Começar a respeitar os bombeiros, começar a prender incendiários

Exigimos até hoje que os desempregados se apresentem no centro de emprego de 15 em 15 dias, mas não podemos exigir algo semelhante a suspeitos de fogo posto?

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Rafael Marchante/Reuters

As estatísticas revelam que 98% dos incêndios florestais são de responsabilidade humana. A negligência é a causa de alguns, a falta de civismo o motivo de outros, mas 75% são de origem criminosa. Estes números foram lembrados pelo presidente da Liga dos Bombeiros, Jaime Marta Soares, na sequência de um encontro oficial com Marcelo Rebelo de Sousa. De acordo com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, já ardeu mais floresta portuguesa em dez dias do que na totalidade de 2007, 2008 ou 2014. Não considero que os números contem todas as histórias, mas estes têm muito significado anexado; são algarismos de mortes, desflorestação com danos avultados, vidas destruídas e incompetência política e judicial.

A primeira incompetência está no tempo de resposta do Governo para pedir ajuda dos meios aéreos. Foi excessivo, não pode acontecer. No entanto, Jaime Marta Soares aponta o facto como "erro estratégico". Meus amigos, erro estratégico é comer melancia depois de beber vinho ou usar casaco numa tarde de Agosto em Aljustrel. Isto é incompetência. E das mais graves que podem existir — das que podem fazer a diferença na vida das populações. A incompetência política continua quando há bombeiros a trabalhar várias horas seguidas e a serem pagos a "1,87 euros à hora", valor adiantado pelo presidente da Associação Nacional dos Bombeiros Profissionais, Fernando Curto. Um país que se acomoda com o voluntariado não pode dormir descansado só porque partilha uma foto de apoio, nas redes sociais, ao trabalho nobre dos bombeiros. Só porque, em conversa de café, um grupo de indivíduos os chama de heróis. Eles fazem um trabalho nobre. Eles são heróis. A solidariedade é e vai continuar a ser necessária mas, por favor, governantes e "decision makers" deste país, paguem e ofereçam condições para trabalhar, porque isto é um trabalho, não é uma brincadeira. Só assim se estaria a apostar verdadeiramente na prevenção desta calamidade que se repete ano após ano.

A segunda incompetência — a judicial — está bem patente. Segundo o "Jornal de Notícias", mais de metade dos suspeitos de fogo posto acabam por ser libertados. Fonte oficial da Polícia Judiciária mostrou ao mesmo jornal que, desde 2010 e até 10 de Agosto, foram detidos 352 suspeitos. Desse número, apenas 40% ficaram em prisão preventiva. Ora, meus caros legisladores, tão certo em como haver fogo quando há fumo, é haver fogo quando há criminosos incendiários à solta. A justiça em Portugal tem de começar a funcionar, tem de, neste caso, abrir os olhos de uma vez por todas, porque já se notou que a ser cega não vai lá. Prender estes criminosos, com penas máximas, duras e vinculativas, é o primeiro passo para a prevenção. É um passo que não está a ser dado. Além disso, é fundamental haver mais controlo destes mesmos indivíduos quando se encontram em liberdade. Exigimos até hoje que os desempregados se apresentem no centro de emprego de 15 em 15 dias, mas não podemos exigir algo semelhante a estas pessoas? O controlo tem de ser muito eficaz e não pode cair no esquecimento durante o ano.

Comecem a respeitar os bombeiros, mais do que apenas com palmadinhas nas costas. Comecem a prender incendiários, mais do que apenas com termos de identidade e residência.

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