"Não podemos ignorar a exigência da pena de morte", diz Erdogan à multidão

Já foram detidas 6000 pessoas e Governo promete continuar a "limpeza". Há confrontos com militares revoltosos em base aérea. Número de mortos após golpe sobe para 290.

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O Presidente turco, protegido pelos seguranças, no funeral de uma das vítimas da tentativa de golpe de Estado OZAN KOSE/Reuters
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O ex-Presidente Abdullah Gül e Erdogan ajudaram a carregar o caixão de uma das pessoas que morreram no golpe
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Tanque abandonado em Istambul BULENT KILIC/AFP
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O Presidente quer que os EUA extraditem Fethullah Gülen MURAD SEZER/Reuters
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A praça Taksim no apoio a Erdogan, sábado BULENT KILIC/AFP
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Praça Taksim, em Istambul AMMAR AWAD/Reuters

As ruas de Istambul têm-se enchido de apoiantes e o Presidente Recep Tayyip Erdogan pede mais: "Fiquem na rua até sexta-feira", pediu ele aos seus apoiantes, promete continuar a purga, com ameaças de restabelecer a pena de morte. apesar dos avisos de países europeus para que as regras do Estado de direito sejam cumpridas. 

Falando de um “vírus” a erradicar de todas as instituições turcas, Erdogan voltou neste domingo a acusar Fethullah Gülen, um ex-aliado e agora seu “inimigo número um”, de estar na retaguarda da tentativa de golpe de Estado. “Este não é um acontecimento de 12 horas”, acentuou, insistindo para que o povo se mantenha nas ruas e nas praças a apoiá-lo.

O primeiro-ministro, Binali Yildirim, já o tinha dito, mas Erdogan tem-no repetido à multidão para que não restassem dúvidas em relação à dura resposta de Ancara: admitiu reintroduzir a pena de morte para quem desencadeou a tentativa de golpe, depois de ter sido retirada da legislação turca, como um dos critérios da cumprir para poder vir a entrar na União Europeia. A multidão, exultante, pede-lhe que o faça: “Queremos a pena de morte!”, grita. "Não podemos ignorar esta exigência", responde o Presidente.

Há notícias de confrontos na base militar de Konya, na Anatólia central, entre forças de segurança e, alegadamente, oficiais golpistas, e também no segundo aeroporto de Istambul, Sabiha Gökçen, onde há troca de tiros.

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Detenção de militares pela polícia, num autocarro em Istambul, no sábado BULENT KILIC/AFP

Quando saiu da sua residência em Istambul para ir a um funeral, tinha pessoas à espera de o ver passar, depois de no sábado ter aparecido ao lado de milhares de civis e prometido mão pesada contra quem esteve envolvido no golpe de Estado travado na véspera.

Neste domingo, as detenções de militares continuam. Na província de Denizli (Sudoeste) a polícia deteve um comandante de brigada e 50 oficiais, avança a BBC. Ao final da manhã, o ministro da Justiça, Bekir Bozdag, confirmou que já foram detidas 6000 pessoas desde sexta-feira, e antecipou que esse número vai crescer nas próximas horas e dias. “As operações de limpeza vão prosseguir”, declarou. Entre os detidos estará, segundo a Reuters, o general Bekir Ercan Van, comandante da base militar de Incirlik, no Sul do país, a partir da qual saem aparelhos da Força Aérea norte-americana na campanha contra o Estado Islâmico.

Avisos da UE

A questão  tinha sido admitida por Yildirim antes de Erdogan falar em Istambul e, pelo meio, chegou de Berlim um aviso, com a chanceler alemã, Angela Merkel, a dizer que Ancara tem de seguir “as regras do Estado de direito”.

A advertência contra as purgas foi reforçada neste domingo pela França. “Queremos que o Estado de direito funcione plenamente na Turquia, não é um cheque em branco ao senhor Erdogan”, preveniu Jean-Marc Ayrault, ministro dos Negócios Estrangeiros e ex-primeiro-ministro. A pena de morte foi abolida no país em 2002 para os crimes comuns e, dois anos mais tarde, para todos os crimes, ainda que a última a execução tenha sido em 1984.

Erdogan falou para a multidão, afirmando que a tentativa de golpe foi orquestrada por uma minoria de militares das Forças Armadas, com apoio exterior. O imã Fethullah Gülen é a figura a quem o Governo aponta o dedo e há muito acusa de ter criado um “Estado oculto” na Turquia.

O Presidente pediu aos Estados Unidos para deportarem ou extraditarem Gülen, que, auto-exilado nos Estados Unidos desde 1999, nega estar por detrás da tentativa de golpe. “Há um jogo com o Exército e isto está ligado a forças exteriores”, afirmou Erdogan, pedindo directamente a Barack Obama para “extraditar esta pessoa que está na Pensilvânia”, onde vive Gülen.

De Washington, Erdogan recebeu apoio contra o golpe, mas ali também não passou em branco a insinuação de que os Estados Unidos seriam secretamente favoráveis aos militares que tentaram o golpe, condenado na Turquia pelos próprios partidos da oposição.

Em Istambul, as manifestações de apoio a Erdogan nas ruas, com milhares de pessoas envergando as bandeiras do país, foram-se repetindo ao longo do dia, enchendo a Taksim, a praça que há poucos anos foi o palco da repressão das manifestações contra Erdogan.

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Os oito militares que aterraram de helicóptero na Grécia pediram asilo SAKIS MITROLIDIS/AFP

“Amo a Turquia”, “A era dos golpes acabou”, ouviu a AFP em Istambul. Em Ancara, o povo também se reuniu em frente ao Parlamento, que na sexta-feira foi bombardeado nas primeiras movimentações dos militares. E de fora da Turquia também chegaram apoios, com manifestações a repetirem-se em várias cidades, de Berlim ou Viena a Gaza.

O balanço da tentativa de golpe, rapidamente travado por Erdogan, é duro. A AFP referiu 265 mortos e 1440 feridos, numa noite em que houve confrontos nas ruas, bombas a cair em Istambul e Ancara, e disparos contra civis. O Governo turco disse ao final do dia de domingo que morreram 290 pessoas.

À espera de asilo

Com o golpe a ser travado pelas forças leais a Erdogan, foram detidos cerca de 3000 militares e no dia seguinte começou a purga nas Forças Armadas e na justiça, ao serem afastados 2800 juízes, incluindo dois membros do Tribunal Constitucional.

Entretanto, a Turquia pediu a extradição de oito militares que aterraram de helicóptero na cidade grega de Alexandrópolis (Noroeste), onde pediram asilo político. O Governo grego está a analisar o pedido, o que não significa uma resposta afirmativa. Aliás, a porta-voz do Governo, Olga Gerovasili, frisou que será ido em conta o facto de os militares “terem participado numa tentativa de derrubar um regime democrático”, envolvimento que o advogado dos militares nega ter existido. O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, como outros líderes europeus, apoiou o Governo “democraticamente eleito” na Turquia.

O advogado dos oito militares, presentes a tribunal sábado em Alexandrópolis, alega que eles “não sabiam o que é que se estava a passar exactamente”. Os militares estavam em Istambul e “quando os policiais começaram a atirar contra eles, decidiram sair”, contou, citado pelo o jornal grego Kathimerini. Enquanto se aguarda uma decisão, o helicóptero (Black Hawk) já regressou à Turquia, tendo deixado Alexandrópolis na noite de sábado com mais dois helicópteros turcos. com agências

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