Portugal seria dos mais afectados com regresso das fronteiras na UE

Receitas do turismo e transporte terrestre de mercadorias sofreriam o impacto do fim da livre circulação no espaço Schengen. As fronteiras da União voltam a estar na agenda do Conselho, que está reunido em Bruxelas.

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Se a livre circulação de pessoas e bens no espaço europeu fosse suspensa, Portugal seria o sétimo estado-membro mais afectado, segundo uma estimativa do banco de investimento Morgan Stanley, publicada pelos serviços de documentação do Parlamento Europeu. O impacto do fecho das fronteiras seria sentido, sobretudo, no turismo (que representa 9,2% do PIB) e no transporte terrestre (rodoviário e ferroviário) de mercadorias, que tem um peso substancial em Portugal – 73,3%.

Estes dados, que são apenas uma previsão, hipotética, ganham outro peso quando na Europa as suspensões unilaterais do espaço Schengen se tornaram comuns, no último ano.  O que fez com que os responsáveis da Comissão assumissem como a sua prioridade máxima o “regresso” à livre circulação.

O cenário de uma Europa com fronteiras entre Estados não é uma distopia. Que o diga o eurodeputado espanhol, e ex-ministro da Justiça de Zapatero, Juan Fernando Lopéz Aguilar, que durante uma audição na comissão de Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos Internos (LIBE) mostrou o seu desagrado pela nova rotina que obriga os deputados a serem identificados por guardas fronteiriços de cada vez que se deslocam em trabalho parlamentar de Bruxelas, na Bélgica, para Estrasburgo, na França.

O comissário grego das Migrações e Assuntos Internos, Dimitris Avramopoulos, elogia Schengen como “o mais tangível dos êxitos da União Europeia” e sublinha que o que está em causa é, nem mais nem menos, “um símbolo da cooperação europeia”.

O que é uma frase com duplo sentido, dados os desenvolvimentos do último ano. A Áustria, a Dinamarca, a Suécia e a Noruega (que é um país Schengen, embora não pertença à UE) prolongaram os seus controlos de fronteiras até 11 de Novembro. Outros mantiveram-nos durante meses (Bélgica, França, Alemanha, Malta, Eslovénia). A Hungria chegou a iniciar a construção de uma barreira de arame farpado na sua fronteira Schengen com a Eslovénia, que acabou por parar após um acordo bilateral. Mas o governo de Viktor Orbán acabou por construir uma barreira semelhante nas fronteiras com a Croácia (que está prestes a aderir a Schengen) e a Sérvia. Uma curiosidade: segundo o estudo sobre o impacto económico do regresso das fronteiras internas, a Hungria seria, de longe, o país mais afectado, uma vez que as receitas do turismo correspondem a 15,2% do seu PIB.

A justificação para o regresso das fronteiras internas foi quase sempre a mesma: a pressão migratória sobre as fronteiras externas da UE, sobretudo na Grécia. Mas esta é uma justificação, no mínimo, duvidosa do ponto de vista legal. Desde logo porque o artigo 26 do Tratado de Schengen afirma que “as migrações e a passagem de fronteiras externas por número elevado de cidadãos de países terceiros não deve, por si só, ser considerada uma ameaça à segurança interna”. Para que os países alegassem essa ameaça teriam de mostrar, claramente, qual o seu impacto. E nenhum o fez, satisfatoriamente. Essa é a conclusão de um outro estudo, encomendado pelo Parlamento Europeu, a um conjunto de especialistas em legislação europeia. Nesse documento aponta-se uma falha original, que nada tem a ver com a eficácia do controlo fronteiriço: “A UE não ofereceu um caminho dentro da legalidade para aqueles cidadãos que procuravam protecção dentro do Sistema Comum Europeu de Asilo (CEAS), logo os refugiados chegaram, de forma irregular, em pequenos barcos da Turquia par a Grécia, em vez de chegarem de forma ordenada à União em busca de asilo.”

Por isso, o assunto tem dominado os últimos Conselhos, e este que agora se reúne não será excepção. Avramopoulos queixa-se da “falta de solidariedade” exibida por alguns estados-membros, durante a crise dos refugiados. Em resposta a um grupo de jornalistas portugueses, que acompanharam, no passado dia 12, a sua audição na comissão LIBE, o comissário grego mostrou-se optimista: “Deixem-me lembrar-vos que no início da crise a Europa foi apanhada de surpresa, e os sistemas nacionais mostraram não estar preparados. Hoje estão. Têm o nosso apoio total. Agora, há uma política de migrações.”

Conselho decide reforço de fronteiras externas

A “protecção das fronteiras externas” da União volta a constar da agenda dos líderes europeus. No primeiro Conselho após o lançamento da nova Guarda Costeira e de Fronteiras Europeia (GCFE), que vem substituir a agência Frontex, os 27 pretendem discutir novas formas de reforçar as suas barreiras no Mediterrâneo. A prioridade, agora, é parar o afluxo de barcos a Itália, o destino mais procurado após a redução drástica verificada na rota entre a Turquia e a Grécia. Ainda que subsistam dúvidas sobre o efeito do acordo UE-Turquia nesta diminuição do número de refugiados, o Conselho prepara-se para anunciar mais acordos deste tipo, com países africanos. Este é o capítulo “encontrar soluções para a pressão migratória”, que surge no fim da agenda, depois dos pontos “resolver os fluxos migratórios no Mediterrâneo central” e “manter e apertar o controlo na rota do Mediterrâneo oriental”. Além da GCFE, a União tem vários projectos em curso de vigilância marítima e aérea, recolha de dados biométricos, que envolvem várias agências e departamentos da Comissão Europeia.

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