Contas externas pioram, com défice da balança a chegar a 900 milhões

Menos investimento, menos fundos da UE e aumento dos passivos dos bancos agravam contas. Défice externo aumentou 19 vezes até Junho. Turismo melhora mas não trava saldo negativo com exterior.

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A queda das importações ajudou à melhoria da balança corrente de bens e serviços no primeiro semestre Daniel Rocha

As contas externas portuguesas agravaram-se de forma significativa no primeiro semestre, apesar da balança de bens e serviços estar a ter um desempenho melhor ao do mesmo período do ano passado. A balança de pagamentos – que permite medir o saldo global da economia portuguesa em relação ao exterior – registou um défice de 933 milhões de euros até Junho, 19 vezes mais do que no período homólogo, mostram dados publicados nesta quinta-feira pelo Banco de Portugal (BdP).

As contas externas também seguiam negativas ao fim dos primeiros seis meses de 2015, mas o valor era substancialmente menor – um défice de 49 milhões – e Portugal acabaria por terminar o ano com um excedente na balança de pagamentos, tal como os dois anos anteriores. 

Se se repetir a tendência de 2014 e 2015, os próximos meses ainda podem ajudar a equilibrar os pratos da balança. Essa é a expectativa do Governo, que, ao contar com uma recuperação da actividade económica ao longo do ano, prevê que as contas externas continuem a ser positivas em 2016.

Por ora, para aferir da capacidade de financiamento do conjunto da economia, apenas se conhecem os dados do primeiro semestre. E com excepção da balança de bens e serviços, todas as componentes contribuíram para o agravamento das contas externas até Junho.

Na balança de pagamentos (dividida em balanças corrente, de capital e financeira) são contabilizadas, por exemplo, as exportações e as importações, os fluxos entre os rendimentos auferidos com investimento estrangeiro em Portugal os rendimentos obtidos no exterior, os fluxos de capital associados às compras de dívida pública, os investimentos em acções ou as transferências relacionadas com as remessas de emigrantes ou imigrantes.

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O excedente das contas dos bens e serviços foi superior a mil milhões de euros, comparando com 794 milhões de euros registados no primeiro semestre do ano passado. A evolução positiva foi possível porque a redução das importações foi superior à queda das exportações, como refere o Banco de Portugal, destacando o peso do turismo e as viagens, onde se registou um excedente na ordem dos 3100 milhões de euros.

A complicar as contas está o défice da balança financeira – a componente onde são contabilizadas as transacções sobre activos financeiros e passivos, como acções de empresas, títulos de dívida ou empréstimos. Se entre Janeiro e Junho de 2015 o saldo era negativo em 158 milhões, um ano depois o défice aqui é superior a mil milhões. Isto significa que houve uma redução dos activos líquidos de Portugal face ao exterior. Onde também houve um pior desempenho foi no saldo do investimento directo (porque aumentaram os lucros atribuídos aos não residentes).

O economista João Duque, professor do ISEG (Universidade de Lisboa), alerta para o problema da perda patrimonial face ao exterior, que tem impacto directo nas contas e que teme vir a agravar-se de ano para ano, levando à transferência de lucros para fora do país e ao repatriamento da remuneração do capital. “Deixámos de ter activos sobre o estrangeiro. Se a perda de propriedade leva à sangria de Portugal em termos de juros e dividendos, os pagamentos passam para o lado de lá”, frisa, enfatizando a análise do BdP sobre este ponto.

Em Junho, refere o banco central, o défice de 444 milhões de euros na balança financeira deveu-se, sobretudo, a um acréscimo dos passivos dos bancos portugueses e ao desinvestimento em participações de capital e dívida de longo prazo.

A balança de capital também continuou a ser positiva, mas o excedente foi menor, o que, segundo o BdP, tem a ver “no essencial” com a redução de fundos da União Europeia.

Portugal acumulou durante anos saldos negativos com o exterior, mas mais recentemente passou de um défice externo a um saldo positivo, para o qual contribuiu a queda a pique no consumo e no investimento durante a crise, que fez cair as importações. O equilíbrio da capacidade de financiamento da economia foi uma das bandeiras do discurso económico do anterior Governo, mas o actual executivo também prevê que a trajectória continue. No Orçamento do Estado o Governo prevê que “o ajustamento das contas externas persista”, com o saldo da balança corrente e de capital a fixar-se em 2,2% do PIB. 

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