Ano novo, pecados velhos?

É obrigação da tutela não obstaculizar o caminho da Escola Pública, necessitando de quem a ampare e invista nela.

O final do ano letivo anterior trouxe a novidade de ser expectável que, no início do novo ano, nem todos os alunos frequentassem a escola… pública. Falo de alguns colégios com contrato de associação onde foram matriculados os alunos nos  5.º, 7.º e 10.º anos, com a advertência da tutela no sentido de que essas turmas não iriam ser financiadas. Alguns rumores não foram concretizados, os pais matricularam os seus filhos atempadamente e alguns colégios assumiram, perante os encarregados de educação, a gratuitidade do ensino (embora tivessem conhecimento da decisão superior). Contudo, neste momento, todos os alunos transferidos dessas instituições têm lugar nas escolas públicas que se encontram preparadas para receber ainda mais, na eventualidade de algo de anormal poder vir a suceder. Trata-se de um facto sui generis em Portugal, não havendo memória de uma posição de total afronta ao superiormente determinado.

Dois dias antes do arranque do novo ano escolar, foram conhecidas as listas dos professores cujos horários foram pedidos pelas escolas ainda durante o mês de agosto - as designadas necessidades residuais que, na maioria dos casos, de residuais tinham só o nome, pois foram colocados alguns milhares de docentes.

Apesar de se constituir como uma obrigação do Ministério da Educação (ME), enalteço o sucedido, uma vez que não me recordo, nos anos anteriores, de se iniciar um ano letivo com todos os professores colocados, de modo a participarem nas reuniões (departamento, conselhos de turma…) de preparação do ano e, no 1.º dia de aulas, os alunos conhecerem aqueles que os irão acompanhar. Não fosse este facto ter-se enraizado no tempo e, da minha parte, não mereceria qualquer comentário. Espero que esta boa prática perdure e jamais seja possível voltar atrás nesta oportunidade, reivindicada há muito pelas escolas.

Caso as instituições educativas tivessem conhecimento desta boa novidade (colocação dos professores a tempo e horas), a data do começo do ano letivo teria sido antecipada, pois sei que na maior parte das escolas se iniciou no dia 15, último dia do prazo dado pelo ME (curiosamente, o primeiro do ano letivo anterior - as aulas começaram entre 15 e 21 de setembro). Como “gato escaldado de água fria tem medo”, as escolas, desconfiadas, resolveram não facilitar.

Outro motivo que levou a escolher o último dia do prazo foi a duração exagerada e desproporcionada do 1.º período letivo, em relação ao 3.º, quanto ao número de dias de aulas. O 1.º período poderá ter 67 dias de aulas, o 2.º terá 63 e o 3.º período, para os alunos do 9.º ano, comportará somente 33 dias de atividades letivas. É um calendário bipolar relativamente à duração dos períodos, a merecer reflexão, sugerindo a mudança para períodos semestrais, o que já aqui defendi e acolheu boa recetividade.

Os alunos e os professores são peças chave numa escola, elementos fulcrais da comunidade educativa. Contudo, não devemos desconhecer que os assistentes operacionais (funcionários), a par dos assistentes técnicos (trabalham nos serviços administrativos), são imprescindíveis em qualquer organização.

Os funcionários desempenham um papel essencial numa escola. Ajudam, acompanham e vigiam alunos, apoiam professores, exercem funções nos mais variados setores (portaria, cantina, bufete, pavilhões, reprografia, papelaria, telefone, limpeza…), sendo a sua polivalência e empreendedorismo mais-valias em qualquer profissão, essenciais numa instituição educativa. O excerto apresentado no início deste artigo confirma o que referi. No entanto, no momento em que escrevo este texto, as escolas lutam com falta de funcionários, dada a sua escassez na ordem de algumas centenas (um Sindicato diz que faltam 6.000…).

A renovação dos 2.822 contratos (1351 para escolas de Lisboa e Vale do Tejo, 908 para a zona norte, 398 funcionários para o centro, 84 Algarve e 81 Alentejo) que o anterior ME atribuiu em julho de 2015 às escolas não foi mais que uma obrigação deste governo; aquele número de funcionários não acresceu aos então existentes, antes substituíram os desempregados que exerciam as funções de assistentes operacionais no âmbito do programa de contrato de emprego e inserção. Apesar da precariedade destes contratos ser uma realidade, o vínculo contratual alterou, sendo positivo para o trabalhador (pode ficar na escola até 3 anos letivos) e para a escola (pode contar com o funcionário pelo menos 3 anos ininterruptos).

O horário de trabalho diminuiu, justamente, para 35h, a partir de 1 de julho, significando a perda de 5 horas de trabalho por semana em cada assistente operacional. Se uma escola contar nos seus quadros com 40 funcionários, perdeu 200 horas de trabalho, o que equivale a pelo menos 5 funcionários. Esta situação foi agravada com um corte cego nas horas de tarefeiras (tendo surpreendido os diretores), mantendo-se inalterada a situação de substituição destes profissionais quando se aposentam ou adoecem, o que nunca acontece(u).

Faço votos para que a publicação deste artigo seja ultrapassada pelos acontecimentos e que o Ministro das Finanças tenha dado ordem para colocar nas escolas assistentes operacionais em número suficiente, de modo a continuarem a funcionar com elevada qualidade, reconhecida por todos. É obrigação da tutela não obstaculizar o caminho da Escola Pública, necessitando de quem a ampare e invista nela.

Afinal, não é a Escola Pública uma das bandeiras, também, deste governo?

Professor/director

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