa de televisão, O Aprendiz — outro espelho a misturar a aparência à realidade.

Agora, este homem infalível que lhes mostrou que sabe liderar e que sabe vencer, propunha-se tomar conta de um país.

"Passei toda a minha vida no mundo empresarial, observando o potencial por explorar em projectos e pessoas em todo o mundo. É o que quero fazer pelo nosso país agora. Grande potencial. Todos os americanos vão ter a oportunidade de concretizar o seu potencial. Os homens e as mulheres esquecidos do nosso país não serão mais esquecidos", disse no discurso de vitória. "A América só se vai contentar com o melhor. Temos de recuperar o destino do nosso país. E sonhar de forma ousada e desafiadora. Vamos sonhar com feitos grandiosos e especiais para o nosso país".

Trump projectou o sonho de moldar a América à sua imagem — confiante, próspera, grande. A América entregou-se e elegeu Trump Presidente. Não importa se a imagem é real ou está ampliada. Neste momento, Trump cumpriu o seu futuro: é grande.

Veja todas as notícias sobre as eleições americanas

Sugerir correcção
Ler 3 comentários