A “Selva” de Calais começa a ser desmontada

Milhares de refugiados, alguns deles há anos no acampamento no Norte de França, vão ser enviados para centros de acolhimento noutros pontos do país. Autoridades temem confrontos.

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Grupo de migrantes caminha entre as tendas da "Selva" na véspera do seu desmantelamento Reuters/PHILIPPE WOJAZER

“Já todos têm os sacos preparados há uma semana”, diz à AFP Mohammed, um sudanês de 43 anos, que se prepara para abandonar aquela que, apesar de tudo, tem sido a sua casa nos últimos tempos – a infame “Selva” de Calais. O mega-acampamento improvisado de refugiados e imigrantes começa a ser desmantelado esta segunda-feira. As autoridades começaram a chegar ao local cerca de 45 minutos antes das 7h, depois de se terem registado alguns momentos tensos durante a noite.

O último dia da “Selva” serviu para as autoridades francesas irem de tenda em tenda explicar o que vaiacontecer aos milhares de migrantes, provenientes sobretudo do Afeganistão, Sudão e Eritreia. Por volta das 8 horas de segunda-feira, vão começar a partir os primeiros autocarros que vão distribuir grupos de requerentes de asilo por vários centros de acolhimento espalhados por França.

Este foi o plano elaborado pelo Governo francês que anunciou no final de Setembro o desmantelamento do enorme campo, no Norte do país. Com eleições no próximo ano, o Presidente François Hollande está extremamente pressionado – pela direita e extrema-direita – para lidar com a questão dos refugiados.

Vão ser utilizados 145 autocarros para distribuir os refugiados (não há um registo oficial, mas as estimativas apontam para um número entre os seis e os oito mil residentes) por cerca de 300 centros de acolhimento. O Governo diz que existem vagas para 7500 pessoas e espera concluir o processo de realojamento numa semana, segundo a AFP. O próximo problema para Hollande está em algumas das autarquias que vão receber os migrantes, que não têm escondido o seu desagrado pela criação daquilo a que chamam "mini-Calais".

Entretanto, França e Reino Unido estão a negociar o envio dos menores de idade desacompanhados para o outro lado do Canal da Mancha. Este domingo chegou ao Reino Unido um grupo de 24 crianças que se juntam às 54, sobretudo meninas da Eritreia, que já tinham seguido no sábado à noite, segundo o Guardian. O objectivo é possibilitar que as crianças se juntem aos familiares que já moram no Reino Unido.

Nas próximas duas semanas, diz o jornal Le Monde, é esperado que outros 400 menores sejam autorizados a seguir para o Reino Unido. Numa primeira fase, os jovens vão ser levados para centros de acolhimento provisórios em França, onde vão ficar durante duas semanas. O plano do Governo prevê depois um “período transitório”, em que os menores devem ficar alojados em centros onde terão um acompanhamento especial.

Por resolver permanece a situação dos menores que não têm familiares que os recebam no Reino Unido. O desejo de Paris é que o Governo britânico autorize a entrada de todos os jovens, mas não é certo que o faça. “As negociações com os britânicos continuam”, diz o Ministério do Interior francês, citado pelo Le Monde. A crise humanitária em Calais – onde diariamente migrantes arriscam as suas vidas para tentar entrar nos camiões que viajam para o Reino Unido – tornou-se um terreno movediço para as relações entre os dois países.

O desmantelamento da “Selva” vai ser feito num ambiente tenso, acompanhado de um forte contingente policial. Esta não é a primeira tentativa para acabar com o cenário caótico que se instalou em Calais, mas, ao contrário das anteriores, há agora um plano para os milhares de residentes. Porém, a maioria não desiste de partir para o Reino Unido, onde muitos têm família, dominam a língua e sentem que é mais fácil a adaptação. São eles — e não Mohammed, já com os seus sacos arrumados e pronto para ir para onde o levarem — que levam a polícia francesa a recear confrontos. Uma possibilidade que aumenta perante os previsíveis protestos das organizações de defesa dos direitos humanos.     

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