Câmaras do Algarve investem 2 milhões num canil

Mais do que construir a casa para os cães, o que preocupa os autarcas é o preço a pagar para cuidar dos animais abandonados. O estudo da viabilidade económica não está ainda feito, mas os autarcas já concluíram: “É só para perder dinheiro”

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Matt Jones/Unsplash

Metade das 16 câmaras do Algarve, na zona do sotavento, vão investir cerca dois milhões de euros na construção de um canil, em Alcoutim. Dinheiro para a obra, admite o presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve (Amal), Jorge Botelho, “não é o mais difícil, a dificuldade poderá estar na sustentabilidade”. Este foi um dos assuntos que marcou a última reunião da Amal, centrada na questão dos animais abandonados e nova lei que proíbe o abate de cães e gatos, por falta de espaço nos canis e gatis. A regra, a vigorar a partir de 2018, passa a ser a esterilização e a adopção.

O que está previsto no novo diploma, aprovado por unanimidade na Assembleia da República, é o que se pratica há mais de três décadas no canil de São Francisco de Assis, em Loulé. “Isso é que fazemos desde sempre”, sublinha a alemã Lieselotte, mais conhecida por “Lilo” — presidente da Associação dos Amigos dos Animais Abandonados, que dirige este canil, que dá abrigo a 300 cães, 50 gatos e três mulas.

Esta terça-feira, 8 de Novembro, em Lagoa, na sequência da reunião do Conselho Intermunicipal da Amal, realizado na passada sexta-feira, os autarcas do sotavento vão debater a hipótese de vir a construir, à semelhança do que se projecta para Alcoutim, um outro canil/gatil. Para já, os autarcas decidiram que o estudo que irá determinar o tipo de canil e forma como poderão ser administradas estas duas infra-estruturas vai ser alargado a toda a região, sendo suportado pelas 16 câmaras. “Podiam começar por conhecer a nossa experiência”, observa Lieselotte, que conhece o terreno do “abandono” dos animais, desde há 46 anos, quando veio viver para o Algarve. “A região de turismo podia dar-nos uma medalha”, brinca, lembrando o trabalho que tem vindo a desenvolver para resgatar os cães, à deriva pelos campos e praias.

O canil de São Francisco de Assis — um dos 18 que estão protocolados, a nível nacional — recebe o apoio das câmaras de Loulé, Faro e Tavira, para além de instituições congéneres estrangeiras e de particulares. Os pedidos de adopção, por ano, situam-se na casa das duas centenas, vindos da Alemanha. Porém, as preocupações com a vida animal, comenta a vice-presidente da associação, Lurdes Inês, “ registaram uma significativa melhoria”. Deste canil para as casas particulares dos portugueses saem, em média, 150 animais por ano. “Preferem os cachorrinhos, os adultos ficam de lado.”

A razão, alegam, prende-se com o facto de julgarem que os novos são mais fáceis de ensinar. “É um erro — estes animais, tão carenciados que ficam depois do abandono, ficam gratos para sempre a quem os recebe”. Por sua vez, Lieselotte diz, em relação à castração, que os caçadores alimentam um mito: “Têm a ideia de que os animais castrados perdem o faro — não é verdade, os meus cães [castrados] saíam para o campo e vinham de lá com um coelho na boca.”

O número de animais deixados à sua própria sorte, tradicionalmente, era mais elevado em dois momentos: um no início do período das férias de Verão, outro na fim da época da caça. “Agora é todo o ano”, revela Lurdes Inês, lembrando que a construção de um ou dois canis intermunicipais na região “pode até não ser suficiente”.

Os presidentes de Câmara, acossados com os problemas sociais que resultam dos chamados “cães vadios”, manifestam-se preocupados. “Esta é uma situação muito séria, que tem de ser resolvida à escala regional”, lembra Jorge Botelho, recebendo a concordância dos seus pares. O estudo, a realizar até final do ano, vai analisar a experiência de três canis com características diferentes: Cantanhede, Arganil e Beja. Em causa está a escolha do modelo de gestão e viabilidade económica do projecto para a região algarvia. “Em termos económicos, é só para perder dinheiro”, rematou Jorge Botelho, na reunião do Conselho Intermunicipal da Amal. A localização do canil/gatil em Alcoutim — na zona mais periférica da região — foi justificada pela necessidade de “tornar consequente a politica de coesão territorial”. O presidente do município, Osvaldo Gonçalves, recebe a proposta com agrado: “A criação de 12 postos de trabalho directos, num concelho do interior, tem muito significado”.

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