As rendas de bilros num livro de fotografia sobre um mundo esquecido

Rui Farinha é o único português a ter um trabalho seleccionado para o livro que procura chamar a atenção para pessoas e projectos que, habitualmente, não têm espaço nos media

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Rui Farinha/nfactos
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As crianças e jovens de Vila do Conde que aprendem a fazer rendas de bilros vão ter os seus rostos e as mãos estampados num livro de fotografia que congrega cem histórias seleccionadas mundialmente, entre milhares de concorrentes, no âmbito do projecto The Other Hundred (Os outros cem). O responsável é o fotojornalista Rui Farinha que, pela segunda vez, concorreu e foi seleccionado nesta competição que tem como principal objectivo levar-nos a “compreender melhor o mundo e as vidas que vivemos”, através da divulgação de “pessoas, ideias, lugares e culturas que não aparecem habitualmente nos media”. Este ano, o tema era o ensino alternativo e o trabalho que Farinha fez sobre esta arte tão tradicional de Vila do Conde foi um dos cem escolhidos para integrar um livro que deverá ser editado em Setembro.

Na verdade, o mais provável é que o livro mostre dois dos trabalhos apresentados à competição pelo fotógrafo. Apoiado em duas escolas – a Escola de Rendas de Bilros de Vila do Conde, que se dirige a crianças entre os 6 e os 12 anos, e a Escola Secundária José Régio, onde a aprendizagem dessa arte deixou de ser uma disciplina extra-curricular para passar a integrar a formação normal, no ano lectivo de 2014/2015 – Rui Farinha apresentou duas histórias distintas tendo como pano de fundo as rendas de bilros. Só a segunda é que foi seleccionada para figurar na lista dos cem vencedores, mas é provável que o livro acabe por conter fotografias dos dois projectos. “A organização pediu-me, entretanto, para redefinir a história, porque, provavelmente, vão usar fotografias de ambas as escolas no livro”, disse ao PÚBLICO.

No ano passado, Rui Farinha já fora um dos cem seleccionados pelo The Other Hundred, com um trabalho sobre Domingos Machado, um mestre na construção dos instrumentos musicais no país, com oficina nos arredores de Braga. O tema era, na altura, os micro-empresários. Este ano, os participantes na competição foram convidados a desenvolver projectos fotográficos sobre ensino alternativo.

O fotógrafo diz que a primeira ideia que teve – mas que acabaria por abandonar – foi a de fotografar uma universidade sénior, mas acabou por apresentar três outros trabalhos: os dois sobre as rendas de bilros e um sobre a Escola de Segunda Oportunidade, em Matosinhos. “Uma das coisas que me cativa nesta competição – e que a distingue de outras – é que temos que trabalhar sobre um tema específico, que nos é dado. Às vezes queremos partir para um novo projecto e não sabemos muito bem por onde ir. Aqui, o tema geral já nos é dado, pelo que metade do caminho está feito”, diz Farinha.

A Câmara de Vila do Conde avançou com um processo de certificação das rendas de bilros, que ficou concluído no ano passado, dando-se assim mais um passo para proteger uma tradição de quatro séculos na cidade, que já passou por vários altos e baixos. Pelo menos desde 1616 que há registos da existência de rendilheiras em Vila do Conde. Caras e delicadas, as rendas de bilros mantêm-se profundamente enraizadas na tradição vila-condense. Com desenhos próprios e uma técnica complicada, as rendas de bilros tem mesmo um museu que lhes é dedicado desde 1991. Mas o ensino desta arte é essencial para que a tradição não desapareça.

Isso mesmo tentou explicar Rui Farinha ao júri do The Other Hundred que, neste ano, classificou em 1.º lugar um projecto da fotógrafa indiana Prabha Jayesh, com um trabalho sobre 17 escolas miseráveis do inóspito deserto de Kutch, em Gujarat, na Índia, frequentadas por mais de 400 crianças.

Este ano foi a 3.ª edição de The Other Hundred. Rui Farinha recorda que a sua participação na 2.ª edição, com o trabalho sobre Domingos Machado, aconteceu depois de um convite directo da organização para que apresentasse um projecto. “A organização viu a minha página na internet e recebi um telefonema, aconselhando-me a consultar o regulamento e a inscrever-me. Foi assim que fiquei a conhecer a iniciativa”, diz. Este ano, não foi preciso convite. Satisfeito com a participação inaugural, Rui Farinha concorreu de novo, voltando a ser o único português com um projecto seleccionado pelo júri. E, é claro, admite voltar a concorrer (“vamos ver qual é o tema”, diz), mas, para já, há outra perspectiva que o anima. “Estamos a ver se é possível trazer para Portugal a exposição do projecto. Vamos ver”, disse.

The Other Hundred é uma iniciativa do Global Institute for Tomorrow, uma associação sem fins lucrativos, sediada em Hong Kong, que se dedica a estudar as relações “entre negócio e sociedade, o papel do Estado e a redefinição das regras do capitalismo global”. Este ano, quem comprar o livro (o que é possível fazer on-line em www.theotherhundred.com leva para casa um pedaço de Vila do Conde, em forma de rendas de bilros.

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