O abacate nunca foi tão amado – e tão caro

No México, uma greve afecta as exportações para os EUA. Na Nova Zelândia, houve uma vaga de assaltos a travar a distribuição.

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AFP/RONALDO SCHEMIDT

Durante anos, o abacate era sinónimo de guacamole, fruto com muita gordura e pouco mais. Em anos mais recentes, depois de se descobrir com o seu teor de gordura era afinal saudável, tornou-se uma vedeta – na televisão, no Instagram dos foodies (os epicuristas modernos da alimentação) e à mesa dos que teimam em comer de forma saudável. Um pouco por todo o mundo ocidental, tanto na Europa (especialmente no Reino Unido), como nos EUA, o consumo do abacate disparou. Só nos EUA, triplicou, entre 2000 e 2014. E se a conta for feita em termos globais, os norte-americanos consumiram no último ano quase 860 mil kg de abacate – o dobro do que consumiam há dez anos. 

No Reino Unido, conta o jornal The Telegraph, a popularidade deste fruto – que tanto cai bem na comida mexicana, como numa salada ibérica – é tal que a venda de abacate suplantou mesmo a venda de laranjas. O mesmo jornal sugere que houve aqui dedo de estrelas da cozinha televisiva, como a popular Nigella Lawson. Mas claro que isso não explicará tudo – e o reverso da medalha é que tão grande procura acabou por elevar o preço.

E não é só a lei da oferta e da procura que tem produzido este efeito. Quer dizer, é este mecanismo, mas influenciado por uma greve (no México, maior produtor mundial) e, com uma influência menor, uma vaga de assaltos (na Nova Zelândia). 

Em Julho de 2016, segundo o mesmo diário inglês, o preço do abacate produzido no México atingiu recordes no mercado americano. Um ano antes, o preço médio era de 36 dólares por 60 abacates. Doze meses depois, alcançou os 63 dólares. Ou seja, um aumento de 75%. Resultado: o preço individual de cada fruto nos EUA passou de 1,50 dólares (cerca 1,30 euros) para quase 2,50 dólares (cerca de 2,25 euros).

Apesar de os preços poderem variar consoante o período do ano, por se tratar de uma iguaria sazonal, a razão para este aumento pode estar no México, o maior produtor e exportador. Desde que as restrições às importações mexicanas nos EUA foram levantadas, em 2007, as importações e o consumo de abacates por parte dos americanos (que hoje produzem menos 25% do que produziam no início do século) cresceram em flecha. A economia do México beneficiou muito com a situação, gerando receitas superiores a mil milhões de dólares anuais, só com a exportação.

Para os fãs americanos, o problema é que o período de produção na Califórnia terminou em Outubro. Em condições normais, socorrer-se-iam das importações a partir do México para satisfazer a procura até ao final do ano. Mas as fracas colheitas, e a industrialização em curso no estado mexicano de Michoacan – a região com maior produção de abacates – levaram a uma substancial redução das exportações.

A juntar a estes factos, mais de 500 produtores entraram em greve, devido à instabilidade do preço do fruto no mercado de commodities, bloqueando as rotas e as cargas que se dirigem para os EUA. Como os vizinhos Peru (quarto produtor mundial) e Chile (oitavo produtor mundial) não conseguem sozinhos compensar a ruptura no México – porque a produção anual de cada um não chega nem a 20% e 12% da produção anual do México (dados) –  a luta dos produtores mexicanos pode estar para durar. Os especialistas dizem que se está perante a maior ruptura alguma vez vista nas importações do mercado norte-americano. E vaticinam que esta pode ainda durar dois meses. Um golpe para cadeias de restaurantes de comida mexicana como a Del Taco ou a Chipotle, bastante populares e numerosas em solo norte-americano. 

Já no início deste ano, do outro lado do mundo, na Nova Zelândia, o preço deste fruto havia disparado, mas por razões distintas. Nessa altura, as colheitas e a produção também não correram bem. Porém, o problema agravou-se devido a mão criminosa. Com o fruto a escassear, registaram-se 40 furtos de larga escala a pomares, durante a primeira metade deste ano. A "loucura do abacate" acabou por "atacar" algumas lojas australianas, que penduraram nas suas portas um aviso a potenciais assaltantes: “Nem dinheiro nem abacates são guardados nestas instalações durante a noite”.

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