Na era do tempo escasso, empresas procuram formações cada vez mais rápidas

Pedidos de formações à medida vêm tanto de grandes como pequenas empresas, com peso para as áreas de negócio digital e para as que têm o desafio da internacionalização

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Há um pedido comum: programas adaptados à exigência cada vez maior de respostas rápidas e adaptação à mudança Andrew Winning / Reuters

Respostas rápidas, adaptação instantânea, conhecimento actualizado, sempre em cima do acontecimento. O mundo das empresas gira cada vez mais depressa e as escolas de gestão a que recorrem para dar formação aos seus quadros acompanham o passo. A formação para executivos feita à medida – customizada – é uma importante área de negócio para as instituições de ensino, muito valorizada pelos rankings internacionais que as colocam no mapa global da educação executiva.

As principais escolas contactadas pelo PÚBLICO não querem falar de volumes de vendas – apenas a Porto Business School adianta que a formação à medida vale 30% da facturação – mas todas têm uma estratégia para marcar terreno nesta oferta. E os últimos anos mudaram a forma como os programas se desenham, quase todos com um denominador comum: o tempo é escasso, as empresas querem estar em cima das rápidas evoluções e pedem formação de curta duração e, sobretudo, eficaz.

Com 60 cursos customizados leccionados em 2015/2016, a Católica Lisbon School of Business and Economics abre as portas às maiores empresas portuguesas e internacionais para abordar temas que vão desde “gestão de equipas e liderança, comportamento organizacional, até à gestão de marketing digital e transformação digital”, diz fonte oficial da instituição. O foco também está na internacionalização e há “grande procura tanto por parte de empresas portuguesas a actuar no estrangeiro e a necessitar de formarem os seus quadros internacionais, como por empresas internacionais que procuram a Católica Lisbon”.

Há, contudo, maior procura por formação na área digital e as ferramentas e módulos são adequados às necessidades. Os programas “são especialmente concebidos para maximizar a eficácia do desenvolvimento em competências e de alteração de comportamentos daqueles que os frequentam”, explica.

Apesar dos constrangimentos financeiros, a procura não diminuiu, antes, mudou de forma. José Crespo de Carvalho, professor catedrático da Nova SBE e coordenador académico da formação de executivos da escola pública, diz mesmo que o ano de 2016 foi o melhor de sempre na formação à medida. Cresceu o interesse por formações abertas e de curta duração, agora “formas de criação de valor formativo rápido e intensivo”. O mesmo se passa nos programas abertos a todos.

“Não se pode ficar para trás e não se pode perder tempo. Os mercados perceberam finalmente que cortar a formação é hipotecar o futuro. Os individuais idem. Trata-se de um investimento que, normalmente, é bem recuperado se for bem entregue”, sustenta.

Há cinco anos, a procura pendia mais para mestrados executivos. Mas “o tempo necessário para fazer o boost das carreiras era muito elevado, pelo que a tendência de vários cursos de curto prazo começa finalmente a vingar em Portugal”, continua o responsável da Nova SBE, que dá formação à medida a empresas do principal índice da Bolsa de Lisboa, o PSI 20, com uma duração média entre três a dez dias.

Esta “urgência” maior em estar a par das mudanças também chegou à Porto Business School que, em 2015, leccionou 70 mil horas a executivos e prevê um crescimento de 25% neste negócio em 2016. Paula Marques, responsável pelas “soluções à medida” da PBS, adianta que os pedidos chegam de grandes e pequenas empresas.

“Procuram programas com impacto adaptados aos desafios de crescimento e internacionalização”, adianta. Gestão e liderança são as áreas mais solicitadas e incluem desde “reflexões estratégicas e pensamento sobre o futuro dos negócios, ao empreendedorismo e inovação, passando pelos temas mais comportamentais”.

Há um pedido comum: programas adaptados à exigência cada vez maior de respostas rápidas e adaptação à mudança. “Há cinco anos, as empresas procuravam cursos mais longos que abrangiam, quase na totalidade, os temas da gestão e liderança. Hoje procuram impacto, cursos mais curtos, mas que sejam tão ou mais assertivos como os anteriores cursos mais longos”, diz Paula Marques, acrescentando que o perfil dos participantes também é diferente de há cinco anos. Agora, “as empresas e os profissionais pensam, trabalham e aprendem de forma diferente”, sublinha.

