Vaga de assaltos em igrejas e casas paroquiais da diocese de Beja

Situação atinge “uma escala sem precedentes" e está a escapar ao controle da Diocese, alerta o bispo de Beja.

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O bispo de Beja, D. António Vitalino Dantas diz-se preocupado com a vaga de assaltos Enric Vives-Rubio

Não se encontra um paralelismo entre a actual onda de assaltos a paróquias do Baixo Alentejo com qualquer outra que tenha acontecido em anos anteriores na região. A dimensão dos furtos e a devassa do património religioso que vêm tendo lugar desde Julho assumiu uma dimensão tal que o bispo de Beja, D. António Vitalino Dantas, diz que já “nada parece mitigar um sentimento colectivo de frustração” e o grau de “inquietação” que atinge os párocos e as populações das comunidades afectadas pelos furtos.

Na descrição feita ao PÚBLICO, são destacadas na onda assaltos as paróquias de Almodôvar, Castro Verde, Mértola, Odemira e Ourique, algumas por mais de uma vez. No templo mais frequentado da cidade de Beja, a igreja de S. João Baptista, “ainda não foi feito um levantamento exaustivo” dos bens furtados, mas estes abrangem “quantias em dinheiro, computadores, peças de arte sacra e valores pessoais dos padres e diáconos” refere D. Vitalino Dantas.

Contudo os maiores problemas verificaram-se em Odemira. Na casa paroquial foram subtraídos, além de outras peças de interesse patrimonial, “uma coroa de prata do século XVII”, pertencente à imagem da padroeira da vila, obra “de grande valor artístico e devocional”. A residência do pároco “foi devassada de alto a baixo” pelos ladrões, que conseguiram arrombar o cofre onde se encontravam guardadas diversas alfaias litúrgicas, levando-as consigo, refere o documento facultado ao PÚBLICO.

Além de se confrontarem com os prejuízos causados às paróquias, os padres acumularam também danos no seu património privado. No assalto à casa paroquial de Ourique, que está a provocar “consternação”, o padre local foi desapossado de “um relógio, de fios de ouro e de outros objectos de estimação que pertenciam ao seu pai, falecido há poucos dias”. O eclesiástico diz sentir agora um forte “sentimento de orfandade”.

De novo em Beja, na igreja do Carmo, que possui um vasto espólio de arte sacra, também desapareceram valores de referência. Mas o que mais “penalizou a paróquia foi o furto de um computador onde um cónego ao serviço da instituição, de 82 anos de idade, guardava os seus escritos sobre história e teologia, o que representa uma perda difícil de reparar”. D. Vitalino, que está a meses de deixar o cargo, por limite de idade, diz ter avisado os padres para evitarem guardar bens significativos das paróquias nas suas residências, mas a situação está a escapar ao controle da Diocese, admite.

Um pároco que quis guardar o anonimato, por temer represálias, salientou que esta vaga de furtos só pode ser o resultado da “acção de uma quadrilha” e critica o facto de este Verão, ao contrário do que sucedeu em anos anteriores, ninguém se ter ocupado de “passar palavra” às paróquias sobre a vaga de assaltos ou de actuar preventivamente junto das autoridades. “Sentimo-nos um pouco abandonados no terreno”, acrescentou.

A preocupação com a segurança do património das paróquias estende-se às igrejas e a outras instalações da Igreja Católica no Baixo Alentejo. No Seminário de Beja, rodeado por uma pequena quinta, no interior da cidade, têm vindo a desaparecer não só máquinas agrícolas e outros equipamentos, mas também esculturas e mobiliário antigo.

Basta entrar numa igreja da região para se perceber o ambiente de receio que está patente nos gestos e nas palavras dos paroquianos. Para o sacristão da igreja de Santa Maria, em Beja, alvo, há pouco, do furto de várias alfaias usadas na missa, incluindo valiosos paramentos, “é o diabo que anda à solta”. Os assaltos chegam a acontecer em pleno dia 

Ricardo Pereira, responsável pelo Museu Municipal de Sines, que colabora com as paróquias deste concelho, chamou a atenção para “a generalização de furtos, muitos dos quais nem sequer são participados à Polícia Judiciária”, a única entidade, diz, que “tem competências especiais em matérias criminais relativas ao património cultural”.

O Verão está a revelar-se tórrido para a arte sacra alentejana, vinca a Diocese de Beja frisando que a onda de assaltos começou no mês de Julho e está a prolongar-se em Agosto. Os problemas de segurança do património agudizaram-se de tal modo que os responsáveis diocesanos vieram a público manifestar a sua inquietação com o que está a suceder. “Começam a existir sinais de alarme em torno de tão sensível questão, que fere os sentimentos das comunidades locais” assumem. 

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