Em Lisboa, há uma nova “cidade sonhada” em 53 mil azulejos pintados à mão

Mural de André Saraiva apresenta uma "vista panorâmica de uma cidade sonhada" e foi pintado no Jardim Botto Machado, em Lisboa

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André Saraiva

Um mural com mais de 53 mil azulejos pintados à mão, no qual foi desenhada uma "vista panorâmica de uma cidade sonhada" da autoria do artista André Saraiva, é inaugurado esta sexta-feira no Jardim Botto Machado, em Lisboa.

André Saraiva, filho de portugueses, nasceu na Suécia em 1971, passou a adolescência em Paris e actualmente vive e trabalha em Nova Iorque. Lisboa era um sítio "onde vinha de férias", em cujas paredes começou a pintar uns "graffiti" no final da década de 1980, início de 1990, e com o qual criou uma "relação íntima", contou, em entrevista à Lusa. Na "cidade imaginária" retratada no mural de azulejos com cerca de 900 metros quadrados, André Saraiva representou lugares de que gosta e "lugares símbolo".

Ali estão, entre outros, a Ponte 25 de Abril, o elevador de Santa Justa e o Padrão dos Descobrimentos, de Lisboa, a torre Eiffel, de Paris, e o Empire State Building, de Nova Iorque. Mas também estão garrafas de vinho, barcos, o bar Baron (do qual é proprietário), uma casa de fado, o Museu do Design e da Moda (Mude) de Lisboa e, claro, Mr.A (personagem que espalhou por paredes de todo o mundo e é o seu alter ego). "É uma vista panorâmica de uma cidade sonhada, cidade que tem várias histórias, onde cada um pode encontrar a sua própria história: sonhos, histórias de amor, viagens, histórias muito abstractas, tudo", referiu.

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André Saraiva expôs no Mude em 2014 Sandra Ribeiro

53 mil azulejos pintados à mão

Este projecto nasceu em 2014, no âmbito de uma exposição de André Saraiva no Mude. "Foi daí que começou a ser desenvolvida esta ideia de o André oferecer a Lisboa uma obra que inicialmente foi pensada como 'graffiti' e passou rapidamente a ser pensada neste suporte tão tradicional da nossa cidade que é o azulejo", referiu a directora do museu, Bárbara Coutinho.

O mural, além de estar inserido no Programa de Investigação e Salvaguarda do Azulejo de Lisboa (PISAL), da Câmara, faz parte de uma "missão" do Mude, "um objectivo que o Mude sempre teve — e com esta obra dá um primeiro passo com outra escala para que no futuro outras obras se repitam —, que é criar situações que permitam o desenvolvimento da indústria nacional em estreita articulação com artistas contemporâneos". "Foi um projecto que durante dois anos uniu várias entidades. O artista, que ofereceu o seu desenho, custeando as suas vindas a Lisboa e trabalhando em fábricas com grande regularidade", disse Bárbara Coutinho. Apesar de viver longe, André Saraiva acompanhou de perto a produção do mural: "Viajei muito entre Lisboa e Nova Iorque. Trabalhei com todos os artesãos e trabalhadores da fábrica, aprendi umas técnicas de azulejo", contou, referindo que "demora mais tempo do que pintar com os sprays [que utiliza nos 'graffiti']".

Os mais de 53 mil azulejos que compõem o mural foram todos pintados à mão. "O fabrico é o tradicional e foi todo pintado de uma maneira que se assemelhasse o mais possível à pintura de rua, do 'graffiti', através da qual o André se notabilizou em termos internacionais", referiu a directora do Mude. O local onde foi colocado — o mural tem quatro frentes, que ladeiam o Jardim Botto Machado, no Campo de Santa Clara, onde duas vezes por semana se realiza a Feira da Ladra — não foi ao acaso. Segundo Bárbara Coutinho, "foi logo pensado para a Feira da Ladra", por ser "o muro ideal" e por permitir uma "combinação de passado e presente com vista a um futuro". Além disso, "visa constituir mais um elemento atractivo para quem vive aqui, que habita a cidade e para quem a visita".

André Saraiva já deixou outras obras de arte pelas ruas de Lisboa: o mural da Associação Abraço que pintou na década de 1990, numa parede das Amoreiras, perto de Campo de Ourique, e vários Mr. A em diversos locais. Quando questionado sobre a possibilidade de pintar mais 'graffiti' em Lisboa, deixou um misterioso "não sei, tem que se ver".

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