Os manuais escolares são de todos nós

Uma nova política para o livro escolar não dispensa políticas educativas estáveis e programas que perdurem no tempo, para que a cada novo ciclo governativo tudo deixe de mudar, inclusive os manuais escolares.

A entrevista que a secretária de Estado da Educação dá hoje ao PÚBLICO é reveladora da determinação com que o Governo quer enfrentar um dos sectores que há mais tempo goza da complacência do Estado na frente educativa: o da edição em geral e dos livros escolares em particular, onde um punhado reduzido de editores tem beneficiado do status quo há muito vigente à custa dos orçamentos familiares de muitos portugueses.

Ninguém sabe ao certo quanto vale o mercado da edição de livros escolares em Portugal e isso diz muito sobre a opacidade do sector. O que se sabe e o que poucos questionarão é que todos os anos milhares de portugueses são forçados a gastar o que têm e o que não têm em dezenas de manuais novinhos em folha, quando há alternativas menos onerosas para as famílias e para o ambiente. Os exemplos abundam e até nos são próximos: na Europa são vários os países que oferecem manuais aos seus alunos e o próprio Conselho Nacional de Educação já por três vezes indicou que este é o caminho a seguir. A multiplicação de bancos de partilha gratuita de manuais e os esforços de muitas câmaras para oferecê-los mostram que esse caminho não só é viável como há muitos portugueses dispostos a percorrê-lo.

O actual Governo fez, por isso, o que há muito devia ter sido feito: dar início a um programa verdadeiramente inclusivo de oferta gratuita de manuais escolares com vista à sua reutilização, para já exclusivo dos alunos do 1.º ciclo mas que se espera venha a ser alargado progressivamente aos restantes ciclos de ensino. Ao todo são três milhões de euros investidos a oferecer manuais a 80 mil crianças de seis anos de idade, que no fim do ano os devolverão para que outras façam uso deles. Se o programa resulta só mais tarda se saberá, mas é difícil discordar da justeza de uma medida que pensa em primeiro lugar nas famílias e no seu bem-estar.

É preciso agora que o mesmo Governo que parece apostar numa mudança de paradigma dê também o exemplo que tem faltado ao longo dos anos: uma nova política para o livro escolar não dispensa políticas educativas estáveis e programas que perdurem no tempo, para que a cada novo ciclo governativo tudo deixe de mudar, inclusive os manuais escolares.

Num país em que a educação tem sido vezes demais palco de disputas ideológicas, quando muda o Governo mudam os programas e as editoras fazem a festa. O desafio agora é que sejam as famílias a festejar.

 

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