Há livros espalhados por Lisboa à espera de serem caçados

Os livros são espalhados em diferentes locais da freguesia de Arroios e chegam aos 60 exemplares num só dia. Em bancos de jardins, esplanadas ou até piscinas municipais, os livros procuram novas casas até dia 15 de Setembro.

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Iniciativa da Biblioteca de S. Lázaro decorre até 15 de Setembro, em Arroios DR
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Podem ser policiais ou histórias de amor. Há quem prefira a poesia ou o fantástico, mas são poucos. Num mundo em que se procuram pokémons e dominado pela hegemonia do online há uma freguesia em Lisboa que quer colocar os moradores a caçar livros. Para isso, até 15 de Setembro, a Biblioteca de S. Lázaro e a Junta de Freguesia de Arroios unem-se numa iniciativa que pretende distribuir gratuitamente 2500 livros pelas ruas até ao próximo dia 15 de Setembro. A selecção é feita com base nos critérios de catalogação exigidos e com base no seu estado de conservação, no tipo de literatura em que se inserem e nos anos da edição do livro.

A ideia de oferecer livros não é pioneira, mas é a primeira vez que os livros são colocados na rua, conta ao PÚBLICO Joaquina Pereira, uma das coordenadoras do projecto e responsável pela biblioteca. "Queremos que as pessoas percam o medo que têm dos livros. Em anos anteriores fazíamos a iniciativa aqui na própria biblioteca, mas não eram muitas as pessoas que aqui vinham buscar. Ou por não saberem, ou por sentirem vergonha", explica Joaquina.

Joaquina trabalha na biblioteca há cerca de dois anos e meio. Durante este tempo, familiarizou-se com as estantes por onde nos guia, enquanto explica a disposição dos livros naquela que é a biblioteca municipal mais antiga de Lisboa e fala-nos da biblioteca e dos seus visitantes. A menina dos seus olhos é a sala original, a sala de leitura principal do edifício de arquitectura neoclássica erudita, inaugurada em 1883, por Teófilo Ferreira, quando ainda se escrevia “Bibliotheca”. Aqui os livros estão protegidos do tempo pelos vidros dos velhos armários de madeira. No centro, um candeeiro de lustre marca o encontro entre as duas linhas de mesas dispostas em dois círculos ao longo do espaço hexagonal, que se preservou, mesmo depois do encerramento entre 2000 e 2006 para requalificação da biblioteca.

"Esta é a sala mais antiga, que foi depois alargada a mais duas salas, a sala de estudo e a sala infantil, mas quisemos manter tudo igual ao projecto original. Até o relógio de parede é o mesmo ainda", conta orgulhosa. Entre as colecções constam livros dos séculos XVII ao século XIX, sobre História de Portugal, sem esquecer os Descobrimentos, a expansão e a colonização portuguesas, espanholas e francesas, a Restauração de 1640, o Governo de Pombal e a implantação do liberalismo.

No entanto, apesar da qualidade da oferta, não são os livros de História os mais procurados, adianta Joaquina. Os favoritos continuam a ser os policiais e os romances. Segue-se depois a literatura erótica e só depois os infantis e especializados. Os clássicos e a poesia são menos populares.

Para desafiar os hábitos de leitura e até as preferências dos leitores, a equipa da biblioteca distribui diariamente cerca de 50 a 60 livros pela freguesia. “Cada saco tem cerca de duas dezenas de livros. Cada funcionário leva um ou dois sacos e procede à distribuição. Tentamos espalhar por diferentes zonas da freguesia.” O jardim do Torel, a zona do Saldanha e da Penha de França ou Estefânia são algumas das zonas onde se podem encontrar os livros.

“Às vezes vamos encontrando os papéis que distribuímos com o livro, mas não há sinal dele”, conta. “Ainda esta semana vi alguém a ler um dos livros distribuídos, enquanto almoçava numa esplanada, o que prova que as pessoas estão a aderir ao projecto”, conclui. “Muitas vezes as pessoas intimidam-se e não conhecem os livros. Parece que os livros assustam", analisa, descrevendo o projecto como uma forma de atrair novos leitores, que não têm de ser moradores da freguesia. “Tem de haver um trabalho que aposte em expandir os livros. Ler e conhecer mais livros traduz-se em mais conhecer, mais informação. E as pessoas mais informadas são pessoas mais livres”, sublinha.

Por isso, os livros saem da biblioteca e podem ser encontrados em bancos de jardim, cafés, quiosques. São sinalizados com um panfleto que contextualiza a iniciativa Leva-me Contigo e que convida o leitor a conhecer as instalações que são a casa de mais de 20 mil livros, entre os quais se contam colecções únicas no país.

O balanço da iniciativa já é positivo e o número de livros distribuídos já ultrapassou metade das unidades. “O sucesso está a ser maior do que em projectos anteriores, em que as pessoas se tinham de deslocar às nossas instalações. Com esta ideia são os livros que se deslocam até às pessoas e se cruzam com elas.” Ainda assim, o crescimento de número de leitores – apesar de estar a crescer – “poderia ser maior”. A repitação da iniciativa ainda está sob avaliação e dependerá da reflexão final e do número de livros disponíveis para distribuição no próximo ano.

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