A procura por programas à medida não está a cair mas o maior “constrangimento” sentido pela PBS “é o tempo”. “Sentimos que as necessidades existem e que as empresas reconhecem cada vez mais que necessitam de investir em formação executiva para melhorar a performance dos seus negócios. No entanto, o tempo para dedicar a actividades de formação é escasso, sobretudo, quando atravessamos períodos menos positivos na economia e que colocam novos e mais desafios ao mercado”, detalha.

No Indeg/ISCTE, escola de negócios do ISCTE fundada em 1988, organizam-se programas para grupos, que segundo Paulo Bento, presidente da instituição, chegam a mobilizar centenas de quadros, e para pequenos proprietários, “ajudando-os a reflectir sobre as questões que afectam o futuro do seu negócio”. “Os conceitos de turma e carga horária são diferentes nos projectos corporate [empresariais]. Uma vez que os projectos se concentram nas questões-chave da organização e nos participantes que conduzem a mudança, impõe-se uma abordagem muito mais flexível”, diz ao PÚBLICO.

Da teoria à prática

Se antes as empresas pediam formações mais funcionais e técnicas, agora precisam de resolver problemas concretos – e é nesta área que o Indeg/ISCTE se posiciona. A solução para as dúvidas “envolve uma combinação de elementos funcionais, estratégicos e de liderança”, diz Paulo Bento. A escola coloca os problemas concretos trazidos pelos executivos no centro do programa de formação. “As organizações esperam que as ajudemos a acelerar a mudança, através das pessoas. E o nosso papel é criar as condições para que os participantes reflictam, inovem e ‘(intra)empreendam’. A maioria dos projectos desenvolve-se em torno da discussão de problemas reais através de dinâmicas que não são fáceis de reproduzir no dia-a-dia, ajudando os participantes a encontrar soluções”, continua. Tendo em conta o foco da formação, não há “espaço para a massificação ou falsa customização”.

A maioria das empresas prefere fazer a formação no espaço das escolas de gestão, não só porque se cria, assim, um “distanciamento do dia-a-dia de trabalho”, como diz Paulo Bento mas também porque procuram “impacto e imersão”, afirma Paula Marques.

“Muitas vezes nem a vinda ao nosso campus cumpre este requisito de imersão total e [as empresas] procuram outros locais para a realização dos programas”, continua a responsável da PBS. O local onde o curso decorre é “um factor crítico”, “principalmente quando muitas das soluções têm um carácter mais excepcional e menos conceptual”.

As escolas de gestão contactadas concordam que esta é uma área com potencial de crescimento. As instituições têm a missão de “antecipar os desafios de mercado, reflectir e gerar tendência e identificar as soluções para ajudar as empresas a desenvolver e potenciar os resultados”, defende Paula Marques.

José Crespo de Carvalho, professor da Nova SBE, acredita que a “competitividade será maior” e que as empresas “não olham hoje para a formação como há uns anos”. “Ou investimos em nós e nos nossos colaboradores ou mais tarde pagaremos a inércia e o não investimento. São custos para alguns. Mas felizmente tem-se tornado um investimento e muito bem remunerado”, defende.

Há outra vantagem para as instituições de ensino: o contacto directo com as empresas. Fonte oficial da Católica Lisbon diz que este é um mercado “muito compensador” e uma oportunidade para trabalhar directamente “e muito de perto” com as empresas parceiras. “Ajudam-nos a compreender melhor as suas necessidades e a melhorar as nossas competências, dia após dia”, diz, sublinhando que uma das estratégias da escola é reforçar parceiras com escolas internacionais de renome, como a Kellog School of Management, com quem a Católica trabalha desde 2010.

Por seu lado, Paulo Bento, presidente do INDEG/ISCTE sustenta que este “é um mercado em rápida transformação”. “As escolas de negócio tradicionais não estão vocacionadas para encarar os problemas estratégicos das empresas e ajudar as lideranças a resolvê-los. As consultoras de gestão tradicionais, por sua vez, não alavancam investigação distintiva e não interiorizam a ambiguidade e a complexidade, tendo ainda dificuldade ou falta de vocação para transferir o conhecimento. A relevância para as empresas, provavelmente, está no meio do caminho ou na combinação de ambos”, conclui.

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